OPINIÃO Ano XIV – 144 Agosto 2007

Porto Rico prepara Congresso da CEPA

Nossa Opinião:   Kardec, congressos e a CEPA

Editorial:  As lições da tragédia

Notícias:   Novo Curso de Iniciação ao Espiritismo no CCEPA  -   Parceria CCEPA/CVV em Defesa da Vida  -    Livro dos Espíritos e seu potencial filosófico   

Opinião em Tópicos:   Verdade e ecumenismo  -   Pecado e redenção  -  Poder e fé   -   Unificação e liberdade  (Milton Medran Moreira)

Enfoque:    Não à violência

Opinião do leitor

 

 

 

Porto Rico prepara Congresso da CEPA

 

Com a presença em Porto Alegre de Pablo Serrano, presidente da Comissão, Conselho Executivo da CEPA define estrutura do XX Congresso Espírita Pan-Americano.

 

            Os espíritas de Porto Rico, a bela ilha tropical caribenha, estão entusiasmados com a proximidade do XX Congresso Espírita Pan-Americano, que sediarão no período de 4 a 8 de junho.

            O médico porto-riquenho Pablo Serrano, que preside a Comissão Organizadora do Congresso da CEPA, fecha o detalhado depoimento que prestou ao boletim América Espírita, encartado nesta edição, com um convite dirigido a todos os espíritas do Continente: “Nos vemos em Porto Rico em junho de 2008”. Serrano, que esteve em Porto Alegre, para reunir-se com o Conselho Executivo da CEPA, faz um minucioso relato de sua visita e da programação que o Congresso desenvolverá

 

            Conferencistas, painéis temáticos e temas livres

            Os Congressos da CEPA são, tradicionalmente, abertos à contribuição de todos os espíritas. Além de conferencistas, em número de 3 ( á noite), oito pensadores ligados à CEPA participarão dos chamados Painéis Temáticos (períodos da manhã), abordando assuntos de relevância científica, social e filosófica, subordinados ao tema central “O Desenvolvimento Integral da Humanidade – Contribuição Espírita”. Temas como bioética, sexualidade, drogadição, fundamentalismo, globalização e outros merecerão abordagem e aprofundamento numa perspectiva espírita e livre-pensadora. À tarde, o Fórum de Temas Livres receberá a contribuição de espíritas das mais diversas partes do mundo que enviarem previamente seu trabalho à seleção a ser feita por uma comissão especial.

            O relato de Pablo Serrano, na página inicial de América Espírita traz todos os detalhes da programação, inclusive com os temas das conferências e painéis temáticos. Dentre os conferencistas, figura o físico e escritor porto-alegrense Moacir Costa de Araújo Lima, com o tema “A Ciência ao Encontro do Espírito”.

 

            Inscrições e valores

            As inscrições já estão abertas e podem ser feitas pela Internet, através do site oficial do Congresso: www.conocenos.org . O valor da inscrição é de 250 dólares, incluindo: material do congresso, coquetel de boas-vindas; desjejum, lanche e almoço, durante três dias, e jantar dançante de despedida.

            A hospedagem no Holyday Inn San Juan, hotel em que se desdobrará o Congresso, tem tarifas especiais para o evento: 130 dólares (mais impostos) por apartamento para duas pessoas. Poderão se hospedar mais duas pessoas por apartamento a 25 dólares, cada uma (mais impostos).

 

Nossa Opinião

 

                              Kardec, os Congressos e a CEPA        

 

            Em interessante documento que terminou sendo publicado em suas “Obras Póstumas”, com o título de “Constituição do Espiritismo – Exposição de Motivos”, Allan Kardec, ao fim de sua vida física, deixou claras estas duas idéias:

            1 – Que os princípios espíritas, por se basearem nas leis naturais, tendiam a ser universalmente aceitos pelo homem. Todos os aceitariam um dia, por se tratar de “verdades palpáveis e demonstráveis”, escreveu.

            2 – Esses princípios, entretanto, deveriam ser constantemente desenvolvidos pelos espíritas, de forma a assimilar os novos conhecimentos da ciência, porque “criado para o estado atual dos conhecimentos, deve (o espiritismo) modificar-se, na  medida que novas observações venham a demonstrar-lhe sua insuficiência e seus defeitos”. Propôs, então, Allan Kardec que essas modificações deveriam ser “resultantes dos congressos orgânicos, que a uma revisão periódica dos Estatutos acrescentariam a dos formulários de princípios”. “A revisão – escreveu ainda – será não somente um direito, mas um dever para esses congressos”.

            As décadas que se seguiram à desencarnação de Kardec foram bastante pródigas na realização de congressos espíritas na Europa. Alguns deles contaram com milhares de participantes, como foi o 1º Congresso Espírita Internacional (Barcelona, 1888) e, especialmente, também em Barcelona, o 5º Congresso Espírita Internacional (1934). Nesse mesmo período, realizaram-se congressos espíritas e espiritualistas em Paris, Londres e outras importantes capitais européias.

            As duas Grandes Guerras Mundiais, as ditaduras que a elas se sucederam, as crises econômicas que seguiram a esses conflitos mundiais, foram alguns fatores que, além de debilitar o movimento espírita mundial, opuseram imensas dificuldades à realização de congressos espíritas. Outro fator, entretanto, contribuiu de maneira muito particular para que, por algum tempo, os congressos espíritas fossem esquecidos: a sedimentação da “religião espírita”, especialmente no Brasil, o maior país “espírita cristão” do Planeta. Tendo-se transformado o espiritismo, a partir dessa influência, basicamente em uma questão de fé, tornava-se dispensável e até pouco recomendável que as crenças por ele adotadas fossem objeto de discussões, debates, possíveis dissensos, e, muito menos, alterações feitas em congressos.

            O surgimento da Confederação Espírita Pan-Americana, em 1946, na Argentina, foi decisivo para que se reabilitasse, no movimento, a prática dos congressos. Previstos, já em seus estatutos iniciais, como órgãos máximos de deliberação e, inclusive, de adoção de novos conceitos doutrinários, os congressos, desde aí, tiveram, no âmbito da CEPA, regularidade nunca interrompida. Logo se criaram, também, as chamadas Conferências Regionais, como instrumentos complementares a servir a esses objetivos. Com a realização do Congresso de Porto Rico, a CEPA chega aos 33 eventos internacionais dessa magnitude, realizados nos 62 anos da instituição, a serem completados no ano do evento.

            Essa atenção ao que recomendou Kardec, embora haja transformado a CEPA, ao curso do tempo, em um movimento quantitativamente menor, frente aos valores numéricos do chamado “movimento espírita religioso ou evangélico”, é testemunho vivo e eloqüente de fidelidade a Allan Kardec, um século e meio após o lançamento de sua obra. Fica também patenteada a contribuição dada ao movimento espírita como um todo, pela CEPA, na medida em que ninguém mais se atreve a discutir sobre a da conveniência ou não dos congressos espíritas. Embora nem sempre sejam estes realizados nos moldes e com os objetivos recomendados por Kardec.

 

Editorial

 

AS LIÇÕES DA TRAGÉDIA

 

O teísta não sabe como Deus castiga, como favorece, como perdoa; pois não é assaz temerário para se gabar de conhecer a maneira de agir de Deus; mas sabe que Deus age e que é justo.

(Voltaire –Dicionário Filosófico)

 

Em meio à maior tragédia aérea da história do Brasil, acontecida no último 17 de julho, um operário declarava ao repórter de televisão: “Eu só estou vivo, porque Deus é bom”. Pouco antes da explosão da aeronave, ele havia deixado o prédio da TAM.

            Entretanto, cerca de 200 pessoas perderam a vida.  Mães desesperadas choravam por seus filhos mortos prematuramente. Irmãos, amigos, parentes, a nação inteira deplorava as trágicas mortes do acidente aviatório. Era de se perguntar, então, diante da reconhecida manifestação do jovem operário: Deus não teria sido bom para com os outros?

            Há quem pense que Deus escolhe, aleatoriamente, quem deve viver ou morrer, os que têm ou não direito à felicidade, os que irão se salvar e aqueles que serão condenados. Em circunstâncias como a de 17 de julho, há sempre uma história de quem perdeu o vôo e atribui isso à vontade “pessoal” e “inescrutável” de Deus que não queria que ele morresse. E os outros? O Senhor da Vida quer que morram?

            Entre nós, espíritas, tragédias dessa magnitude servem, invariavelmente, para inspirar novelescas interpretações em cuja trama colocam-se todas as infelizes vítimas na posição de algozes do passado. Elege-se, assim, o primário postulado do “olho por olho, dente por dente”, como único instrumento capaz de restabelecer, mesmo em espíritos sadios, esclarecidos e cumpridores de suas obrigações perante a vida, o equilíbrio que, por erros de aprendizado, tenham anteriormente violado.

            Não é bem assim. Somos todos construtores da vida. Nosso pensamento e nossa ação estão, continuamente, formando a teia do ambiente em que nos movemos. De nossos acertos e erros resultam conseqüências que atingem a nós próprios e, freqüentemente, alcançam outras pessoas, inocentes ou não. A lei de causa e efeito funciona, sim. Não contudo, mediante meticulosas fórmulas matemáticas, mas valendo-se, sempre, da variada gama de circunstâncias da vida. Nestas há lugar para a inteligente construção de mecanismos de sabedoria, ordem e disciplina, capazes de prever e evitar erros e injustiças. Mas subsistem espaços para equívocos, distorções e – por que não? – também para os casos fortuitos, os acasos e suas imprevisíveis ocorrências, das quais resultam flagrantes injustiças. Flagrantes, mas sempre provisórias, eis que a própria vida se encarregará, amanhã, de compensá-las com úteis lições e valiosos aprendizados. É o dinamismo da vida, no qual cabem o bom e o mau, os acertos e os erros, os acasos e as imprevisões, tudo, no entanto, no rumo da harmonia, do equilíbrio e da perfeição, estado para o qual tendemos.

            Toda experiência, boa ou má, é lição. E tudo o que Deus, Inteligência Suprema, quer de nós é que aprendamos. Injustiças, dores e tragédias, mesmo as mais amargas, como do dia 17, também são aprendizados. Por que tomá-las sempre como castigos? Por que vê-las como sinais de uma justiça invisível que premia uns e pune outros? Preferível contemplá-las simplesmente como fatos. E fatos ensinam. Principalmente quando divisamos no fenômeno da vida algo além do aqui e agora.

Tragédias como aquela deixam-nos um recado: a humanidade tem muito ainda a aprender. Muito além daquilo que, arbitrariamente, definimos como Deus, ou como justiça e injustiça, bem e mal e, também, como vida e morte.

 

A lei de causa e efeito funciona, não mediante meticulosas fórmulas matemáticas, mas valendo-se, sempre, da variada gama de circunstâncias da vida.

 

Opinião em Tópicos

 

Milton R. Medran Moreira

 

Verdade e ecumenismo

            A polêmica do mês de julho ficou por conta de documento publicado pela Congregação para a Doutrina da Fé, órgão do Vaticano em outros tempos responsável pela Inquisição. Com aquele zelo jamais perdido, embora por algum tempo disfarçado, em defesa de suas verdades, a Santa Sé emitiu um pronunciamento com o título de “Respostas a Questões Relativas a Alguns Aspectos da Doutrina sobre a Igreja”, reacendendo o debate em torno das posições do catolicismo sobre o ecumenismo e o diálogo inter-religioso. Sem deixar por menos, o documento declara: “A única verdade da fé cristã encontra-se na Igreja Católica”.

            O pronunciamento foi um balde de água fria jogado em um dos movimentos mais importantes das últimas décadas da cristandade, denominado “ecumenismo cristão”. Nos anos 60 do século passado, com o Concílio Vaticano II, a Santa Sé parecia acenar para uma aproximação com as demais igrejas cristãs. Muitos se apressaram a vislumbrar naquele movimento um processo de unificação das igrejas separadas. Ledo engano, agora desfeito.

Pecado e redenção

            Para se compreender a posição da Igreja, é preciso recordar algo que está na base da própria etimologia do termo religião. A palavra vem da expressão re-ligar (ligar de novo aquilo que se desligou). Toda a proposta do cristianismo está intimamente vinculada justamente a essa visão radical de religião. No mito judaico-cristão, o homem foi criado por Deus para servi-Lo e, em contrapartida, gozar de todos os bens que a divindade igualmente criou e lhe pôs à disposição, desde que se mantivesse fiel às regras impostas por Jeová. A desobediência, chamada de pecado, terminou por redundar na expulsão do paraíso. O primeiro casal e toda sua descendência passaram, a partir de então, a viver uma maldição que só a chamada “redenção” poderia anular. Um messias, cognominado salvador, igualmente divino, encarnou com esse propósito específico: estabelecer na Terra mecanismos de redenção do homem. Para isso constituiu uma igreja: “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei minha igreja”;“As portas do inferno não prevalecerão contra ela”; “O que ligares na Terra, será também ligado no céu, o que desligares na Terra igualmente será desligando no céu”.

            Poder e fé

            A modernidade, com sua visão laica da vida e do universo, terreno onde deve se inserir também o espiritismo, não pode se coadunar com a mitologia em que se radica o poder eclesiástico. Por isso, custa-nos entender em um mesmo contexto, pleno de humanismo, tolerância e universalismo, como foi a mensagem de Jesus de Nazaré, palavras e interpretações tão fortemente marcadas pelo poder e pelo dogma.

            Os dois grandes cismas do cristianismo - o que deu origem à Igreja Ortodoxa, no Século 11 e a Reforma Protestante do Século 16 - derivam de divergências que envolvem respectivamente poder e fé. Isso gerou conflitos, mortes e guerras, mas com o tempo e com seu enfraquecimento institucional, tudo passou a ser negociável para o Vaticano. Tudo, menos os fundamentos de sua fé e a preservação do poder divino que lhe teria sido outorgado na pessoa de Pedro. São cláusulas pétreas que não podem ceder mesmo diante de propostas de conciliação ou de união da cristandade. Daí o impasse, que agora parece se mostrar definitivo, colocando uma pá de cal sobre o movimento ecumênico cristão.

            Unificação e liberdade

            Uma retrospectiva que se venha a fazer sobre a história do movimento ecumênico, importante bandeira de lideranças cristãs nas últimas décadas, põe a nu a ambigüidade do Vaticano. Por um lado, dava mostras de apoiar o movimento e até concretizou algumas medidas. Passou, por exemplo, a aceitar como cristãos os batizados em outras igrejas, admitiu o casamento inter-religioso, aceitou a celebração de cultos ecumênicos. Mas, a par disso, a Igreja Romana afirmava que a unificação só seria viável se as demais igrejas voltassem a seu redil. A posição ficou, agora, clara no documento publicado. Inclusive através de uma declaração forte: os demais ramos do cristianismo sequer têm o direito de se proclamarem “igrejas”, porque a única legítima, instituída diretamente por Cristo, a partir da unção de Pedro, é ela.

            Qualquer semelhança com outros movimentos unificacionistas religiosos não é mera coincidência. É a comprovação de duas verdades milenares: 1ª - religião não se coaduna com coisas como tolerância, pluralismo ou liberdade de pensamento; 2ª – religião e poder são inseparáveis.

 

Notícias

Novo Curso de Iniciação ao Espiritismo no CCEPA

 

            Um Curso de Iniciação ao Espiritismo será promovido pelo Centro Cultural Espírita de Porto Alegre em comemoração aos 150 anos de lançamento de "O Livro dos Espíritos".

As aulas serão às 5as. feiras, das 20h30min às 21h30min, de 9/8 a 13/9, e as inscrições, gratuitas, podem ser feitas no início do curso, na Rua Botafogo, 678 - Menino Deus. Informações pelo e.mail ccepa@terra.com.br ou pelo telefone 3231-9752.

 

Parceria CCEPA/CVV em Defesa da Vida

 

            Revestiu-se de êxito a parceria celebrada entre o Centro de Valorização da Vida, Posto de Porto Alegre, e o Centro Cultural Espírita de Porto Alegre, comemorando os 37 anos de existência do CVV na capital gaúcha.

            Uma semana inteira de programação marcou a efeméride. As palestras foram realizadas no auditório do CCEPA. As primeiras delas, na noite de 31 de julho, desdobraram-se em duas atividades: um depoimento do voluntário Paulo, sobre a filosofia e a história do CVV em Porto Alegre, e uma palestra de Milton Medran Moreira: “Os 150 anos de O Livro dos Espíritos – Valorizando a Vida”. Na noite de 1º /9, o palestrante foi o médico obstetra Ricardo Herbert Jones: “Fundamentos Ancestrais da Afetividade”. Em 2/8, a médica psiquiatra Débora Vilgevani Shaf discorreu sobre “Transtornos da Bi-Polaridade”. O encerramento, em 3/8, foi com as psicólogas Liane Bastos Vieira e Bárbara dos Santos Alfaya: “Educação Emocional, um Caminho com o Coração, seguido de uma apresentação do Coral de Idosos do Asilo Padre Cacique.

            Espiritismo e CVV – uma histórica interconexão.

            O Centro de Valorização da Vida é uma entidade de caráter civil, sem qualquer vinculação com nenhuma crença ou religião. Historicamente, entretanto, tem um vínculo com o movimento espírita, segundo revela dissertação de mestrado de André Barreto Prudente, da USP. O Boletim CVV, de Julho de 2007, encaminhado a esta redação pelo voluntário do CVV Leonardo de Oliveira, traz uma resenha desse trabalho destacando que, em São Paulo, o CVV nasceu da ação de um grupo de pessoas que promoveu uma Campanha de Prevenção do Suicídio cujos primeiros voluntários estavam vinculados à Escola de Aprendizes do Evangelho, da Federação Espírita do Estado de São Paulo. Refere ainda o trabalho: “Em decorrência do apoio constante e irrestrito que os voluntários do CEAE, que se sediava em São Paulo e com filiais em São dos José dos Campos, Jundiaí e Porto Alegre, prestou ao CVV, formou-se um ‘Consórcio Espiritual’ ao qual se denominou Fraternidade Esperança”.

A parceria agora revivida em Porto Alegre, no aniversário do CVV, destacou-se exatamente por enfocar os valores de respeito à vida e à sua dignidade que estão na base das duas instituições promotoras do evento.

 

O Livro dos Espíritos e seu potencial filosófico

A conferência mensal da primeira segunda-feira de agosto (6), no CCEPA, esteve a cargo do historiador Jerri Almeida, de Osório (RS) que, a convite do Depto.de Eventos da instituição, falou sobre O Potencial Filosófico de O Livro dos Espíritos, ainda em comemoração dos 150 anos da mais importante obra de Allan Kardec.

 

Enfoque

Não à violência

                                 

Doris Madeira Gandres *

 

Todos nos olham de cara feia, calam-se ostensivamente ou até mesmo se afastam quando falamos de violência.  Pretendem talvez assim demonstrar que não querem participar, se envolver, acreditando certamente que desse modo estão neutralizando a “força do mal”.

Contudo, se pararmos para pensar e analisarmos a questão com isenção de medos, preconceitos ou idéias insufladas e impostas à nossa mente, perceberemos que tal conduta nos coloca exatamente na condição de omissos, o que, por sua vez, faz com que, além de deixarmos espaço para que o mal se estabeleça e se fortaleça, nos torna co-responsáveis, praticamente cúmplices, de todos esses atos nefastos.

Ignorar o estado de violência, fingir que ela não existe, não fará com que efetivamente deixe de existir; da mesma forma que combater a violência com violência também não fará com que ela deixe de se manifestar e atuar. Se isso resolvesse o problema, há muito a humanidade já viveria em harmonia pois, no decorrer de nossa história,  não faltaram (e não faltam) atitudes violentas, inclusive de extrema violência, para reprimi-la, em pequena ou larga escala,). 

Um escritor persa dos idos do século XII, Muslah Al-Din Saadi, escreveu ao que parece muito sabiamente: “aquele que tem por hábito a violência não exercerá a soberania, pois o lobo não desempenhará as funções de pastor”...

Visto que somos seres sociais, que agimos e interagimos uns com os outros nas coletividades em que estamos inseridos, compreende-se que não podemos simplesmente cruzar os braços e ficar assistindo a todo e qualquer desmando, abuso, arbitrariedade ou qualquer outro crime de menor ou maior porte e argumentar, reclamar e se “enjaular”cada vez mais.

Outro escritor, este alemão, do século XIX, Theodor Fontane, afirmava com muita razão que “não querer tomar conhecimento não é tolerância”.

Aquilo de que precisamos, no entanto, não são ações intempestivas, brutais, desumanas, que acabam atingindo não apenas os faltosos envolvidos mas também a população em geral – haja vista a quantidade cada vez maior de pessoas que nada têm a ver com a violência feridas e até mortas face a essas atitudes de ambos os lados – dos denominados bandidos e dos policiais.

O de que, penso eu, verdadeiramente precisamos, é de toda uma reestruturação social, abrangendo todos os segmentos da sociedade, básica e solidamente apoiada na educação – mas numa educação esclarecida e esclarecedora, onde a instrução, ou seja, o acúmulo de conhecimentos, seja ferramenta ética para a moralização e a boa formação das criaturas de todos os níveis, etnias e credos.  Só essa educação bem compreendida e bem aplicada será capaz de atuar na prevenção pois hoje praticamente só agimos na repressão.

Uma tal organização social que, quando crime houver, seja de que tipo for e praticado por quem quer que seja, seja tratado dentro dos rigores da lei porém com respeito à condição humana; que os meios repressivos e corretivos empregados sejam realmente de auxílio à erradicação da ignorância e de re-educação do apenado.

Bom seria se todas as casas de detenção e presídios tivessem obrigatoriamente que fornecer trabalho (remunerado dentro de padrões minimamente compatíveis com a atividade exercida) e estudo, a fim de ajudar esses irmãos desviados e equivocados a, se verdadeiramente o desejarem, se ressocializarem e se tornarem úteis à família e à sociedade que agrediram de uma forma ou de outra.

Simplesmente “engavetá-los”, 24 horas por dia, dia após dia, semana após semana, mês após mês, ano após ano, só faz aumentar a revolta desses espíritos – revolta que retornará de forma ainda mais danosa à sociedade em geral.

Felizmente agora, talvez porque tenhamos atingido aquele “excesso de mal que nos faz compreender a necessidade do bem e das reformas” (O Livro dos Espíritos – q.784) já vemos manifestações cada vez mais freqüentes em nome da paz; já vemos pessoas, grupos, entidades enfrentando a violência com atitudes pacíficas, com ações esclarecedoras no bem e educativas, geralmente fornecendo aos marginalizados e oprimidos um objetivo, uma oportunidade de melhoria em sua condição material, intelectual e, obviamente, espiritual.

Lembramos ainda também o que recomendava Platão, discípulo de Sócrates -  “Buscando o bem dos nossos semelhantes encontramos o nosso”.

Concluímos que desde há muitos e muitos milênios não nos têm faltado recomendações, esclarecimentos e bons exemplos – Gandhi, Martin Luther King, Buda, Confúcio, Krishna, Nelson Mandela, Zoroastro, Chico Mendes, Teresa de Calcutá e outros milhares conhecidos e outros tantos milhares anônimos...  E certamente Jesus de Nazaré, aquele que tudo resumiu ao ensinar “faz ao próximo o que desejas que ele te faça”.

Nós é que ainda preguiçosos e acomodados preferimos agir como aqueles três macaquinhos e tapar os olhos, os ouvidos e a boca.  Só que não dá mais para agir assim pois os lobos estão dizimando os cordeiros que já não têm mais para onde fugir e se esconder.

São ainda os Espíritos amigos que nos incentivam: “Os maus prevalecem porque os bons são tímidos; quando estes quiserem prevalecerão” (OLE q.932).

 

 

* Doris Madeira Gandres - dorisgandres@yahoo.com.br - é escritora espírita, residente no Rio de Janeiro.

 

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Opinião do Leitor

Retificação

Quero fazer uma correção nos créditos colocados ao pé de meu artigo publicado em Opinião de junho 2007, para reafirmar que, de fato, já desempenhei várias atividades em Sociedades Espíritas de Santa Maria, porém não na segunda Instituição, como constou. No momento, estou vinculado somente à Sociedade Espírita Estudo e Caridade.

            A.Jorge Dornelles Budó – Santa Maria/RS.