OPINIÃO Ano XI – Nº 114 Novembro
2004
MEDIUNIDADE NA CÂMARA DOS
DEPUTADOS
Nossa Opinião:
Lições do episódio
Enfoque: O poder de um
presidente que o mundo rejeita (José Rodrigues)
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Globo dá
notícia dizendo: “nunca se viu nada parecido”
MEDIUNIDADE NA CÂMARA DOS DEPUTADOS
As homenagens a Allan Kardec,
no mês de seu bicentenário, terminaram com um episódio de larga repercussão na
imprensa: Deputado faz pronunciamento e “incorpora” um espírito.
A
notícia
Comentando que “nunca se viu nada parecido no Congresso
Nacional”, o Jornal da
Globo, edição de 28/10
último, noticiou para telespectadores de todo o Brasil que o Deputado Luiz Bassuma (PT – Bahia), havia presidido a sessão da Câmara
dos Deputados, naquele dia, prestando uma homenagem a Allan Kardec,
pelo bicentenário de seu nascimento. Ao encerrar a sessão, Bassuma
proferiu uma oração. “Naquele momento – segundo
a notícia ilustrada com o som e a imagem da solenidade – baixou a cabeça e mudou o tom de voz e, com os dedos trêmulos da mão
esquerda, batia na mão direita”.
A notícia veiculada pela poderosa TV Globo dá conta de que “kardecistas
presentes acreditam que um espírito falava por meio do deputado. Alguns achavam
que a voz do espírito se parecia com a do médium Chico Xavier”.
O fato foi noticiado e comentado por praticamente todos os
grandes jornais do Brasil. Muitos espíritas afirmaram que a voz e o semblante
do deputado, na possível “incorporação” seriam de Bezerra de Menezes.
Repercussão na Lista da CEPA
A notícia logo repercutiu na Lista da CEPA –
cepa@grupos.com.br
–, trazida que foi àquele grupo de debatedores na Internet por Andréia Vargas
(Paraíba). Agnes Henriques Soares (de Minas Gerais) comentou sobre o assunto,
dizendo ter assistido a toda a sessão pela TV e que “os pronunciamentos dos deputados foram coerentes, bem embasados e
esclarecedores”. Acrescentou que “foi
interessante ver a Doutrina Espírita ser tratada em plena Câmara dos Deputados,
inclusive com manifestação mediúnica”.
Já o debatedor Dourado (São Paulo)
postou mensagem fazendo uma série de indagações: “Na Câmara, pode? Em que melhora os homens com isso? Que intento teria
esse espírito, se é que havia? Houve sensatez? Bom-senso? Consenso? Pelo que
conheço de Chico, ele jamais faria isso. Passa pelos princípios e orientações
gerais do ensinamento espírita? Quem é esse deputado? Em que condições foi eleito? Qual seu nível de ser e saber? É um homem justo?”.
A essas indagações, o debatedor
Marcelo
Para Jacira Jacinto da Silva (São
Paulo), que também se manifestou na lista, a despeito de haver recebido
comentário de que o deputado que protagonizou o acontecimento é espírita,
médium e bem conceituado, “o episódio foi
infeliz”. Diz que “manifestação dessa
natureza não contribui em nada, não tem objetivo algum, apenas servindo de
motivação de chacotas e desprestígio do espiritismo. Para ela, “uma filosofia séria como a nossa merece ser
tratada com a seriedade que lhe dedicou seu fundador”.
Justificando,
acrescentou que “ninguém ouviu dizer que Kardec saiu fazendo exibicionismo com o fenômeno mediúnico,
antes o condenou e advertiu que deveria ser praticado com recolhimento, no
lugar certo, com o grupo certo, com objetivos definidos”. Jacira, que é
Juíza de Direito
LIÇÕES DO EPISÓDIO
Um episódio mediúnico num ambiente como o da Câmara dos
Deputados só pode dar lugar a opiniões as mais diferentes. A começar pela
discussão sobre a autenticidade do fenômeno. Ninguém jamais poderá confirmar
tratar-se de uma verdadeira comunicação mediúnica ou apontar sua autoria. Sempre haverá o
risco da mistificação ou do embuste. À falta de um critério seguro de
avaliação, o resultado será apenas um: os crentes festejarão o episódio, os
descrentes o recusarão ou dele até farão troça.
A despeito disso, está certo quem
afirma se haver criado um bom mote para a imprensa e que não haveria melhor episódio
para abrir algum espaço propiciando se falar em espiritismo. Veja-se: o fato
aconteceu nos últimos dias de outubro. Naquele mês, no Brasil inteiro, fora e
dentro do meio espírita, se multiplicaram homenagens ao bicentenário de
nascimento de Allan Kardec. Mesmo que tenhamos
conseguido alguns espaços na mídia, registrando a efeméride, não consta, por
exemplo, que um veículo poderoso como a TV Globo dele tivesse se ocupado.
Bastou um fato mediúnico para a notícia explodir, ganhando nobres espaços em
todo tipo de veículos da imprensa nacional.
Sob esse aspecto é de se lamentar
não o destaque dado pela imprensa, mas nossa própria incapacidade de
conquistarmos espaços para a divulgação daquilo que de melhor tem o
espiritismo: sua rica filosofia. Todos temos a
convicção plena de que lidamos com idéias profundamente transformadoras. A
filosofia espírita representa um paradigma novo de conhecimento, conduzindo a
um aprimoramento ético-moral. O fenômeno mediúnico, base experimental a partir
da qual defluiu a proposta doutrinária espírita, é secundária, diante da
magnitude de sua filosofia. É instrumento, não fim
Isso tudo nos indica uma crua
realidade: o espiritismo, visto na sua essencialidade,
ainda está longe de ser compreendido e assimilado, mesmo em países onde a religião espírita goza do prestígio e da
popularidade que tem no Brasil. Indica também, por conseguinte, que o trabalho
em prol de sua divulgação, nos meios e com os métodos adequados, continua se
apresentando como gigantesco desafio aos verdadeiros espíritas.
(A
Redação)
A FORÇA DAS COISAS
“O solo treme a cada instante sob os pés,
porque não é ainda o reinado da liberdade e da igualdade sob a égide da fraternidade;
porque o orgulho e o egoísmo continuam presentes, paralisando os esforços dos
homens de bem”.
(Allan Kardec, em
“Liberdade, Igualdade, Fraternidade”, em Obras Póstumas)
Nos primeiros dias deste mês, o
mundo todo teve seus olhos voltados para os Estados Unidos da América do Norte,
atento ao processo da sucessão presidencial que se faria naquele país. Uma
eleição tensa que, aos olhos do mundo, iria definir aspectos envolvendo
interesses de toda a população global. Maior potência política e econômica do
Planeta, as ações internas e externas daquela nação afetam decisivamente o
mundo por inteiro.
Aparentemente, a opção eleitoral que
logo se fez conhecida chancelou um projeto em plena execução: a continuidade da
guerra que, em tese, tem como objetivo combater o terrorismo internacional, mas
que, na prática, vem sendo responsável pela morte de milhares de pessoas
inocentes. Pela lógica vigente que sustenta tal tipo de opção, esse é o preço
que o mundo civilizado tem de pagar para reconquistar a segurança e a paz.
Ressalte-se, inclusive, que o mesmo raciocínio é oferecido como justificativa das milhares de baixas de soldados estadunidenses e de
países aliados, assim como seqüestros, execuções e assassinatos que vitimam
civis desses países, nas zonas conflagradas. Há que cortar a própria carne para
se obter o fim colimado, raciocinam.
É possível que tenhamos
superestimado o episódio das eleições americanas. Ninguém pode sustentar que,
fosse outra a opção eleitoral, as atividades bélicas cessariam e o mundo viesse
a ganhar a paz. Poderosos interesses movimentam as engrenagens da guerra, e a
paz mundial talvez não seja ainda um projeto das potências que dominam o
Planeta.
As motivações da guerra, mesmo que
disfarçadas por argumentos nobres e preservadores da paz, estão sempre calcadas
em interesses ligados à dominação e ao poder. Suas raízes mais profundas
nutrem-se dos primitivos sentimentos do orgulho e do egoísmo, apontados pelos
espíritos superiores como principais matrizes do atraso moral da humanidade.
Há de ser muito difícil para quem
conquista fatias tão importantes do poder político e econômico trabalhar
efetivamente pela paz, quando sentimentos inferiores podem ter sido a motivação
maior dos próprios grupos que lhes propiciaram ascender ao poder. Mesmo assim,
é gratificante ver que, fora dos círculos do poder ainda contaminados pelo
vício e pela corrupção, viceja e se fortifica, no mundo inteiro, uma forte
consciência pacifista. É justamente no seio da sociedade civil não atrelada ao
poder que cresce a convicção de que sem os nobres sentimentos do perdão, da
tolerância e da fraternidade incondicional entre raças e povos, a humanidade
não atingirá, jamais, patamares aceitáveis de bem-estar social e político.
Essa periférica, mas gigantesca onda
pacifista, que já não mais tolera a violência e rejeita o impulso da vingança e
da retaliação, pouco a pouco, há de chegar também nos círculos do poder. Seguir
alimentando essa política de responder sempre com violência a violência
recebida necessariamente produzirá experiências amargas que convencerão de sua
inconveniência. Pouco a pouco, a humanidade aprenderá a lição. Pela força das
coisas, como diria Kardec.
As motivações da guerra, mesmo que disfarçadas
por argumentos nobres e preservadores da paz, estão sempre calcadas em
interesses ligados à dominação e ao poder. |
IMORTALIDADE –
TEMA DA CONFERÊNCIA DE NOVEMBRO
O Centro Cultural Espírita de Porto
Alegre, que nas primeiras segundas-feiras do mês, oferece uma conferência pública,
dedicou o dia 1º de novembro deste ano para o tema da imortalidade do espírito.
A conferência foi do diretor de comunicação social da entidade e presidente da
CEPA,
Carlos
Grossini, o orador de dezembro
No próximo dia 3 de dezembro, seguindo a programação mensal
de conferências, o expositor será Carlos Grossini,
que abordará “Princípios Fundamentais do Espiritismo”.
MAIS DOIS GRUPOS CONCLUEM CIESP
Nos dias 10 e 11 de novembro,
encerraram-se mais dois Cursos de Iniciação ao Espiritismo
(CIESP) promovidos pelo CCEPA. Os dois eventos se desenvolveram
paralelamente, às 4as. feiras, à tarde e 5as. feiras à noite, coordenados por
Mediunidade em alta
A mediunidade está em alta na mídia.
Na recente 50ª Feira do Livro de Porto Alegre, a imprensa deu bastante destaque
à presença de Marcel Souto Maior, autor do best-seller “As Vidas de Chico
Xavier”, uma biografia do famoso médium mineiro, desencarnado em 2002, que já
vendeu 120 mil cópias. No embalo do sucesso, Souto Maior acaba de lançar “Por
Trás do Véu de Ísis – Uma investigação sobre a comunicação entre vivos e
mortos”, que já chegou ao evento cultural da capital gaúcha com a invejável
marca de 20 mil exemplares vendidos e logo se colocou entre os livros mais comercializados da
feira.
O escritor, em entrevista ao jornal
Zero Hora, declarou-se “menos cético” do que quando iniciou suas pesquisas.
Informa que tem encontrado muita fraude, mas também muitas surpresas, com fatos
impressionantes e inexplicáveis.
Isenção investigativa
Tenho visto muitos espíritas se preocuparem com essa questão
de jornalistas ou investigadores dos fenômenos mediúnicos demorarem a conceder
a eles a mesma interpretação que nós espíritas lhes damos.Ou
ficarem sempre “em cima do muro”.
Acho que todo o pesquisador sério
tem mesmo de partir de uma atitude de ceticismo. Até mesmo de oposição àquilo
que, normalmente, classificam como “sobrenatural”.
Aqueles nomes habitualmente citados por nós, de ilustres personalidades que
confirmaram as teses espíritas, como Crookes, Aksakof, Bozzano, Zölner e
outros, eram céticos. A maioria deles entrou nessa história com o objetivo
claro de “desmascarar” os espíritas. Só com o tempo, terminaram por admitir a
questão da intervenção dos espíritos, mas nunca se declararam espíritas.
Exatamente isso lhes deu mais credibilidade.
Menos cético
Souto Maior, na entrevista, informou
que lança este segundo livro menos cético que antes. Refere um episódio que o
teria levado a começar a mudar de atitude. Teria sido uma mensagem de uma tia
sua, recebida por um médium em Brasília. Como não conhecera essa tia, se
impressionou com alguns dados da mensagem, confirmando situações reais.
Quanto a mim, não pude deixar de
ficar temendo que, com aquele e outros episódios, o autor, que está vendendo
tanto exatamente por tratar do fenômeno espírita sem ser espírita, amanhã ou
depois venha com outro livro, agora confessando-se
inteiramente crente no espiritismo. Talvez com isso perdesse a credibilidade
que está conquistando.
A pesquisa espírita
O tema conduz a refletir sobre uma
de nossas carências, sempre reconhecida: a da escassez da pesquisa científica
no meio espírita. O que é explicável. A trajetória que, via
de regra, percorremos até nos tornarmos espíritas passa, em uma de suas
fases, pelo convencimento da autenticidade do fenômeno mediúnico. São
experiências pessoais que nos conduzem a novas atitudes perante a vida, sem
mais necessidade de questionarmos os fundamentos da imortalidade e da
comunicabilidade, questões, então, já resolvidas em nós. Pois, isso deveria nos estimular a desenvolver os ricos
aspectos filosóficos do espiritismo. Apresentá-lo dentro de um contexto
filosófico será sempre um estímulo à pesquisa científica de parte de quem tem
competência para realizá-la. Enquanto “vendermos” o espiritismo como uma crença
ou nos comportarmos como crentes, dificilmente o desvincularão dos dogmas
religiosos com cuja investigação ninguém mais está preocupado.
O poder de um presidente que
o mundo rejeita
José Rodrigues *
A reeleição de George W. Bush para a
presidência dos Estados Unidos, reconhecida como a nação mais poderosa do
planeta, ocorre num momento em que a busca das
liberdades democráticas se acentua. Nelas está a liberdade de expressão,
curiosamente desbravada pelo mesmo país que hoje é alvo crítico da grande
maioria dos países. Em resumo, a continuação de Bush, após a desastrada invasão
do Iraque e o pouco caso
Em prol da liberdade de expressão, várias
publicações, exprimindo a opinião da maioria de seus eleitores, manchetaram no dia cinco de novembro, títulos do tipo: “O
império piora”, pelo francês Libération; o Le Monde, simplesmente disse: “Por quê?”. Segundo o Portal
da Comunicação na Internet, um dos mais ácidos foi o inglês Daily
Mirror: “Como 59.054.087 pessoas podem ser tão
idiotas?”. Na Alemanha, as opiniões não foram menos duras e no Brasil, um
artigo de Quentin Peel,
colunista do “Financial Times”, publicado no jornal
“Valor” de 05/11, disse: “Condenados a mais quatro anos”.
Peel cita
um trecho de pronunciamento do ex-ministro de Relações Exteriores da Índia, Jaswan Singh, no qual observa que
“É muito triste. Eles queriam uma coalizão internacional contra o Iraque e
terminaram praticamente provocando formação de uma aliança internacional
contra os EUA”.
Essas digressões vêm juntar-se a uma
discussão que parece acadêmica, mas guarda bons fundamentos práticos. O
cientista político Samuel Huntington, norte-americano
e professor na Universidade Harvard, publicou um polêmico livro “O Choque das
Civilizações”, em 1996, no qual sinalizou que se patenteavam conflitos entre Ocidente cristão e o
islã. A tese foi muito combatida por outros intelectuais, como Francis Fukuyama, e depois do 11 de
setembro, por Antony Guiddens, sociólogo e diretor da
London School of Economics, um dos pais da
chamada terceira via, alternativa diferente das sociais-democracias e do
liberalismo. Guiddens, em resumo, diz que os
conflitos são entre o cosmopolitismo e o fundamentalismo. O cosmopolitismo pode
ser identificado na globalização, sob todas as formas, a mais aguda, a da
velocidade da informação.
Os fundamentalistas, especialmente
das facções islamitas, opõem-se ao Ocidente, cuja encarnação não é apenas de costumes,
mas de busca de poder e, no caso mais específico, das fontes de petróleo.
Grandes grupos norte-americanos têm interesse direto nessa indústria, inclusive
a família Bush. Um estudo da revista “The Economist”, em 2000, (Suplemento Mais, da Folha de S. Paulo-07/03/04), identificou 31 grandes
conflitos em andamento no mundo, dois terços deles envolviam muçulmanos
combatendo muçulmanos, ou muçulmanos combatendo não-muçulmanos. O fato é que a
visão de Deus e do mundo permeia esses conflitos, com o requinte de seguidores
colocarem fim à vida terrena como passaporte para o paraíso.
Bush também pode ser qualificado
como um fundamentalista ocidental, ao dividir o “bem” e o “mal” para justificar
as guerras preventivas, potencialmente contra o terrorismo, mesmo com o fiasco
de não ter encontrado armas nucleares no Iraque, nem prendido Osama Bin Laden,
que se auto-proclamou autor intelectual do 11 de
setembro.
Na verdade, a outra parte do mundo
está farta desse jogo de interesses econômicos e injustiças. Os norte-americanos
reelegeram Bush porque, no frigir das discussões com Kerry,
garantiu que seria mais “duro” com os terroristas que seu oponente. Ocorre que,
a nosso ver, George W. Bush, no caso, é parte do problema e não da solução. As
votações “fechadas” a favor de Israel, na maioria das causas com seus vizinhos,
têm muito a ver com as reações de facções radicais, ligadas ou não ao
fundamentalismo islâmico.
Pode haver um fanatismo sincero,
ingênuo, que muda com o esclarecimento, mas há o cego e interesseiro, falso,
hipócrita, por defender interesses particulares e buscar mais poder.
A tese espírita, que tem sua luta
própria para se escoimar de crendices, de poderes temporais e até do manto de
“anjos”, vai ao
fundo das questões em busca da lei natural. Talvez
por ser tão simples, seja de difícil aceitação. Por ser anárquica e libertária,
para que o homem ressurja como foco principal das ações humanas e espirituais,
caminha a passos lentos, com tanto conteúdo para servir como complemento da
paz.
Essa simplicidade está numa resposta
dada pelos espíritos a Allan Kardec: “Qual a causa da
instabilidade das leis humanas?” – “Nos tempos de barbárie são os mais fortes
que fazem as leis, e as fazem
Esse é o caminho.
* José
Rodrigues é jornalista e economista. Um dos coordenadores do site
Pense-Pensamento Social Espírita. www.viasantos.com/pense