Artigo de Charles Odevan Xavier - Março de 2001

Allan Kardec e a Astrologia

Uma abordagem Estruturalista

Este artigo surgiu a partir de uma estranha conversa com um colega de faculdade, esotérico e defensor da astrologia, em que comentamos a objeção de Kardec à Astrologia presente no livro A Gênese – Os Milagres e as predições segundo o espiritismo (Araras,SP.IDE.1992).

Como se sabe, Kardec condenou a Astrologia por sua invalidade científica. Vejamos o que Kardec comentou a respeito no livro citado, no Cap. V Sistemas do Mundo Antigo e Moderno, pág. 86: "Os grupos a que se deu o nome de constelações não são senão conjuntos aparentes causados pela distância; suas figuras são efeitos de perspectiva, como se formam para a visão daquele que está colocado em um ponto fixo de luzes dispersas em uma vasta planície, ou as árvores de uma floresta; mas esses conjuntos não existem em realidade; se se pudesse se transportar para a região de uma dessas constelações, à medida que se aproximasse, a forma desapareceria e novos grupos se desenhariam à visão. Desde que esses grupos não existem senão em aparência, o significado que uma crença vulgar supersticiosa lhe atribui é ilusório, e a sua influência não poderia existir senão na imaginação". Ou seja, os místicos viam leões, escorpiões e peixes onde a rigor só há caos.

O colega retrucou dizendo que se alguém pega um texto e o reduz aos fonemas, também não vai encontrar sentido, só sons soltos e desconexos. O raciocínio do colega, eminentemente lingüístico, remeteu-me ao Estruturalismo e é através desta escola de pensamento que pretendo buscar uma resposta à questão: o que faz as pessoas darem crédito a Astrologia?

Surgido em 1916 com o lingüista Ferdinand de Saussure, o Estruturalismo tinha uma interesse muito específico: atingir as leis gerais de funcionamento de uma língua. Com o tempo, dado o caráter particular e preciso do método, o Estruralismo foi adotado em outros ramos do conhecimento: Antropologia (Lévi-Strauss), Psicanálise (Lacan), Filosofia (Michel Foucault), Semiologia (Roland Barthes), História (Georges Dumézil), Marxismo (Althusser) e outros.

O que permeia as várias aplicações do Estruturalismo são conceitos como: <<estrutura>>, <<sistema>>, <<sincronia>>. Partindo da Lingüística, o método estrutural trabalha todo e qualquer material científico como um modelo lingüístico. Assim, o cientista busca uma gramática da "Psique", uma gramática da Cultura, uma gramática da Moda e daí por diante.

A partir do conceito de <<sistema>>, o Estruturalismo não tem interesse em saber a veracidade do objeto. Isso é uma preocupação da Moral e da Lógica. O método estrutural não está interessado no "porquê", mas no "como", no funcionamento de um dado sistema. Saussure ilustra com o tabuleiro de xadrez: não interessa saber se as peças são de madeira ou de marfim, se são de origem persa ou chinesa. O que importa é que para jogar é preciso ter todas as peças e saber as regras.

A partir do raciocínio estrutural, a Astrologia seria uma "língua", que possui uma "morfologia" (signo solar, ascendente, por exemplo), uma "sintaxe" ( lua em Áries, por exemplo) e um "texto" ( o mapa-astral, por exemplo).

Dessa forma, através do Estruturalismo começamos a entender que a Astrologia, apesar de se pautar por mapas astronômicos da Idade Média (e, por isso, obsoletos) e da consistente objeção de Kardec, acaba sendo vista como "ciência" por parte do senso comum, pelo grau de complexidade de seu sistema e estruturas. Se formos insistir na hipótese da falta de comprovação científica, da falta de respaldo das imagens astrais no mundo sensível ("physis"), teríamos que aceitar a existência de ramos do conhecimento que também não têm referente no mundo real, como a Matemática, por exemplo, e que nem por isso deixa de ser considerado como ciência ( ou você já conversou com um logaritmo na padaria da esquina?).

Não pensem que defendo a Astrologia, pelo contrário, considero-a um meio reducionista de encarar a personalidade humana, mas a partir do problema da Astrologia e da contribuição do Estruturalismo, somos levados a pensar na autonomia dos sistemas criados pelo homem (Da álgebra a bobagens como o Feng Shui).

Graduação em Letras-UFC e neo-espírita

charlesodevan@bol.com.br