OPINIÃO Ano XIII    Nº 142 Junho 2007

Brasil é um país espiritólico

Editorial: Espírito e modernidade

Nossa Opinião: Afinal, o que somos?

Notícias:  Ramiro D’Ávila: mais do que sopa, cultura espírita  //  CVV comemora aniversário no CCEPA // Primeira segunda-feira: dia de conferências no CCEPA    

Opinião em Tópicos: O Papa  -  A Igreja e os católicos  -   O mito e a palavra  -  A Igreja o Estado e nós  (Milton Medran Moreira)

Enfoque :  O significado do Livro Espírita

Opinião do Leitor:

 

Brasil – um país espiritólico

 

No censo do IBGE de 2000, só 1,4% dos brasileiros declararam professar a “religião espírita”. Agora, pesquisa da Datafolha revela que os espíritas somam 3% de nossa população. Um avanço do espiritismo? Talvez não, considerando-se as crenças e práticas dessas pessoas, classificadas por reportagem especial da Folha de São Paulo como “catopíritas” ou “espiritólicas”.

 

A maioria católica e o crescimento evangélico-pentecostal

Às vésperas da última visita do Papa ao Brasil, a Datafolha, um dos mais importantes institutos de pesquisa do país, realizou ampla pesquisa de opinião sobre as religiões no Brasil.

Os resultados confirmaram as tendências das últimas décadas: o catolicismo segue sendo a religião declarada da maioria dos brasileiros, mas em acentuado declínio. Quando da anterior visita de um chefe da Igreja Católica ao país (1996), 74% dos brasileiros se declaravam católicos. Bento XVI chegou ao país, mês passado, encontrando esse percentual reduzido para 64%. O segmento que mais cresce é o dos evangélicos pentecostais que, no mesmo período, saltou de 11 para 17% dos crentes, seguidos dos sem-religião que, na época, eram 5% e agora são 6%.

E os espíritas?

Os espíritas – para os institutos de pesquisa invariavelmente considerados como um segmento religioso – pelos números da Datafolha, já em 96 representavam 3%. Esse percentual se mantém inalterado, embora o índice do censo oficial de 2000 tenha apontado apenas 1,4% da população como espírita.

As diferenças entre uma e outra pesquisa podem ser explicadas por alguns itens aprofundados na sondagem da Datafolha. Ela resolveu pôr em prova as crenças das pessoas pesquisadas, independentemente da religião declarada. Com isso, constatou que grande número de católicos confessam práticas e convicções que contrariam os dogmas da Igreja. Em compensação, muitos espíritas abrigam crenças genuínas do catecismo católico.

Catopíritas e espiritólicos

Desde que, já em seus primeiros séculos, a Igreja entendeu de definir em seus concílios os artigos de fé que comporiam seu credo, a reencarnação foi rejeitada oficialmente pela Cúria Romana. Mas, embora a Igreja a considere uma heresia, a pesquisa Datafolha atesta que 44% dos católicos ouvidos admitem a reencarnação.

Será talvez entre os que se declaram espíritas que se encontrarão as maiores contradições. Nada menos que 64% deles responderam afirmativamente à pergunta de se Maria teria dado à luz Jesus em estado de virgindade. Quase sua totalidade, 95%, também disse crer na ressurreição de Jesus após sua morte na cruz. Significativas parcelas de espíritas admitem outros dogmas exclusivos do catolicismo como a presença corporal de Jesus na hóstia (33%) e a existência do diabo (44%). Há até espíritas que descrêem na vida após a morte (8%) e quase a metade do contingente declaradamente kardecista (48%) afirmaram ter um santo de devoção, como Nossa Senhora Aparecida, Santo Expedito ou Santo Antônio.

Diante desses dados, o caderno especial da Folha de São Paulo que apresentou os resultados da pesquisa (edição de 6.5.07) usou dois neologismos para classificar um par de grupos religiosos típicos do Brasil: os “catopíritas” (católicos que freqüentam centros espíritas e simpatizam com a idéia da reencarnação) e os “espiritólicos” (espíritas que vão à missa e batizam seus filhos na igreja).

 

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Pesquisa Datafolha identificou na maioria dos espíritas brasileiros a crença em dogmas da Igreja Católica: 95% acreditam na ressurreição de Jesus, depois de morto na cruz.

 

Nossa Opinião

Afinal, o que somos?

            Para nós, espíritas, nenhuma restrição existe que católicos freqüentem centros espíritas, tomem ali seus passes ou busquem a ajuda que lhes possamos dar. Os centros espíritas não são, ou não devem ser, “templos” de exclusiva freqüência de quem alimente a “fé espírita” que, de resto, nem existe como tal. O espiritismo é uma filosofia, uma concepção de Deus, de homem e de universo que convida à reflexão apoiada na experiência e na razão. Pessoas de todas as crenças podem se iniciar nessa filosofia e aprofundar o exame de seus postulados, aceitando-os ou não, no todo ou em parte, freqüentando ou não centros espíritas.

            O que preocupa, isto sim, é que pessoas que se dizem espíritas expressem contradições tão grotescas como aquelas reveladas pela pesquisa Datafolha. E se isso acontece o problema não é delas. É do espiritismo, de seu movimento institucionalizado, que se mostra, assim, totalmente despreparado para assumir o perfil cultural e social projetado por seu insigne fundador, há 150 anos.

            Não há sinais de que essa indefinição conceitual seja sanada. E não o será, enquanto o movimento espírita preferir se conceituar como mais uma religião, menosprezando o imenso cabedal de conteúdos científicos e filosóficos de extrema atualidade e racionalidade que são o cerne da proposta kardequiana. Estaríamos bem melhor situados se figurássemos no grupo dos “sem-religião”. Este, a propósito, cresce no Brasil com segurança, já se constituindo em 6% de nossa população. E, veja-se: sem-religião não é sinônimo de ateísmo ou de materialismo, pois a mesma pesquisa que traz esse percentual atesta que 97% dos brasileiros crêem em Deus; 2% têm dúvidas de sua existência; e apenas 1% não acredita na divindade. Deus e espiritualidade não são propriedades das religiões. (A Redação)

 

 

Editorial

Espírito e Modernidade

 

Se o atual papa tivesse assumido uma teologia do Espírito, coisa ausente em sua produção teológica, teria uma leitura menos pessimista da modernidade.

Leonardo Boff – Folha de São Paulo 13.5.07.

 

            Uma das singularidades do espiritismo está na capacidade de acompanhar e, em suas linhas gerais, concordar com as grandes propostas da modernidade. Assim é, por entender que as aspirações humanas, propulsoras das transformações culturais e sociais, são, em última análise, impulsionadas pelo Espírito.

            Reconhecer no Espírito, que para nós é imortal e em contínuo movimento progressista, o legítimo papel de sujeito do progresso e das mudanças de padrões culturais diferencia o espiritismo das religiões predominantes em nossa cultura. Para estas a verdade é uma revelação divina da qual são elas as guardiãs, cabendo-lhes o dever de impô-las a qualquer custo, fiscalizando-lhe o cumprimento, sob o pretexto de propiciar a salvação de seus destinatários. A verdade revelada faz-se, assim, impositiva e, ao mesmo tempo, estanque, insusceptível de dar passo a novas verdades que, por sua vez, irão alterar a cultura e o comportamento humano, diante de novas exigências e necessidades.

            O mandato de que se julgam detentoras as religiões e que lhes fora outorgado, segundo elas, diretamente por Deus, termina por obscurecer e dificultar a compreensão do significado do Espírito como “princípio inteligente do universo” (questão 23 de O Livro dos Espíritos). O trágico dessa postura é que ela desmerece a própria condição humana. Subestima-a, relegando a razão humana a uma instância de inferioridade, indigência e indignidade.

            O progresso da humanidade, no campo do conhecimento e da ética, tem se dado, justamente, a partir do reconhecimento do homem – para nós, espíritas: espírito encarnado – como o verdadeiro agente das transformações sociais e culturais. Kardec e seus interlocutores espirituais analisaram esse processo partindo do conceito de lei natural, que se acha gravada na consciência individual de cada um. Essa visão genuinamente humanista, fundada na realidade concreta do espírito, não desconsidera Deus, nem tampouco a revelação. Aquele é definido como “inteligência suprema e causa primária de todas as coisas” (questão nº 1 de O Livro dos Espíritos) e esta é a síntese dialética resultante da interlocução entre a humanidade encarnada e a humanidade desencarnada. Por essa via de duas mãos, a inteligência humana caminha permanentemente na busca da ampliação do conhecimento e da melhor aplicabilidade da lei natural, emanada da Suprema Inteligência, que é o Grande Legislador do Universo.

            Adotando-se essa visão humanista/espiritualista, torna-se mais fácil reconhecer as misérias e as grandezas humanas. Malgrado aquelas, o balanço sempre será favorável a estas, levando-nos a concluir que, a duras penas, avançamos sempre. E que, pouco a pouco, a consciência coletiva gera propostas e soluções ajustadas a seu tempo. Essas transformações, que se fazem de maneira cada vez mais acelerada, e por isso, também, não imunes a alguns equívocos mais adiante retificáveis, nem sempre são assimiladas por todos. Especialmente aqueles que, no dizer de Boff, fazem uma teologia divorciada do Espírito chocam-se com as mudanças e terminam assumindo posturas conservadoras e retrógradas.

            O espiritismo visto como religião corre também esse risco. Com muita freqüência, conduz seus “crentes” a engrossar as fileiras do atraso. É que, mesmo declarando-nos espíritas, muitas vezes somos conduzidos a depreciar a imensa capacidade criadora e transformadora do Espírito.

                   

Adotando-se essa visão humanista/espiritualista, torna-se mais fácil reconhecer as misérias e as grandezas humanas.

 

 

Opinião em Tópicos

 

Milton R. Medran Moreira

 

O Papa

            Durante o tempo da visita do Papa, tive a nítida impressão de que, de repente, retornáramos ao Estado teológico. Os noticiários não falavam outra coisa. As capas de todos os jornais estampavam sua imagem. Os repórteres de rádio e de televisão disputavam espaço para saber a que hora o Papa tinha levantado, que marca de vinho havia tomado e quem seriam os 40 privilegiados a receber a hóstia diretamente de suas mãos.

            Quem visse a repercussão dada pela imprensa haveria de imaginar que é muito significativa a influência exercida pelo pontífice nos hábitos, crenças e valores dos brasileiros. Mas as pesquisas que se fizeram exatamente no período de sua visita atestam o contrário. Mesmo sendo o maior país católico do mundo, é cada vez mais escassa a influência da maioria das posições teológicas da Igreja nas crenças e nos comportamentos inclusive daqueles que se dizem católicos.

            A Igreja e os católicos

            Em sua visita, Bento XVI repisou alguns temas que têm se constituído em referências de sua pregação. Dizem diretamente com o comportamento e com práticas que o Estado e a sociedades contemporâneos assimilaram em sentido oposto às recomendações da Igreja. Até aí nada demais. Desde o Século 19, Estado e Igreja estão separados e não cabe a um intervir na área de atuação do outro.

            Uma coisa, porém, chama a atenção: é que as posições do Estado laico ou aquelas vigentes nos costumes de hoje são também assumidas por grande número de católicos. Em alguns itens, inclusive, pela maioria deles.

 Na pesquisa Datafolha, 74% dos católicos disseram ser a favor do divórcio; 56% deles defendem a possibilidade de um segundo casamento no religioso, quando a Igreja sustenta a indissolubilidade do matrimônio mesmo no civil. Quanto ao uso da camisinha, condenada veementemente pelo Papa, 94% dos católicos ouvidos se disseram a favor dela. Até em termos de casamento gay, visto pela Igreja como um pecado escabroso, os católicos brasileiros ouvidos, num percentual de 46% mostraram-se favoráveis. O tema do momento, ampliação dos casos de aborto legal, tem o voto favorável de 26% de católicos auscultados pela pesquisa.

O mito e a palavra

            Apesar disso, as multidões estavam lá. É verdade que em número bem menor do que o esperado, mas de qualquer maneira em quantidade significativa. O que, porém, ficou claro é que iam para ver o Papa, não para ouvi-lo. Daí a constatação: a Igreja, seus mandamentos, ritos e sacerdotes, subsistem como mito e não como força formadora de opinião, muito menos de convicções. Há um fosso entre o mito que persiste, incrustado na alma popular, e a palavra que sai da boca desses ícones mitológicos. E essa, na verdade, é a grande angústia da Igreja de hoje.

            Uma reportagem de televisão mostrava o êxtase das pessoas na passagem do Papa. Uma mulher, chorando, gritava frente às câmeras: “Eu vi o Papa! Eu vi o Papa!”. Mas, durante a homilia, alheia ao que ele dizia, comia um cachorro-quente, sentada em baixo de uma árvore. Ela fora lá para vê-lo. Não para ouvi-lo.

A Igreja, o Estado e nós

   Por isso tudo, não vejo porque a sociedade tenha que se preocupar tanto com o que diz a Igreja, quando suas propostas se colocam em evidente oposição àquilo que os costumes vão assimilando como corretos. Claro que ninguém deve negar à Igreja, como instituição privada, o direito de orientar seus fiéis, a partir dos valores que prega e que se fundam na revelação. Se nem mais as ovelhas do rebanho obedecem seu pastor, que direito temos nós de interferir nesses temas que não nos pertencem?

   Disso resulta outra conclusão: o Papa tem o direito, sim, e até a obrigação moral de ratificar suas posições que advêm de uma rígida doutrina revelada. Esta, uma vez aceita, impõe compromissos a seus crentes. Há um pequeno, muito pequeno, número de pessoas que são fiéis a esses compromissos. Nada, porém, que justifique a repercussão dada pela imprensa e por nós outros, não-católicos, às tentativas que segue fazendo a Igreja de interferir nas questões da lei e do Estado. Agindo assim, terminamos por conferir-lhe uma força que ela já não tem.

 

Notícias

 

Ramiro D’Ávila: mais do que sopa, cultura espírita

 

            A Sociedade Espírita Ramiro D’Ávila, tradicional casa situada no Bairro Menino Deus, em Porto Alegre, completou, no último 7 de abril, 75 anos de existência.

            Conhecida como “a casa da sopa”, por manter, desde muitos anos, um serviço assistencial a moradores de rua e indigentes da capital gaúcha, consistente na distribuição de sopa, ali preparada, a S.E.Ramiro D’Ávila está tomando novos rumos.

            Sua nova presidente, a assistente social Marlene Mendes Ribeiro, que assumiu o cargo em maio do ano passado, depois de haver, como diretora doutrinária, introduzido o estudo sistematizado da doutrina espírita, está empenhada em transformar a instituição também em um referencial de estudo e de cultura espírita.

            O marco de transformação da Casa está sendo a comemoração de seus 75 anos. A programação prevê a presença de expositores espíritas, convidados a aprofundarem temas doutrinários para trabalhadores e freqüentadores da Ramiro D’Ávila. Assim, esteve na Casa, dia 23 de abril último, a professora Gládis Pedersen de Oliveira, presidente da Federação Espírita do Rio Grande do Sul, que trouxe importante relato histórico da própria vida da Casa, seus fundadores e seu patrono, a partir de documentos existentes na FERGS, terminando por felicitar seus dirigentes e colaboradores, concitando-os à prática do estudo doutrinário.

            No dia 17 de maio, o orador convidado foi o editor deste jornal e presidente da Confederação Espírita Pan-Americana, advogado e jornalista Milton Medran Moreira, que falou para um auditório de mais de 200 pessoas sobre o tema “Conhecer para Transformar”, enfatizando a importância do conhecimento espírita, como base da transformação individual e social.

            Segundo informou a Sra.Marlene a este jornal, atualmente 320 pessoas estão participando ativamente do programa de estudos doutrinários da Casa, distribuídos em 8 salas de sua tradicional sede, na Av.Getúlio Vargas, em grupos que se reúnem em diferentes dias e horários da semana.

 

CVV comemora aniversário no CCEPA

            O CVV, Centro de Valorização da Vida, Posto de Porto Alegre, vai comemorar 37 anos de atuação na Capital gaúcha com uma semana de atividades que terá a parceria do Centro Cultural Espírita de Porto Alegre.

            A abertura da Semana do CVV acontece domingo, 29 de julho, no Parque Farroupilha, com ações de divulgação das atividades da instituição, no tradicional espaço do Brique da Redenção.

            Durante a semana, de segunda (31/7) a sexta-feira (03/8), diversas palestras serão ministradas tendo por temática central a valorização da vida. A partir de 3ª feira (31/7), todas as atividades terão como local o auditório do Centro Cultural Espírita de Porto Alegre – CCEPA -, na Rua Botafogo, 678, e contarão com palestrantes da instituição aniversariante e também do CCEPA que, dessa forma, dará sua contribuição efetiva ao importante trabalho que o CVV realiza.

            Em nossa próxima edição, divulgaremos toda a programação da Semana do CVV, com dias e horários das palestras no CCEPA.

 

Primeira segunda-feira: dia de conferências no CCEPA

            Uma atividade que tem, sempre e cada vez mais, atraído público ao Centro Cultural Espírita de Porto Alegre: as conferências da primeira segunda-feira de cada mês, às 20h30 min.

            Dia 4 de junho último, o orador foi Rogério Feijó, com o tema “Atualidade Científica de Kardec”, destacando conceitos futuristas de O Livro dos Espíritos e outras obras básicas de Allan Kardec e que só posteriormente foram confirmados pela ciência.

            O expositor de julho, dia 2, será Léo Falkenberg Indrusiak, dirigente espírita com larga atuação no Instituto Espírita 3ª Revelação Divina, de Porto Alegre, e no movimento espírita gaúcho. Ele abordará o tema “Muitas moradas, muitos caminhos: unicidade ou multiplicidade”.

 

           

Enfoque

 

O Significado do Livro Espírita

                                                      A.Jorge Dornelles Budó*       

                                                                         

               O Livro dos Espíritos, de Allan Kardec, assinala, em 1857, a estréia de livros desse gênero na face da Terra. A partir daí, nascem as demais obras da Codificação Espírita que não se circunscrevem a cinco livros, mas reúnem toda a vasta produção de Kardec e dos Espíritos, no Século XIX.

               Mais tarde, aparecem os chamados clássicos da Literatura Espírita, onde autores desencarnados, pela via mediúnica, somando-se a pensadores encarnados de respeitável produção intelectual, trazem à luz as obras subsidiárias de Espiritismo.

               Atualmente, a Literatura catalogada como espírita é bastante volumosa. Com freqüência, editoras e distribuidoras trazem a lume avalanche de livros que atendem diferentes gostos e interesses.

               Em sã consciência, não seria de imaginar-se a existência de “índex” de obras, no meio espírita. Mas, insolitamente, isso acontece, às vezes veladamente, outras de forma mais explícita, o que não contribui para o processo evolutivo.

               Claro que há livros que se mantêm muito aquém das expectativas. Expõem a fragilidade de seus conteúdos. Alguns, inclusive, colidem com a sensatez de Kardec. Mas ninguém pode, valendo-se de títulos ou cargos ocupados nas hostes espíritas, cercear a livre manifestação do pensamento ou o direito de se ler aquilo que se julga conveniente. Cabe, sim, como sugestão, recomendar a leitura preferencial de Kardec que, a propósito, deixou a seguinte recomendação:

               “Os que desejam tudo conhecer de uma ciência devem necessariamente ler tudo o que se ache escrito sobre a matéria, ou pelo menos, o que haja de principal, não se limitando a um único autor.

               Devem mesmo ler o pró e o contra, as críticas como as apologias, inteirar-se dos diferentes sistemas, a fim de poderem julgar por comparação.

               Por esse lado, não preconizamos, nem criticamos obra alguma, visto não querermos, de nenhum modo, influenciar a opinião que dela se possa formar. Trazendo nossa pedra ao edifício, colocamo-nos nas fileiras. Não nos cabe ser juiz e parte e não alimentamos a ridícula pretensão de ser o único distribuidor da luz. Toca ao leitor separar o bom do mau, o verdadeiro do falso” (Allan Kardec, em O Livro dos Médiuns, primeira parte, Do Método, Edição 49, Editora FEB).

               Kardec, com essas observações, nos dá um indicativo de como deve ser a postura espírita ante a Literatura.  Ou seja, atribui a todos e a cada um a capacidade de tirar ilações acerca do que ler, prescindindo de autoridades que lhe digam o que deve ou não, em termos de leitura.

               Quando estamos alicerçados nas obras de Kardec, e além delas, nas subseqüentes, começamos a perceber a real dimensão da Literatura Espírita em nossas vidas. Parecem-nos muito importante essas reflexões no ano do sesquicentenário do Espiritismo. Em 150 anos de Espiritismo, podem-se fazer avaliações das tendências do Movimento Espírita relativamente à produção literária.

               Outra ponderação que se impõe: Pouco importa que a obra tenha sido recebida mediunicamente, por médium ou espírito tidos como famosos, ou tenha sido escrita por autor consagrado nas letras espíritas. Em qualquer circunstância, o olhar crítico é fundamental.

               Portanto, além de ser o livro espírita bom companheiro em diferentes situações, ele é, acima de tudo, fator de crescimento, de informação, de lazer, de cultura, etc. Obviamente, o paradigma a ser adotado é o já referido critério da análise kardequiana.                                                   

 

IMAGEM ALLAN KARDEC

Kardec recomendou que se lesse tudo e que cada um separasse o bom do mau.

 

               * A. Jorge Dornelles Budó reside na cidade de Santa Maria, RS., onde colabora em diversas instituições espíritas, entre as quais a S.E.Estudo e Caridade e a S.E.Irmã Rolica..

 

 

Opinião do Leitor

 

            Renovação Social

            Em razão de extravio de correspondência, só recentemente pude ler Opinião de dezembro, com matéria de capa “É tempo de renovação social”, assinalando: “O recente ingresso do Movimento Espírita no Conselho Nacional de Saúde, através da Confederação Espírita Pan-Americana, é um real indício de que o Espiritismo começa a atingir aquele período entrevisto por Kardec de renovação social”.

            Parabéns ao Dr. Néventon! Parabéns à CEPA. Parabéns aos espíritas. Entre as carências de nosso povo, a saúde é a maior delas. Um raio de esperança surge para a saúde de nossos idosos carentes, de nossas crianças e adolescentes desassistidas e desorientadas. A efetiva participação dos espíritas, com a presença do Dr.Néventon em representação à CEPA no CNS, traz um raio de esperança de uma saúde melhor e de um povo melhor assistido.

            Em que podemos ser úteis? Bastariam nossas preces? Que Deus continue orientando os senhores em tão úteis iniciativas.

            Ody Costa Ferreira – Fragoso, Magé/RJ.

           

 

Justiça divina

Prezado Sr. Diretor:

Reporto-me ao jornal Opinião de maio de 2007, em que se lê “uma justiça nem humana, nem divina", e surpreende-me a citação , "um dano recebido pode ser emendado por parte de quem o faz com um bem equivalente, sem necessidade de sofrer ele mesmo o mal causado".

Essa interpretação da mecânica da Justiça Divina é uma proposta das doutrinas cristãs, incitando a criatura humana a fazer o bem para que o bem realizado suplante, na balança divina, o mal praticado e, assim alcance a salvação. No entanto, aprendi no  Espiritismo (há cerca de 45 anos) que ele não tem essa pregação. Fazer o bem não revela o caráter moral do homem porque ele pode fazer o bem por interesse. A proposta espírita é de transformar o homem em uma criatura de bem - o que é fundamentalmente diferente.

O jornal Opinião e o Abertura não podem, sob qualquer pretexto, fazer concessões a interpretações religiosas, ultrapassadas e que ainda são difundidas pelo espiritismo brasileiro.

Desculpe, Sr. Diretor, a ousadia desta minha manifestação, mas faço-a movido pelo apreço que tenho ao seu trabalho de difusão do pensamento de Allan Kardec.

Atenciosamente,

João José Guedes – bulinha@vetorial.net

 

Nota do Editor: Obrigado por sua contribuição e pelo prestígio ao nosso trabalho. A afirmação reproduzida, que não é do editorialista, mas uma citação do escritor espírita argentino Manuel Porteiro, parece-nos acertada, pois a filosofia espírita admite que o mal praticado causa profundos danos à consciência e que o infrator só readquire o equilíbrio que perdeu ao cometer o mal quando se dispõe ao efetivo exercício do bem. Essa posição é bem diferente da visão segundo a qual a justiça só se faz quando o infrator de ontem sofre mal idêntico àquele por ele cometido. Parece que não estamos pensando diferente, mesmo usando argumentos diversos.