Artigo de Luiz Marcelo Prestes - Agosto de 2004

Aborto: E agora pode ?

[ Livro dos Espíritos, questão 347: Que utilidade pode haver para um espírito a sua encarnação num corpo que morre poucos dias após o nascimento?

“O ser não tem alta consciência de sua existência: a importância da morte é quase nula: como já o dissemos, é muitas vezes uma prova para os pais.” ]

A polêmica em torno do aborto volta às manchetes da mídia. O ministro  do STFSupremo Tribunal FederalMarco Aurélio de Mello, liberou para todo o Brasil, no início de julho, a chamada ‘interrupção de gravidez’ quando houver laudo atestando anencefalia,  isto é, ausência de cérebro no feto. A decisão do ministro é provisória – terá de ser julgada pelos outros 11 membros do STF – mas está causando controvérsia nos meios jurídicos e religiosos, por tratar o aborto como uma simples interrupção de gravidez.

O advogado Luís Carlos Martins Alves, da CNBBConfederação Nacional dos Bispos do Brasil – disse que “Um feto, ainda que anencéfalo, não perde dignidade nem o direito de nascer.” A OAB – Ordem dos Advogados do Brasil – informou em nota à imprensa que irá compor uma comissão de biodireito para estudar a decisão e que divulga posição oficial até o final de 2004.

E a Doutrina Espírita, como se posicionaria a respeito?

Em O Livro dos Espíritos, questão 359, a espiritualidade diz ser “...preferível que se sacrifique o ser que ainda não existe a sacrificar-se o que já existe”; entretanto, a questão versa sobre uma ‘suposição de que a vida da mãe corra perigo pela proximidade do parto’. Dessa forma, vale lembrar que o contexto em que o ministro consentiu o aborto está ligado a problema ou defeito com o feto e não com a mãe. Pela ótica científica a situação seria ainda mais comprometida: em praticamente todos os casos de anencefalia,  o feto morre horas ou dias após o parto; isto quando não ocorre aborto espontâneo durante a gravidez. Após avaliar essas análises, fica a pergunta: estamos diante de aborto consentido ou não?

Caberia a observação ao leitor da pergunta inicial do texto, onde os espíritos apontam que, inúmeras vezes, a prova de um natimorto estaria  voltada para os pais; logo, se os pais, em não havendo risco mortal e comprovado para a gestante, optarem pela interrupção, estarão caindo no crime do aborto.

A questão 748 de O Livro dos Espíritos que trata do ‘Assassínio’ esclarece que a morte causada por legítima defesa não tira a responsabilidade do agredido de fazer todo o possível para preservar a própria vida e também a do agressor. Isto posto, dentro dos conceitos ensinados pela espiritualidade, como devemos proceder perante uma situação desse tipo? Ante a precária visão que temos das complexas tramas do plano espiritual, deveríamos seguir os ensinamentos evangélicos do amor ao próximo e a nós mesmos, orando e vigiando para que Deus, por meio de seus emissários espirituais, possa atuar da maneira que melhor ofereça oportunidades de resgate e evolução para todos, pais e filhos pródigos, ainda desviados da seara bendita.

Se formos olhar a geografia do aborto no planeta, o mundo atual estaria dividido em três partes iguais: uma parte que autoriza sem restrições (34 paises), outra parte que só autoriza em certos casos (37 paises) e uma terceira parte que não autoriza em nenhuma situação (33 paises). Na América Latina só Cuba autoriza o aborto. O Brasil, com a infeliz medida ministerial, é o segundo país latino-americano a autorizar abortos por anencefalia. Para alívio dos mais sensíveis ao sofrimento alheio, a Sociedade Médica Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia informa que, caso não seja feito o aborto, se o bebê vier a nascer será incapaz de sentir dor, não ouvirá e nem enxergará, estando em total estado de inconsciência. Interessante, não acha? ‘Coincidentemente’ essa situação nos faz lembrar as passagens dos livros de Manoel Philomeno de Miranda e Ivonne do Amaral Pereira, onde ocorre a bendita oportunidade para que espíritos de suicidas refaçam a estruturas de seus corpos espirituais, renascendo em corpos disformes ou com poucas horas ou dias de vida, apenas para reconstituição do material orgânico.

Contudo, pelo que foi exposto, reflitamos à bondade de Deus que faz ‘o sol nascer sobre bons e maus’.

Pra finalizar, a estatística de anencefalia no Brasil diz que existem apenas 2 casos para cada mil nascimentos, e que esses números vêm caindo ainda mais com a adição do ácido fólico – presente em farinhas, aveias e no espinafre – na dieta brasileira.

Mais uma vez a necessária caridade se apresenta em três oportunidades: a da mãe para com seu filho que poderá não vingar, a dos pais conscientes dos deveres cristãos para com os desígnios da providência e a última, da parte de todos nós, para com os legisladores do mundo atual, letrados perante a lei dos homens, mas ainda semi-analfabetos ante a lei de Deus.

{Luiz Marcelo Prestes (lm_ade@yahoo.com.br), jornalista paulistano, é Coordenador de Marketing da ADE-SP (www.sp-ade.org.br) e graduando em Filosofia pela Universidade São Judas Tadeu.}