OPINIÃO Ano XIV – Nº 151  Abril 2008

Os 150 anos de fundação da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas

Editorial: Almas congeladas

Nossa Opinião: O exemplo de um certo centros espírita de Paris/1858

Opinião em Tópicos: Ainda somos os mesmos // A banalização da violência // A essencialidade humana // Materialismio e espiritismo (Milton Medran)

Notícias: Blog do CCEPA // Medran fala sobre felicidade em maio no CCEPA

Enfoque :  Centros Espíritas: Identificação, Estrutura e Funcionamento

Opinião do Leitor

 

Os 150 anos de fundação da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas

 

Em 1º de Abril de 1858 nascia o primeiro Centro Espírita do mundo

 

O registro na Revista Espírita

Em sua edição de maio de 1858, a Revista Espírita, periódico mensal que começara a ser editado por Allan Kardec em janeiro daquele mesmo ano, dava divulgação à portaria do Sr.Prefeito de Polícia, referendada pelo Sr. Ministro do Interior e da Segurança Geral, autorizando o funcionamento da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas.

No anúncio, Kardec frisava: “A Sociedade cuja formação temos o prazer de anunciar, composta exclusivamente de pessoas sérias, isentas de prevenções e animadas de sincero desejo de esclarecimento, contou, desde o início, entre seus associados, com homens eminentes por seu saber e por sua posição social”. Sobre os objetivos da SPEE, Allan Kardec acrescentava: “Estamos convictos de que ela é chamada a prestar incontestáveis serviços à constatação da verdade. Sua lei orgânica assegura uma homogeneidade sem a qual não haverá vitalidade possível; está baseada na experiência dos homens e das coisas e no conhecimento das condições necessárias às observações que são o objeto de suas pesquisas”.

Uma sociedade científica e não religiosa

No artigo 1º de seus atos constitutivos, restava claramente definido objetivo da SPEE: “A Sociedade tem por objeto o estudo de todos os fenômenos relativos às manifestações espíritas e suas aplicações às ciências morais, físicas, históricas e psicológicas. São defesas nela as questões políticas, de controvérsia religiosa e de economia social”.

No ano seguinte, 1859, Kardec reagiria com veemência a artigo de um padre católico, Abade Chesnel, que classificara a sociedade por ele fundada, como um templo onde se estava praticando uma nova religião, hostil à fé católica: “A Sociedade a que vos referis” – escreveu Kardec ao padre – “tem seu objetivo expresso no próprio título; a denominação Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas não se assemelha ao de nenhuma seita; tem ela um caráter tão diverso que os seus estatutos proíbem tratar de questões religiosas; está classificada na categoria das sociedades científicas, porque, na verdade, seu objetivo é estudar e aprofundar todos os fenômenos resultantes das relações entre o mundo visível e o invisível” (Revista Espírita, abril 1859).

Um contraponto com os centros espíritas de hoje

Nesta edição de Opinião, quisemos fazer um contraponto entre o perfil da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, fundada por Kardec, e os centros espíritas que se espalham hoje pelo mundo, especialmente no Brasil. Buscamos um artigo originariamente publicado na revista Harmonia, órgão da ADE/SC, em maio de 2005. Sua autora, a empresária e pensadora espírita Nícia Cunha, registra que não é incomum os centros espíritas denominarem-se “templo, congregação, sinagoga, tenda, casa de pai fulano, centro de irmão beltrano, etc”, o que, aliado às suas práticas repetindo “rituais de outras religiões cristãs”, “reduz a identidade espírita e suas propostas originais.”

 

Nossa opinião

 

O exemplo de um certo centro espírita de Paris/1858

 

Ninguém há de negar que o modelo de centro espírita hoje vigente no Brasil e que daqui se irradiou para a maioria dos países onde o espiritismo é conhecido pouco tem a ver com a estrutura e os objetivos da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas cujo sesquicentenário de fundação é recordado neste mês de abril.

Condenar-se, simplesmente, o modelo como imprestável, só por isso, ninguém tem o direito de fazer. Buscar aprimorá-lo, tanto quanto possível, espelhando-se no espírito e nos objetivos kardequianos, no entanto, parece ser uma meta digna de ser buscada.

Em mensagem ditada na Federação Espírita Brasileira, em 1984, quando das comemorações do centenário da entidade, Allan Kardec (espírito), pela psicografia do médium Júlio Cezar Grandi Ribeiro, teria externado uma preocupação a esse respeito, ao consignar: “A Codificação Espírita ainda se vê essencialmente desconhecida de tantos corações que se rotulam de espiritistas, conquanto o movimento regenerador de almas permaneça lucidamente de pé em terras brasileiras.” (Reformador, março 84).

Regenerar almas é tarefa a que se entregam todas as religiões. Instruir a partir da realidade espiritual e, com isso, libertar espíritos, é tarefa um pouco mais complexa e se constitui, no entanto, no propósito central do espiritismo, tal como o concebeu Kardec. Exatamente por isso, naquela mesma mensagem, o espírito que a FEB identificou como Allan Kardec, acrescentou: “A recomendação inolvidável para as defensivas do movimento regenerador das almas é INSTRUÇÃO!”

Uma análise que se faça dos centros espíritas há de revelar uma elevada dose de boa vontade, consubstanciada em ações tais como aplicação de passes, águas fluidificadas, distribuição de víveres a necessitados, fraternos conselhos diante das aflições de encarnados e desencarnados e, em contrapartida, pouca, muito pouca instrução. Bem diferente dos propósitos de um certo centro espírita, fundado em Paris, há 150 anos. (A Redação)

 

Editorial

Almas Congeladas

 

“Deus fecunda a madrugada para o parto diário do sol, mas nem a madrugada é o sol, nem o sol é a madrugada”.

 (Do voto do Ministro Carlos Ayres Britto, no julgamento da ADI 3510)

 

No julgamento em curso no STF da ação direta de inconstitucionalidade da Lei de Biossegurança, entidades religiosas que apóiam o pedido têm feito questão de salientar: os argumentos que as movem não são de ordem religiosa, são científicos. Sustentam – com razão, diga-se de passagem, - que o zigoto, biologicamente, já contém todas as informações identificadoras do indivíduo humano a que daria origem, caso a gestação ocorresse. Mas isso não dá resposta a esta fundamental indagação: ali já está presente um ser humano?

            Veja-se: retirados que forem de um animal qualquer, humano ou não, uma unha ou um fio de cabelo, estará também ali contido todo o código genético daquele ser. E, no entanto, se poderia atribuir à unha ou ao fio de cabelo a condição humana?

            Claramente, os grupos, todos eles identificados com a religião, que se opõem à pesquisa científica com células-tronco embrionárias não o fazem por amor à ciência, mas por respeito à fé. Talvez não tenham sequer coragem de afirmar, mas sua luta nasce da crença de que ali, naquele aglomerado de células humanas, há uma alma. E que essa realidade desloca o tema ao campo da sacralidade, por onde não é lícito ao homem transitar.

            Sob o aspecto jurídico positivo, a questão é singela e – tomara! – o voto já proferido pelo Ministro Ayres Britto, há de ter pavimentado o caminho da decisão final. Cuida-se de definir se ali, naquelas células, há vida humana. A resposta é não. Nosso ordenamento jurídico atribui personalidade humana ao ser nascido com vida. O restante são perquirições, relevantes, sem dúvida, de cunho religioso ou filosófico. Não científicos. E à Corte não caberá firmar a decisão nesse tipo de perquirições que fogem do âmbito da lei.

            Mas admitamos – e preferível seria que o fizessem claramente os que pugnam pela procedência da ação –, que o móvel do pedido seja exatamente este: o de que ali repousa uma alma humana e que crenças e tradições de um povo devem pesar na decisão. Assim mesmo, é de se considerar que entre nós vigoram, com igual força e respeitável tradição histórica, outras posições acerca dessa substância definida pelas religiões e filosofias como alma ou espírito.

            Mesmo que a religião cristã haja, após alguns concílios que lhe deram feição definitiva, fechado questão de que a alma é criada por Deus no momento da concepção, é sabido que nem sempre houve unanimidade na história do cristianismo acerca dessa proposição, feita dogma irremovível, a partir de certo momento. Os chamados padres da Igreja, sob influência platônica, nos primeiros séculos do cristianismo, defenderam abertamente a preexistência do espírito como emanação divina e sua atuação consciente e eficiente no processo da encarnação. Contemporaneamente, no Brasil, milhões de pessoas adotam a crença ou a concepção filosófica da reencarnação, bem mais compatível com os modernos postulados científicos da lei geral da evolução. Esta não influiria tão-somente no campo biológico, mas seria também o dínamo do desenvolvimento consciencial, a partir da hipótese da existência do espírito e de sua independência da matéria.

            A partir dessa concepção, moderna e não destoante da ciência, impensável seria imaginar que em um conglomerado de células, manipuladas num tubo de ensaio e, após, conservadas por anos em um congelador, repouse uma consciência. Ali ela não poderia ter parado em um processo onde a inteligência voltada para um fim útil e evolucionista haja, de alguma forma, interferido.

            Está aí uma reflexão fundamentada numa hipótese viável, filosófica e cientificamente sustentável. Diferente, pois, de um dogma que, para poder influir na formulação das leis e das decisões humanas, precisa se valer de eufemismos que mascaram a velha persistente vontade de que o mundo seja regido pela fé e pelo obscurantismo, em detrimento do progresso e da ciência.

            Almas congeladas só podem povoar o mundo mítico de seres que preferem também congelar a fé, mas que não têm o direito de obstaculizar o avanço da ciência. Mormente quando esta contribui para a felicidade humana.(O texto deste editorial foi publicado por Zero Hora, de Porto Alegre, edição de 9.4.08, assinado pelo jornalista Milton Medran Moreira

)

            Seria impensável imaginar que num conglomerado de células, manipuladas em um tubo de ensaio e, após, conservadas por anos em um congelador, repouse uma consciência.

 

 

BLOG DO CCEPA

    Agora o Centro Cultural Espírita de Porto Alegre tem seu blog na internet. Conheça nossas idéias e saiba de nossas notícias acessando http://ccepa.blogspot.com/

 

Medran fala sobre felicidade em maio no CCEPA

 

A palestra da primeira segunda-feira de maio (dia 5, às 20h30), no Centro Cultural Espírita de Porto Alegre, estará a cargo do presidente da Confederação Espírita Pan-Americana – CEPA – e Diretor de Comunicação Social do CCEPA, Milton Medran Moreira.

Seu tema: “Uma Reflexão sobre Felicidade”

Na noite de 7 de abril, o orador foi Salomão Jacob Benchaya, vice-presidente do CEPA, que discorreu sobre o tema “Espiritismo – Caráter e Fundamentos”.

 

 “Espiritismo – Caráter e Fundamentos” foi o tema de Salomão em abril. Medran fala sobre felicidade em maio.

 

Opinião em Tópicos

Milton R. Medran Moreira

 

Ainda somos os mesmos

Em música de Belchior que Elis imortalizou, o poeta lamentava: “Minha dor é perceber que, apesar de termos feito tudo que fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais”.  

            Penso que a grande tragédia do mundo reside no fato de um imenso contingente humano não haver ainda percebido o real significado de sua existência. Os índices elevados de criminalidade, a corrupção, o desrespeito a princípios elementares de convivência social, a guerra, a fome e as matanças são expressões inequívocas do descompasso entre as leis da vida e a forma como as encaram os seres humanos.

            A banalização da violência

A violência está sendo banalizada entre nós. Apenas alguns fatos de maior repercussão chegam à mídia, causando revolta e indignação em todas as pessoas com um mínimo de dignidade e bom-senso. Episódios atingem, às vezes, maior visibilidade. Como ocorreu, há pouco, com a divulgação das barbáries que uma mulher cometia contra uma criança por ela adotada. Mas, diariamente, na cidade e no campo, vidas são ceifadas ou barbarizadas em troca de interesses mesquinhos, numa total inversão dos valores fundamentais da vida. A maioria desses crimes talvez nem chegue ao conhecimento de quem de direito e jamais serão julgados. A vida humana vale pouco ou nada para quem não é capaz de perceber porque nascemos, porque vivemos e porque morremos.

            A essencialidade humana

Bilhões de anos de evolução não conferiram ainda a grande parte do gênero humano a compreensão de sua essencialidade. O egoísmo e a ganância, forças motrizes da maioria dos atos “inteligentes”, obstaculizam a percepção da mais singela das verdades, a de que somos seres em busca de luz e de que esta procede de dois focos: o amor e o conhecimento.

            O processo evolutivo, no campo ético e moral, se dá de forma bem mais lenta do que seria de esperar. Daí a angústia do homem frente ao próprio homem, sua dor em perceber, como disse o poeta, que “ainda somos os mesmos”, embora intimamente convencidos de que mudar é preciso.

            Materialismo e espiritualismo

            Quando falei antes da incapacidade de percebermos nossa essencialidade, poderia substituir aquela expressão por espiritualidade. É preciso resgatar esse valor. A concepção materialista de vida, por mais que logre despertar movimentos de reforma social e política, jamais conduz ao âmago da questão da vida. Pode estimular a competição, muitas vezes saudável. Pode até inspirar belos programas de justiça social. Mas não atinge a consciência mais profunda do homem. Este, quando pode, burla a lei, e o faz iludido pela idéia de que vida é matéria e que, fora de seu âmbito, o proceder humano não gera conseqüência alguma.

            Sim, há reações em cadeia contra a violência. As pessoas de bem estão indignadas. Mas a indignação não resolverá o problema, enquanto o ser humano não compreender a si próprio. É preciso resgatar a essencialidade humana, que outra não é senão a do espírito imortal, sujeito de direitos e obrigações perante a vida, num delicado nexo de causas e efeitos que antecedem o berço e vão além do túmulo. Essa é a grande tarefa do espiritismo. Todo o resto é acessório.

 

Enfoque

 

Centros Espíritas: Identificação, Estrutura e Funcionamento

Nícia Cunha*

Centradas no entendimento religioso da Doutrina Espírita, sofrendo influências de diversas religiões, especialmente as cristãs, africanas e indígenas, as casas espíritas tradicionalmente ostentam nomes que remetem ao conceito de lugar sagrado.

Assim, acompanhando a adjetivação espírita, não é incomum encontrar termos como: templo, congregação, sinagoga, tenda, casa de pai fulano, centro de irmão beltrano, etc. Existem ainda instituições que reverenciam ícones católicos, homenageiam pessoas já mortas ou ainda vivas, que se destacaram no meio espírita e que são consideradas quase “santas”.

Incorrem em erro, pois essa nomenclatura nega, altera ou reduz a identidade espírita e suas propostas originais. É contraproducente também em termos de comunicação social, pois utilizam signos e linguagem que não a especificam ideologicamente, não esclarecem qual seja sua visão, suas metas, ou como atuam.

Deveria haver no âmbito espírita, um movimento de conscientização sobre essas impropriedades, visando eliminar essas denominações, substituindo-as por outras que melhor definissem a atividade, o caráter e o propósito da doutrina.

            A estrutura funcional e as práticas da maioria dos centros espíritas são tão inadequadas quanto os nomes. A rigor, inexistem instituições nos moldes do Instituto Parisiense de Estudos Espíritas, fundado por Kardec, que atuava sob enfoque filosófico e com metodologia científica de pesquisa.

A descoberta (e não uma revelação, no sentido místico) da realidade do espírito e do intercâmbio entre encarnados e desencarnados, impôs um conceito ético e moral, que, entretanto não justifica o desenvolvimento de uma religião. Não é necessário seguir um credo, para se viver com moralidade e ética.

 A maioria dos espíritas brasileiros, e conseqüentemente, a sociedade em geral, acha que Kardec recomendava práticas evangelizadoras por haver escrito o livro "O Evangelho Segundo o Espiritismo". Kardec não escreveu ou compilou obras de pregação religiosa, não visava fazer apologia e proselitismo cristão. Seu objetivo era o de explicar o pensamento de Jesus sob o enfoque espírita. Por isso, naquela obra, endossou apenas o aspecto moral de seus ensinamentos, não sancionou sua biografia divinizada e seus milagres, alertando para a falta de comprovação histórica desses relatos dos evangelhos canônicos.

Nem mesmo a máxima espírita mais conhecida – “Fora da caridade não há salvação”, escapou de desvirtuamento, pois não é uma recomendação explícita, mas uma paráfrase. O movimento espírita fixou-se em atividades de consolo espiritual e distribuição de bens materiais, distanciando-se do cerne da proposta doutrinária, que privilegia a educação individual e coletiva, única saída para a elevação qualitativa da sociedade. Seria o caso de se perguntar a que se dedicarão os espíritas, quando não mais houver pobres no planeta. Ou de que se ocupam as criaturas que habitam orbes mais avançados do Universo, que não tenham tais desníveis sociais.

Há casas espíritas cujos nomes enfatizam essa distorcida noção de caridade: Pão dos Pobres, Socorristas de Maria, Amantes da Pobreza, etc. Inclusive, nestes dois últimos exemplos, além de incorrerem no erro conceitual, o fazem também no semântico, pois as denominações podem ter dupla significação: pessoas que socorrem a santa católica; amor à pobreza, propriamente dita.

Discriminam os carentes já a partir dos nomes, mantêm atividades assistencialistas sem desenvolver trabalhos educativos que despertem potencialidades e firmem noções de cidadania, para conscientizá-los sobre seus direitos e deveres, tanto individuais como coletivos.  

Dessas e de outras interpretações incorretas derivam-se os problemas de caracterização e funcionamento de um centro espírita. A obra kardequiana afirma que a Doutrina Espírita não possui dogmas, hierarquias e cultos. Causa espanto, o fato de os espíritas repetirem essa definição, mas não assumirem que, na prática, há hierarquização e ritualização.

De fato, a federativa nacional é vaticanista, as estaduais funcionam como arcebispados e os centros como paróquias. Em todos os níveis, a quase totalidade dos dirigentes é vitalícia, ou promovem alternâncias periódicas entre os integrantes de grupos fechados e inamovíveis.

No Brasil, o Centro Espírita já virou igreja. É um fato sociologicamente definido. A sua estrutura funcional repete rituais de outras religiões cristãs. As missas católicas adotam módulos entremeados de cânticos e responsórios: Introdução, Ofertório, Leitura do Evangelho, Consagração da Hóstia, Comunhão, Bênção Final, com água benta aspergida sobre a assistência ou individualmente colhida à saída do recinto.

Na casa espírita, sempre de maneira solene e mística, acontecem: prece de abertura, pequena leitura ou preleção religiosa, palestra/sermão de caráter evangélico, oração final, passes e ingestão de "água fluidificada". Algumas instituições até adotam coros e cantorias. A coincidência não é fortuita. É atavismo e desconhecimento do que realmente seja a filosofia espírita.

Para os espíritas religiosos, está tudo correto, embora a divergência com o que Kardec ensinou e praticou. Segundo esse segmento, o espírita deve mesmo ser um pregador do Evangelho, ainda que em nítida desvantagem em relação aos católicos e protestantes que estudam teologia para bem desempenhar seu trabalho, que além do mais, é profissão.

Excetuando algumas pessoas que usam seus conhecimentos gerais e acadêmicos para embasar suas prédicas, a grande maioria é composta por pessoas comunicativas, imbuídas de espírito missioneiro, não raro vaidosas e/ou fanáticas, que embora bem intencionadas, não possuem preparo intelectual ou doutrinário. 

Disso, resulta empirismo, interpretações pessoais ou de grupos. Não há estudos, mas sim, catequese. Paradoxalmente, onde deveria haver livre exame de conteúdos, só ocorre veiculação de conceitos repetidos. Os líderes das instituições não se questionam e nem permitem questionamentos sobre a correção do teor daquilo que divulgam. Ficam ofendidos quando isso ocorre, procuram afastar, disfarçada ou ostensivamente, a pessoa que provoca o debate ou diverge. Com poucas exceções, o ensino doutrinário é uma balbúrdia sem metodologia aplicada, tem caráter limitado e reducionista, é feito por tradição oral, tem apenas enfoque evangelizador. Quando muito, os monitores usam apostilas mal compiladas, com pouca base na Codificação, mas que reproduzem idéias de autores encarnados e desencarnados de obras denominadas “literatura complementar”.

O espírita se jacta, afirmando que a doutrina, além de ser religião, é filosofia e ciência. Mas não se faz ciência nos centros espíritas. Não há pesquisas ou experiências metodologicamente estruturadas, ou efetiva comprovação de fenômenos. É só crença, visão estratificada, dedução empírica ou simplesmente, vôos da imaginação. Onde a ciência, então?

     Na França, depois de Kardec, o Espiritismo morreu. Muitas razões são apontadas, sendo a mais consistente, os entraves decorrentes das duas grandes guerras do Século XX, que assolaram a Europa. Curiosamente, elas não mataram outras idéias vigentes ou introduzidas à época, que ainda hoje honram e destacam os franceses, ciosos da racionalidade aprendida com seus proeminentes pensadores (René Descartes à frente) e magistralmente utilizada por Kardec.

É muito provável que o aniquilamento da doutrina Kardecista na França tenha ocorrido devido às influências místicas, pois impulsionada por Roustaing, caiu na vala comum da religiosidade crédula. Há uma real possibilidade de ali ter sido esquecida porque deixou de ter o apelo da razão e da lógica, sob as quais nasceu.

No Brasil, firmou-se o avesso dessa gênese: a liderança mística adotou, expandiu e sedimentou a visão religiosa, sem raciocinar que, se Deus é perfeito, portanto despido de prepotência e vaidade, não impõe e nem precisa de nossas súplicas, reverências e bajulações, dispensando dogmas, ritos e crendices no trajeto de sua criatura em direção à perfeição relativa que pode alcançar.

 

* Nícia Cunha é Empresária; Delegada da CEPA em Cuiabá – MT e Correspondente da ASSEPE.

Opinião do Leitor

 

            Livre-pensadores espíritas do Sudeste

 

Estou retornando hoje à lista depois de quase um mês afastado pois estava há mais de 20 dias sem conexão com a internet. Um raio que caiu próximo a minha casa queimou meu equipamento e deixou o bairro todo sem telefone e internet. Já não via a hora de ler e participar das discussões da lista. Outra grata surpresa foi a divulgação da fundação
da SKEDH pelo site da CEPA e pelo Boletim América Espírita que deu uma boa visibilidade do nosso projeto aqui no Sudeste, pois ao abrir meu e-mail hoje, encontrei mensagens de algumas pessoas querendo saber detalhes e se podem participar de alguma forma. Uma dessas pessoas me informou que tem interesse no movimento cepeano, mas não o integra porque não há instituições espíritas adesas ou filiadas na região que abrange os estados de ES, RJ e MG. Pensando nesse problema, estamos buscando soluções para agregar sócios correspondentes para  facilitar a integração dos espíritas livre-pensadores dessa região. Agradeço também, em nome da diretoria da SKEDH, ao pessoal do CCEPA pelo envio de um exemplar do jornal Opinião, a título de cortesia.

Entraremos em contato em breve para formalizar o pedido de adesão da Sociedade Kardecista de Estudos e Desenvolvimento Humano – SKEDH – à CEPA.

Herivelto Carvalho -Ibatiba ES (mensagem enviada através da lista de discussão da CEPA na Internet)