OPINIÃO Ano XIV – 145 Setembro 2007

A corrupção no banco dos réus

Nossa Opinião:   Questão de tempo

Editorial:  Espíritas são uma eleite?

Notícias:   Grupo Jovem do CCEPA apresentará trabalho no 10º SBPE  -   Espíritas de Pelotas e Santa Maria também apresentam trabalho  -    O Espírito e o Espiritismo em duas palestras mensais do CCEPA

Opinião em Tópicos:   Em favor da vida  -   Direito penal mínimo  -  Espiritismo e modernidade   -   A contribuição espírita  (Milton Medran Moreira)

Enfoque:    Cientista português fala sobre espiritismo nas Universidades de Cambridge e Oxford

Opinião do leitor

 

 

 

A corrupção no banco dos réus

 

A inédita ação penal, iniciada nas últimas semanas no Supremo Tribunal Federal, pode ser mais do que o julgamento de 40 figurões da República. Talvez indique que o Brasil não suporta mais conviver com a corrupção.

 

Dois anos depois

            O episódio pode ser considerado a maior crise política das últimas décadas no Brasil. Teve início em maio de 2005, quando o então deputado Roberto Jéfferson (cassado) levou à Câmara Federal a denúncia de que uma rede de corrupção envolvia ministros, deputados, dirigentes de estatais e empresários. Políticos receberiam vultosas propinas para votarem a favor de projetos de interesse do governo e de setores econômicos e empresariais.

            Só no último mês de julho, depois de apresentada denúncia pelo Procurador-Geral da República contra 40 indiciados, por peculato, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e outros delitos, o processo começou a ser examinado no Supremo Tribunal Federal, a mais alta Corte da Nação.

            O fato é inédito nos anais políticos e judiciários do Brasil. O STF, um tribunal constitucional, não tem nem estrutura, nem tradição, para instruir e julgar originariamente ações penais. Por ser o foro privilegiado de alguns dos denunciados, passou, no caso, a ter competência para a instrução e o julgamento de todos os implicados.

            Espíritas debatem poder e corrupção

            A chegada do chamado processo do “mensalão” ao STF ocorre no momento em que todos os segmentos da Nação reclamam pela adoção de melhores padrões éticos na política. Uma forte conscientização parece indicar que o país já não mais suporta conviver com a corrupção e reclama por mudanças.

            Na lista de discussões na Internet da CEPA – Confederação Espírita Pan-Americana – um grupo de listeiros sustentou interessante debate sobre as relações entre o poder e a corrupção. Assim, para o debatedor Antônio Margarido (São Paulo), será necessário, primeiro, buscar o quê o espiritismo entende por corrupção. Para ele, “originalmente, o ser está em constante corrupção, pois se transforma em não-ser constantemente. A corrupção é, assim, inerente às coisas”, e acrescenta: “Se partirmos do princípio que o Espírito está em constante evolução, poderíamos estabelecer um consenso de que corrupção seria a queda no mal, ao qual o Espírito encarnado ou desencarnado estaria sujeito”. Diz concordar com Max Weber “que entendia o poder como algo neutro e, com isso, pode ser preenchido tanto pelo bem como pelo mal”. Por isso, “em cada contexto, a análise espírita deve desvendar o que seria o bem e o mal para, assim, conectar o conceito de poder com essas duas tendências às quais o Espírito está sujeito, seja em sua jornada no plano material, como no plano espiritual”.

            Para Leopoldo Daré (São Paulo), “a existência do poder é exigência primordial para a corrupção”. Sustenta que “dividir a decisão é contribuir para minimizar o poder”, daí a importância da democracia.

            De Cincinnati, EUA, o integrante do grupo de discussão da CEPA, Marcelo Regis trouxe importante contribuição, destacando o otimismo que o espírita deve manter sobre o avanço da ética na política. “De outra forma” – pergunta - “como acreditar na constante evolução humana?”. E acrescenta: “Felizmente temos vários exemplos vivos de indivíduos e mesmo sociedades inteiras em que esses valores prevalecem e, portanto, é possível acreditar que toda a humanidade pode evoluir a esse mesmo nível. Se a cada nova geração esses valores forem ensinados e cultivados, podemos vislumbrar uma sociedade em que a regra será a retidão e a honestidade”. Mas, “para que isso se dê, os indivíduos precisam fazer escolhas e aceitarem que fomentando o bem-estar coletivo estaremos também garantindo um bem-estar individual melhor e muito mais duradouro”.

            Para Marcelo, “os espíritas, como cidadãos, devem engajar-se nessa luta, via educação e demonstrando, com o exemplo, que é possível construir uma sociedade melhor”. Ele também crê que “temos que ser mais rígidos quando se trata de princípios morais, sem tentar suavizar ou racionalizar”. Assim, diz ele, “se nossos políticos são desonestos ou não conseguem explicar devidamente seus ganhos e suas ações, retiremos todo o nosso apoio imediatamente”. “Não podemos compactuar com a degradação moral que alguns corruptos querem nos impor, dizendo que todos são iguais e que política é isso mesmo”, finaliza.

 

Nossa opinião

Questão de tempo

            Há dúvidas de que esta geração veja chegar ao fim o histórico processo recém iniciado na mais alta Corte do País. E não será justo atribuir aos eminentes ministros do Supremo Tribunal Federal qualquer política protelatória. É que, simplesmente, o sistema legal e institucional em que estamos mergulhados, historicamente, se organizou para que os rigores da lei não atinjam os poderosos.

            Só muito recentemente, o sentimento de cidadania avançou entre nós de forma a criar mecanismos garantidores dos princípios gerados pela modernidade que ousaram enunciar serem todos iguais perante a lei. Amadurecida essa consciência e ao ensaiarmos ações concretas para fazê-la valer, nos deparamos com um cipoal de mecanismos protetores que se haviam criado para obstaculizar a apuração de responsabilidades atribuíveis a pessoas até então tidas como “acima de quaisquer suspeitas”. Coisas tais como: foro privilegiado, agentes com prerrogativas especiais, ritos e procedimentos diferenciados.

            No caso concreto, mal estão se formalizando os atos preliminares de um processo que – não nos iludamos – vai se estender por muitos anos. Da decisão coletiva e complexa, recém prolatada, correspondente, em processos criminais comuns, a uma fase singela, expressa em duas palavras grafadas de próprio punho pelo juiz - “recebo a denúncia” - , decorrerá, agora, uma sucessão de embargos e agravos. Superados estes, daqui a muito tempo, será a vez de interrogar todos os réus, ouvir testemunhas, examinar documentos, determinar perícias, expedir cartas precatórias e rogatórias, oportunizar debates, examinar dezenas de recursos outros a serem interpostos...Tudo assegurando o que se chama de “amplo direito de defesa”. Em Cortes da nobreza de um STF, examinando-se processos onde figuram como réus deputados, ex-ministros, diretores de estatais, banqueiros e empresários, defendidos invariavelmente por brilhantes advogados, todos os procedimentos revestem-se de ritualística processual de invulgar solenidade, onde sói imperar extremado formalismo, com muitas concessões ao decurso do tempo e ao requinte do verbo.

            Sequer deve se afastar a hipótese de que jamais tenhamos uma decisão definitiva a confirmar responsabilidades criminais e a lhes atribuir penas. É muito possível, provável mesmo, que os feitos prescrevam, sem que seu mérito seja apreciado.

            Em poucos anos, quase certamente, a população terá esquecido os fatos e a impunidade terá escrito mais um capítulo de nossa história. Que não seja isso motivo de desânimo, contudo. Assim mesmo, a caminhada de um povo em busca de eqüidade e da justiça terá avançado. Ética e progresso são metas do Espírito e de suas coletividades, que pedem tempo, experimentam fluxos e refluxos, provocam muitas frustrações e não mais que pequenas e parciais vitórias, até se fazerem conquistas definitivas, dando passo a um tempo novo que a outro tempo sucede. (A Redação)

           

Editorial

Espíritas são uma elite?

 

                  A grande maioria dos espíritas se acha entre pessoas esclarecidas e não entre os ignorantes .

Allan Kardec –“Estatística do Espiritismo”Revista Espírita – jan/1869

 

                  O jornalista de Veja Lauro Jardim (edição 2024, 05/09/2007), em sua coluna Radar, na secção Sobe consigna esta pequena notícia: “Segundo pesquisa do IBGE, os espíritas têm a maior renda média entre os brasileiros”.

                  Mesmo sem maiores dados sobre a aludida pesquisa, não parece que ela deva levar à conclusão de que os espíritas, no Brasil, formam uma elite econômica e social. Dados estatísticos anteriormente divulgados e analisados com mais profundidade têm dado conta de que o segmento espírita, em nosso país, é constituído fundamentalmente de pessoas de classe média com uma escolaridade que vai do segundo grau completo à instrução superior e pós-superior.

            O dado é significativo e parece consolidar-se nos últimos anos. Tudo leva crer que, especialmente depois da explosão das chamadas religiões evangélicas pentecostais e neopentecostais, o espiritismo brasileiro tem se caracterizado exatamente por reunir homens e mulheres de boa escolaridade, em sua média. Intelectuais e pessoas de sólida cultura sempre houve, e em número considerável, dentro do movimento espírita. Mas, à sombra destes, passaram, muitas vezes, a se declarar espíritas pessoas de baixíssima escolaridade e de pouquíssima capacidade de entender os próprios fundamentos do espiritismo. Habituaram-se a freqüentar centros espíritas atraídas pela curiosidade acerca dos fenômenos mediúnicos e, especialmente, por algumas práticas que, pouco a pouco, vão sendo superadas ou melhor racionalizadas, tais como: sessões envolvendo terapias e curas, atividades mediúnicas públicas e indiscriminada distribuição de passes, água magnetizada, receituário mediúnico, recursos nos quais depositavam uma fé verdadeiramente religiosa. As seitas evangélicas, com seu marketing e sua ânsia em atrair crentes, perceberam que poderiam capitalizar as tendências desse grupo de “usuários” dos serviços das casas espíritas, atraindo-os a seus templos com portentosos rituais de “descarrego”, libertação de “encostos”, distribuição de óleos sagrados, acompanhados de promessas de solução de todos os problemas a quem ali comparece e lhes paga o dízimo.

            Na medida em que essa massa descomprometida com o conhecimento migra para os templos evangélicos, o movimento espírita melhor vai se caracterizando como um segmento diferenciado no campo comumente denominado religioso ou espiritualista. Longe de formar uma elite econômica, firma-se, no entanto, pelo índice de escolaridade de seus integrantes, como um segmento razoavelmente culto e, em decorrência disso, com melhores oportunidades sociais e também econômicas.

            Recente livro do sociólogo Alberto Carlos de Almeida (Editora Record), A Cabeça do Brasileiro, trouxe a nu uma triste realidade nacional. Pesquisa em que se baseia o autor revela que o padrão ético do brasileiro é diretamente proporcional à sua escolaridade. O brasileiro típico, de escassa escolaridade, não esconde sua simpatia pela tortura, pelo “jeitinho brasileiro”, pela discriminação social, racial e sexual, pela lei do “olho por olho, dente por dente”, pela conduta policial abusiva e violenta. O brasileiro, em sua grande maioria, é arcaico, incivilizado, preconceituoso e autoritário, revela a pesquisa. A sondagem termina por concluir que quanto menor a escolaridade, maior é o relativismo moral do brasileiro, sua intolerância, seus preconceitos e sua incivilidade. Ou seja: aqueles que têm acesso à educação adquirem valores mais elevados e formam uma certa reserva de qualidade ética que permite sustentar a esperança de que, educado, o povo brasileiro pode dar um salto ético.

            Se é verdade que o segmento espírita ostenta bons padrões sociais e de escolaridade, é de se concluir que, igualmente, se situa naquela faixa, lamentavelmente ainda pequena, de brasileiros comprometidos com a ética individual e coletiva. Em seu tempo, na Europa, Allan Kardec observou esse mesmo perfil nas pessoas declaradamente espíritas. Orgulhou-se disso e, como educador, sentiu-se estimulado a trabalhar mais em favor da educação. Que tipo de educação? Aquela a que ele se referiu ao comentar a questão 685-a de O Livro dos Espíritos, consistente “na arte de formar os caracteres, a que cria hábitos, uma vez que a educação é o conjunto de hábitos adquiridos”.

 

Tudo leva crer que, especialmente depois da explosão das chamadas religiões evangélicas pentecostais e neopentecostais, o espiritismo brasileiro tem se caracterizado exatamente por reunir homens e mulheres de boa escolaridade, em sua média.

 

Opinião em Tópicos

 

Milton R. Medran Moreira

 

Em favor da vida

Agir em favor da vida é um pouco mais do que, por exemplo, levantar bandeiras e fazer passeatas pela criminalização ou agravamento de penas para o aborto.

Em nossa condição especialíssima de espíritas, temos uma mensagem muito mais profunda, eficaz e radical, que deveria nortear nossas ações.

No caso específico do aborto, os espíritas, lamentavelmente, estão sendo levados de roldão pelas posturas católico/evangélicas, cujos crentes, Bíblia na mão, amaldiçoam procedimentos e criminalizam ações, sem dispensar qualquer atenção às razões mais profundas de algumas condutas humanas que seriam facilmente evitáveis por meio da educação.

Nossa parceria com as religiões, nesse caso, é equivocada. Particularmente, me sinto mais à vontade na companhia de humanistas que, em alguns casos - dentre os quais o delicado tema do aborto - pugnam por uma descriminalização, mesmo considerando-o, em certos casos, uma atitude moralmente reprovável.

 

Direito Penal mínimo

            Nos tempos que correm, ganha corpo a idéia do chamado “Direito Penal mínimo”. Juristas e sociólogos do mundo inteiro estão concluindo que as penas, tal como foram concebidas na modernidade, centrando-se na privação da liberdade, não são eficazes para recuperar ninguém e, muito menos, para a prevenção da criminalidade. O Direito Penal só encontra uma justificativa nos dias atuais: como defesa social contra a criminalidade violenta, que é assustadora em países como o nosso. A cadeia deve estar reservada para indivíduos que perturbam de forma tal a sociedade que sua liberdade passa a ser um grave perigo à paz e à estabilidade social. Por essa filosofia da contemporaneidade, somente se justifica a intervenção penal do Estado, quando os outros ramos do Direito se mostrarem insuficientes. O Direito Penal, assim, pouco a pouco, faz-se subsidiário dos demais ramos do Direito, porque o tempo se encarregou de demonstrar sua ineficácia.

            Espiritismo e modernidade

            A filosofia espírita não discrepa dessa visão revolucionária e humanista do Direito. Ao contrário, toda a estrutura do pensamento kardeciano, fundada no que ele denominou “lei natural”, chega a entrever a possibilidade de a sociedade reger-se unicamente pelas leis naturais, dispensando as leis humanas (L.E. q. 794). Poderia ser assim, dizem os espíritos, em resposta à provocação de Kardec, “se todos compreendessem bem as leis naturais e quisessem praticá-las”. As leis positivas, dessa forma, inclusive as de natureza penal, são exigências provisórias da sociedade, dispensáveis na medida em que a educação e a vontade dos agentes forem capazes de superá-las.

            No caso específico do aborto, nada mais eficiente do que preveni-lo pela educação. No plano social e estatal, a prevenção deve se dar por amplas campanhas em favor da educação sexual, da contracepção e do planejamento familiar. Particularmente, vejo com simpatia o lema de alguns movimentos de mulheres em países das Américas: “Educação sexual para prevenir, métodos anticoncepcionais para não abortar e aborto legal para não morrer”.

            A contribuição espírita

            E quando se fala em educação, no plano estritamente espírita, se está falando em esclarecer sobre aquilo que é a proposta básica, fundamental e a própria razão de ser do espiritismo: a existência do espírito imortal.

            Pessoalmente, fico contrariado quando vejo o movimento espírita imiscuído entre crentes a lutar ferozmente pela manutenção ou ampliação de punições criminais para o aborto, que, via de regra, resulta de dramáticos estados de miséria e ignorância. Os espíritas deveriam, preferencialmente, empenhar-se na difusão de nossas idéias acerca da importância da vida, da paternidade e maternidade responsáveis. Somos detentores de um manancial filosófico que resgata a importância da encarnação do espírito como instrumento de progresso. A vida, diferentemente do que ensina o cristianismo, não começa com a concepção. É anterior a ela e, para que tenha sentido a vida material em seu projeto evolutivo, é preciso que encontre, sempre, condições de dignidade e de respeito, neste plano. Convenhamos: sustentar isso não é ser a favor do aborto.

           

Notícias

 

Grupo Jovem do CCEPA apresentará trabalho no 10º SBPE

 

Dentre os trabalhos previamente aprovados para a 10ª edição do Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita – SBPE – (11 a 14 de outubro/Santos,SP), figura o tema “Do poder de influência da consciência sobre a realidade – um breve comentário espírita”, de autoria de Bianca Medran Moreira, Carolina Grossini, Mariana Benchaya e Mariana Ruduit, que integram o Grupo Jovem do Centro Cultural Espírita de Porto Alegre, coordenado por Mariana Benchaya.

            São, ao todo, 25 trabalhos aprovados, de autores brasileiros e argentinos. O evento é patrocinado pelo Instituto Cultural Espírita Kardecista, de Santos/SP.

            As inscrições para participar do 10º SBPE seguem abertas e podem ser feitas pelo telefone do ICKS: (13) 3284-2918, ou pelo e-mail: ickardecista@terra.com.br . O valor da inscrição, incluindo 3 diárias em hotel conveniado, café e almoço, é de R$ 265,00 por pessoa.

 

Espíritas de Pelotas e Santa Maria também apresentam trabalho

            Das cidades gaúchas de Santa Maria e Pelotas também foram aprovados previamente trabalhos a serem apresentados no 10º SBPE.

            Colaboradoras da Sociedade Espírita Estudo e Caridade (Santa Maria/RS), Carmem R.Marchetti, Glória de L.Chagas, Marieta V.Holman e Norma S.Cassel são responsáveis pelo trabalho “É o Espiritismo uma Religião?”.

            Homero Ward da Rosa, da S.E.Casa da Prece (Pelotas/RS) comparece com o trabalho “O Mal Moral e o Espiritismo”.

 

O Espírito e o Espiritismo em duas palestras mensais do CCEPA

            As tradicionais palestras da primeira segunda-feira do mês, em setembro e outubro deste ano, no Centro Cultural Espírita de Porto Alegre – CCEPA – foram reservadas a dois expositores da Casa:

            Na noite de 4 de setembro, às 20h30, o conferencista foi o presidente da CEPA e editor deste jornal, Milton Medran Moreira, que falou a um público de aproximadamente 60 pessoas sobre o tema Espírito: Abstração ou Realidade?, historiando os enfoques filosóficos e científicos, da Antiguidade à Contemporaneidade, em torno do espírito, com destaque para a síntese oferecida por Allan Kardec e o espiritismo.

            No próximo dia 1º de outubro, em homenagem ao aniversário natalício de Allan Kardec (nascido a 3.10.1804), o trabalho estará a cargo do presidente do CCEPA, Maurice Herbert Jones, que discorrerá sobre Espiritismo – A Construção de um Paradigma, destacando as influências culturais na vida e na obra de Kardec.

 

Enfoque

 

Cientista português fala sobre espiritismo nas Universidades de Cambridge e Oxford

 

Maria José Cunha*

 

O Professor Doutor Luís de Almeida, cientista português da Agência Espacial Europeia (ESA) e da Agência Espacial Norte-Americana (NASA) levou a Doutrina Espírita aos rigorosos meios académicos das Universidades inglesas de Cambridge e Oxford.

 

            O Prof. Doutor Luís de Almeida proferiu no dia 14 de Julho no conceituado «Instituto de Ciências Matemáticas Isaac Newton» da Faculdade de Matemática da Universidade de Cambridge, dirigido actualmente pelo Professor Doutor Stephen Hawking, pelas 9h., uma conferência intitulada "O que é espiritismo, e o que não é espiritismo". Uma segunda palestra, com início às 14h, foi subordinada ao tema "O Papel do Espiritismo na sociedade vigente e a importância do espiritismo na vida de um cientista»

            Foi a primeira vez que a Universidade de Cambridge abriu as portas a um cientista para, abertamente, falar sobre a doutrina espírita. O público, composto exclusivamente por cientistas, professores e alunos universitários europeus, esgotou praticamente a lotação de cerca de 500 lugares da sala.

            Aproveitando uma deslocação de trabalho do cientista português à referida universidade, um grupo de colegas ingleses, irlandeses e escoceses agendaram, sem conhecimento prévio do Professor Luís de Almeida, a conferência, curiosos pela forma como este sempre dialogara, em privado, sobre a Doutrina Espírita.

            A abordagem realizada permitiu um constante paralelismo entre Espiritismo e Ciência nos domínios da Astrofísica e da Cosmologia. Esta por ser uma ciência única, na qual só pode haver observações, e não experiências – tente-se retirar uma amostra do tecido do universo, ou arrancar um pedaço do Sol, para colocar numa lamela e levar ao microscópio -, de igual forma o Professor Allan Kardec criou um método para melhor se entender a realidade espiritual que nos envolve. Não se precisa observar buracos negros, estrelas nos confins do universo ou matéria escura para saber que existem. De forma muito semelhante, não é necessário visualizar espíritos e sua influenciação para sabermos da sua existência. Em ciência e no espiritismo, a observação, a reflexão filosófica e a revelação espiritual (espiritismo) ou intuitiva (ciência) são meios que cooperam na busca da verdade e, cada um deles, controla o outro. É precisamente a partilha deste princípio que faz que um espírita ou um cosmólogo possuam um sentido de análise crítica.

Dos fenómenos espíritas desde os primórdios da história da humanidade aos que despertaram a curiosidade do físico-químico inglês Sir William Crooks, do astrónomo francês Camille Flamarion e do pedagogo francês Hippolyte Léon-Denizard Rivail (Allan Kardec), entre tantos outros mais homens de ciência, aos quais a fenomenologia lhes despertou a verdadeira alma do cientista: a curiosidade.

            Prosseguindo na sua linha de analogia entre “ciência e espiritismo” o cientista português, afirmou mesmo que ser espírita é ser como um cientista, «… sermos homens e mulheres dos “Porquês..?” Querermos sempre saber mais e mais. Compreendermos, para melhor conhecer a Vida e conhecermo-nos a nós próprios; esta é a proposta impar que a doutrina espírita nos oferece. Uma doutrina lógica e racional, libertadora e consoladora (…) que consola o coração com a razão e liberta a mente com o amor (…)», atestou Luís de Almeida, de forma surpreendente, levando a platéia a interromper com uma salva de palmas. Luís de Almeida comentou então com o auditório que o espiritismo “nasceu” em França e, vários vultos da cultura inglesa e mundial, como Sir Arthur Conan Doyle, os matemáticos ingleses Lord Rayleig e Prof. De Morgan, Sir David Brewster, o médico russo Aleksander Aksakof, o Prof. Butlerof, o astrónomo alemão Friedrich Zöllner, o fisiologista francês Charles Richet, o naturalista inglês Alfred Russel, o físico inglês Sir Oliver Lodge, o cientista alemão von Braun, entre centenas de tantos outras individualidades européias, estudaram esses fenómenos e que, na actualidade, a Inglaterra e os EUA têm vários pesquisadores de primeira linha na continuidade desses estudos, rumo a um maior conhecimento das perguntas que todos os cientistas colocam; quem somos, de onde viemos e para onde vamos.

            Com uma linguagem racional e objectiva explicou que, no caso português, a Fundação Bial, da cidade do Porto, concede bolsas aos pesquisadores que pretendem estudar o “espírito” e que, na sequência, os congressos da Bial a nível médico são dos mais conceituados da Europa. No Brasil, o médico psiquiatra Alexander Moreira-Almeida, a Profª. Doutora Dora Incontri e o Eng. Hernâni Guimarães de Andrade (já desencarnado), todos de S. Paulo, deram e dão enormes contributos para um espiritismo muito sério, com rigor e dirigidos igualmente para o meio académico. Sem esquecer a vida do maior médium espírita psicógrafo de todos os tempos, Francisco Cândido Xavier, com mais de 400 livros nas mais variadas áreas e estudado pela NASA. À plateia inglesa, que pela primeira vez ouviu falar de espiritismo, explicou que, por vezes, pessoas mal-intencionadas e/ou ligadas ao ocultismo: tarot, astrologia, adivinhações e outras crendices, se intitulam de espíritas aproveitando-se da seriedade e respeitabilidade que o espiritismo possui. Numa breve viajem histórica através do movimento espírita europeu explicou que Portugal, Espanha, França, Inglaterra, Bélgica, Rússia e Suécia, de entre outros países europeus, tinham um número apreciável de adeptos no início do século XX, mas que a I e II Grandes Guerras abalaram fortemente o alicerce do espiritismo europeu e, do que restou, em Portugal e Espanha, as ditaduras de Salazar e Franco quase extinguiram o que sobrou tendo, neste último país, alguns espíritas sido fuzilados por ordem do General Franco.

            Face ao interesse despertado, a conferência prosseguiu até às 13h30, reiniciando-se às 14 h. Na parte da tarde o pesquisador português explicou, como cientista, a importância do espiritismo na sua vida pessoal, social e profissional. Narrou factos pessoais, tendo muitos dos colegas intervindo para relatarem factos semelhantes, e informou que em Inglaterra existe uma Federação Espírita: a British Union of Spiritist Societies.

            O êxito e o entusiasmo gerado entre os assistentes fizeram com que colegas de várias universidades do Reino Unido tivessem endereçado convites para palestras semelhantes nas respectivas universidades. Por necessidade de cumprimento do calendário de trabalho apenas foi possível a realização de uma única sessão na universidade de Oxford, ocorrida no dia 16 de Julho, pelas 15 h., à qual puderam comparecer 250 académicos britânicos. Nesta palestra o tema «Por que sou cientista e espírita», o Professor teve a oportunidade de explicar pormenorizadamente importância de um cientista ter, como bússola na sua vida social e académica, uma “ciência filosófica de conseqüências morais”.

            Indagado acerca da receptividade das suas palavras, o cientista português respondeu “os europeus estão bem receptivos à Doutrina Espírita”.

 

* Maria José Cunha, historiadora, articulista, conferencista, pesquisadora e dirigente espírita, da cidade de Sines, Portugal.

 

(Nota da redação: Foi preservada a ortografia original, portuguesa, no texto produzido pela pesquisadora Maria José Cunha).

 

Opinião do Leitor

 

Religião e re-ligação

Caro Medran,

            A propósito do seu ótimo texto em Opinião em Tópicos de agosto, gostaria de colocar o seguinte:

            "Re-ligação = religião, é impossível, por dois motivos: Primeiro, pela etimologia das palavras. Os doutores Carlos Imbassahy  (pai e filho) ensinam que as duas palavras latinas têm radicais diferentes: religO, religAS, religAT, religAMUS, religATIS, religANT  (indicativo presente) religAVI (pretérito)  religATUM (supino)  e religARE (infinitivo)  Em nenhuma das formas aparece o "i" de religiO ou ReligiONES."

            Essa afirmação, constou do meu artigo publicado no livro "O Pensamento Atual da CEPA”.

            Notando que você escreveu que "religare = religião"  venho  tirar a dúvida sobre o assunto. Sei que você é versado em latim e por isso, acredito que o tenha afirmado com conhecimento de causa. O que acha do posicionamento do Imbassahy?

            Um abraço!

            Nícia Cunha Cuiabá/MT  

 

Resposta do editor:

É possível, Nícia, que os Imbassahy tenham razão, com relação à etimologia da palavra. Há controvérsias sobre isso. Veja:

            "A palavra religião é de origem latina (religio). O significado não é claro. Cícero (106-43 a. C.) no De Natura Deorum afirma que a palavra vem da raiz relegere (“considerar cuidadosamente”), oposto de neglere, descuidar. Já Lactâncio, escritor cristão (m. 330 d.C.), diz que vem de religare (“ligar”, “prender”). Para Cícero, a religião é um procedimento consciencioso , mesmo penoso, em relação aos deuses reconhecidos pelo Estado. Para Lactâncio, a religião liga os homens a Deus pela piedade. Um termo de partida e um de chegada, em que princípio e fim são os mesmos. As duas raízes complementam-se". (Enciclopédia Luso-Brasileira).

            De qualquer sorte, amiga, o que eu pretendi destacar no artigo é que, para o cristianismo, o conceito que vale de religião é precisamente este, o de Lactâncio, segundo quem, a religião liga o homem a Deus (de quem ele havia se desligado). Toda a teologia cristã está baseada no episódio bíblico do pecado original que desligou a criatura do criador, necessitando, mais adiante, a vinda de um redentor que, pelos mecanismos exclusivos da Igreja, poderia resgatar a culpa do homem, devolvendo-lhe o estado de graça.

Assim que Bento XVI, um teólogo muito cioso de suas verdades eternas, tem lá suas razões em proclamar que só a dele é Igreja e que só a dele salva. Os evangélicos preferem dizer que só Jesus salva (e muitos espíritas, sem se aperceberem, terminam por repetir esse chavão).

Sobre o tema, temos na literatura espírita uma excelente obra de Krishnamurti de Carvalho Dias, "O Laço e o Culto" (esgotada) que defende que, entre os romanos, a "religio" era o laço que ligava os homens entre si, garantindo a união dos cidadãos romanos em torno de seus projetos e de sua cultura. Daí o sentido que Kardec deu ao que chamou de "religião em sentido filosófico", atribuído, em seu Discurso de Abertura (1º/11/1868), ao espiritismo como conjunto de idéias capazes de congregar a comunidade espírita internacional, embora advertindo de que não convinha ao espiritismo apresentar-se como religião, justamente para evitar confusão com aquilo que terminara sendo tomado como religião em nossa cultura.

 

            As lições da tragédia

            Parabéns pelo excelente editorial de Opinião - As lições da tragédia - do último mês de agosto.

            O texto mereceria figurar em muitos outros jornais, neste momento que sucede ao trágico acidente aéreo, ocorrido em São Paulo.

            Mais um trabalho de "mestre".

            José Lázaro Boberg jlboberg@uol.com.br – Jacarezinho/PR.