Artigo de Charles Odevan Xavier - Fevereiro de 2005

A Figura do Pai

Este estudo pretende fazer justiça a um elemento importante da teogonia bíblica: o pai, o Criador, Jeová, Elohim. Geralmente esquecida ou desconhecida, a Cristandade brasileira muitas vezes lembra apenas da figura do filho – ou, no caso da Cristandade Católica, da figura da mãe, a Virgem Maria.

Este fenômeno se dá por diversas razões. A primeira delas seria a da quantidade de vezes em que a figura do filho foi pintada e retratada por inúmeros artistas de diversas épocas e latitudes, enquanto a figura do pai aparece escassamente em Leonardo da Vinci, Michelangelo e outros pintores renascentistas menos conhecidos. Outra razão seria o medo, compartilhado por Moisés e por artistas muçulmanos, de representar plasticamente o Criador ou de encarar o seu semblante, supostamente terrível.

A figura do Criador é recorrente em diversas culturas e quase sempre é associada a um homem muito idoso, viril e provedor. Assim iremos vê-lo no Odin do povo viking, no Olorum do povo iorubano (atual Nigéria), no Urano do povo grego, entre outros.

Jeová aparece no Antigo Testamento inúmeras vezes com seu braço pesado, sua mão grande e as poucas vezes em que o rosto é relatado: sempre duro e zangado. Foi uma forma textual que os narradores encontraram para expressar o poder, a força, a providência mas, também a ira do Criador. Entretanto, as pessoas esquecem a preferência do Deus de Moisés pelos pequenos. A temida e pouca refletida Lei de Talião (Olho por olho, dente por dente) foi um avanço para a época. Lá estão assegurados os direitos da viúva, do órfão e do escravo; todos ditados pelo Criador a Moisés no Deuteronômio e no Levítico, segundo a Bíblia.

João Silvério Trevisan em A Crise do Masculino (Ed.Record) talvez forneça luzes para explicar a indiferença da Cristandade com a figura do pai. Lá o jornalista diz que o homem tem uma difícil relação com o pai, porque o pai é simultaneamente o “pirão” e o “cinturão”.

Na terrível economia de afetos, o carinho ficou com a mãe e com o pai ficou o “carão”. Mas tenho visto mudanças neste sentido. É cada vez maior a presença de pais levando os filhos homens para parques, praças nas horas de folga. Tem havido um resgate da convivência familiar, a despeito da concorrência com a má programação de TV, do carro de som alto e da bebedeira de final de semana. Assim como tenho visto maridos repartindo os afazeres domésticos com a esposa devido aos baixos salários para se pagar uma empregada doméstica. Isso pode representar uma mudança radical e salutar em longo prazo do padrão de masculinidade brasileira. Um novo homem está sendo gerado nos lares brasileiros: mais afetuoso, solidário e amigo.