Jon Aizpúrua – Um Espírita de Nosso Tempo
por Milton Medran Moreira

Comentar sobre a vida e a obra de um contemporâneo, ainda enquanto entre nós e em plena e  atividade, como é o caso de JON AIZPURUA, oferece vantagens e desvantagens. A vantagem evidente é a de podermos contar com a observação direta e o testemunho ocular das pessoas que convivem com a personalidade descrita. A desvantagem é a de não dispormos ainda de uma perspectiva histórica, sempre importante à biografia definitiva de alguém. Uma biografia e uma obra constróem-se ao longo de toda uma vida. São tecidas, fio a fio, pelo biografado, a partir dos movimentos que a vida lhe oferece, das opções que tem de fazer e das iniciativas que tem de tomar, cujos acertos ou desacertos, conveniência ou inconveniência, serão, bem depois, ajuizados pela História.

Por isso, não me proponho, aqui, a fazer uma biografia de Jon Aizpurua que, aliás, não caberia neste espaço exíguo.
Desejo apenas interpretar as razões mais evidentes daqueles, entre os quais me incluo, que decidiram elegê-lo para compor a lista dos 20 espíritas mais importantes do século. A tendência, no meio espírita, é, via de regra, a de somente darmos verdadeira importância àqueles que já passaram por aqui, relegando ao tempo o reconhecimento dessa condição. Compreende-se: personalidades realmente fortes e decisivas em quaisquer setores da vida precisam, a cada passo de suas existências, assumir posições claras, sem tergiversações, quebrando tabus que os tornam vulneráveis ao julgamento alheio. Mas, mesmo que  a maioria não os compreenda, há os que  vislumbram em suas ações um direcionamento definitivo e consagrador. Jon Aizpurua, no meio espírita, parece estar hoje merecendo esse reconhecimento apenas parcial, exatamente por algumas posições corajosas que tem tomado e cuja a compreensão definitiva e unânime só poderá vir com o tempo, superados obstáculos que, para uns, podem estar parecendo irremovíveis, mas que, sob o ângulo a ser aberto pela história, não serão mais que pedras de tropeço a perderem paulatinamente sua importância no contexto maior em que se inserem.

No meio espírita tem sido exatamente assim. Só o tempo poderá atrair a unanimidade acerca da importância do trabalho de algumas personalidades em nosso meio. Jon Aizpurua é um desses homens, como o foram J.Herculano Pires e Deolindo Amorim, para citar dois nomes apenas.

Do Marxismo ao Espiritismo

Esse prólogo pode dar a idéia de que Aizpurua seja homem dado à polêmica. Não o é. Espírito conciliador, afável e sereno, demonstra que a firmeza de suas posições é o fruto maduro de uma vivência que começou, exatamente como no caso de Kardec, pela dúvida. Mais do que isso: pela contestação, pela prática inteligente da dialética que supera etapas antes conquistadas mas não cristalizadas e busca idéias novas, renovadoras.

De marxista que era na primeira juventude, quando, com 15 anos (1964), deu-se sua aproximação com o Espiritismo, veio a tornar-se, em muito poucos anos, e ainda bastante jovem, um dos expoentes mais significativos do mundo cultural espírita e uma das principais lideranças de seu movimento.

O marco inicial dessa caminhada tem na figura de David Grosvater o mais importante personagem. Foi assistindo às conferências desse ilustre pensador de origem judaica, polonês de nascimento e radicado na Venezuela, pátria de Aizpurua, que o jovem e entusiasta marxista da cidade de Valencia (onde nascera a 14 de novembro de 1949) passou a conhecer os fundamentos científicos e filosóficos do Espiritismo. Contrapôs-lhe, num primeiro momento, toda a argumentação materialista que sorvera nas obras de Marx e Engels. Mas, logo descobriu nas generosas concepções do ESPÍRITO, explicações que lhe pareceram bem mais consistentes para sustentar uma visão de Universo e de Homem e uma idéia de  Deus muito além das acanhadas concepções religiosas que sempre rejeitara. Um livro de Grosvater, Espiritismo Laico,  exerceu especial influência nessa etapa inicial de aproximação de Jon Aizpurua com o Espiritismo. E a leitura, o aprofundamento e a reflexão demorada em torno de O Livro dos Espíritos fê-lo descobrir em Allan Kardec o pensador que mais influência desempenharia em toda a sua vida e na obra fecunda que produziria.

Logo, logo, estava dedicado de corpo e alma às atividades da instituição dirigida por Grosvater na cidade de Maracay, o Centro de Investigações Metapsíquicas e Afins – CIMA. Nessa instituição, trata, imediatamente, de organizar e presidir um grupo de jovens que, com a denominação de Movimento Juvenil do Centro de Investigações Metapsíquicas e Afins – Maracay, chegaria, mais tarde  a integrar a Federação Espírita Juvenil da Venezuela. Começava aí também uma longa produção cultural espírita, com a edição de uma revista por ele fundada, sob o título de Evolucion, cujo primeiro número apareceu em abril de 1969, primeiramente como órgão do Movimento Juvenil e, depois de dois anos e meio, como órgão oficial do CIMA. Por 23 anos, Jon Aizpurua dirigiu essa revista, ou seja, até 1992, quando suas intensas atividades de escritor, conferencista e líder de um importante movimento espírita pan-americano, o impediriam de continuar esse projeto que sustentou praticamente só.

O Líder Espírita

Com a desencarnação, em 1974, de David Grossvater, Aizpurua, com apenas 25 anos, é conduzido à presidência do movimento fundado por seu líder e inspirador. À frente do CIMA, logo propõe e obtém a alteração da denominação da instituição e seu direcionamento claro ao Espiritismo, nos seus aspectos científicos, filosóficos e morais. A instituição altera sua denominação para Movimento de Cultura Espírita CIMA que, em 1984, passa a integrar a Confederação Espírita Pan-Americana – C.E.P.A., instituição que fora fundada em 1946 em Buenos Aires e que, com nítida feição espírita e kardecista, tinha por objetivo congregar todo o movimento espírita pan-americano.

Em outubro de 1993, no XVI Congresso Espírita Pan-Americano, em São João de Porto Rico, Jon Aizpurua foi eleito presidente da C.E.P.A.. cargo para o qual veio a ser reeleito em outubro de 1996, no XVII Congresso, na cidade de Buenos Aires.

É a partir de seu primeiro mandato como presidente da C.E.P.A. que Jon Aizpurua promove, juntamente com seu Conselho Executivo, uma ampla ação direcionada ao movimento espírita brasileiro com o qual a Confederação Espírita Pan-Americana mantinha um relacionamento bastante superficial, por conta de algumas diferenças interpretativas que se haviam tornado claras ao curso do tempo: aqui, um movimento espírita quase que monoliticamente religioso e evangélico, liderado pela FEB, enquanto que a tradição da C.E.P.A. sempre fora a de um Espiritismo laico, calcado numa visão humanista, científica, filosófica e moral. Buscando plantar institucionalmente a C.E.P.A. no Brasil, Aizpurua subscreve, em junho de 1994, uma circular ao Movimento Espírita Brasileiro, explicitando as posições históricas de Confederação por ele presidida e estendendo um convite fraternal para que, em caráter pessoal, ou institucional, os espíritas e as organizações que comungassem com aqueles pontos de vista aderissem formalmente à C.E.P.A., participando, a partir daí, ativamente, desse movimento de âmbito continental.

A partir desse episódio, Jon Aizpurua, pessoalmente, tem sido uma presença constante no movimento espírita brasileiro, liderando não apenas as diversas instituições que aderem à C.E.P.A., mas participando de eventos os mais diversos, como conferências, seminários, simpósios e preparando a realização do XVIII Congresso Espírita Pan-Americano, em outubro deste ano, em Porto Alegre. Essa presença, que se renova anualmente abrangendo vários Estados brasileiros e incluindo Universidades, Centros Espíritas e de cultura, em geral, amplia no Brasil um movimento que, localizada, mas corajosamente, ressurgira já há uns 20 anos, notadamente em São Paulo e Rio Grande do Sul, opondo-se à classificação do Espiritismo como simplesmente mais uma religião cristã, para mostrá-lo, sim, como uma proposta cultural dinâmica, libertadora, humanista, com fortes fundamentos filosóficos, baseados nos valores do Espírito e capaz de conduzir a uma efetiva transformação individual e social.

Humanista e Intelectual

Professor na Universidade Central da Venezuela desde 1981; economista diplomado em 1984; psicólogo licenciado em 1992, JON AIZPURUA faz brilhante carreira como intelectual, conferencista e escritor, membro que é da Associação Venezuela de Escritores.

Publicou, entre outros, os seguintes livros "Historia de la Parapsicologia", "Fundamentos del Espiritismo". "El Espiritismo y la Creación Poética" e "El Pensamiento Vivo de Porteiro". "O Pensamento Vivo de Porteiro" já tem edição em português, iniciativa do C.E.José Barroso, de São Paulo. "História da Parapsicologia" , uma alentada obra versando sobre os fenômenos paranormais na história, já tem seu texto traduzido para o português, aguardando publicação. E "Fundamentos do Espiritismo" é, neste momento, traduzido pela professora paulista Leile Cacacci, obra que está destinada a ser uma das mais abrangentes e metódicas acerca do Espiritismo em seus mais amplos aspectos.

Conferencista dos mais brilhantes e cativantes, Aizpurua  sempre que se apresenta publicamente, o faz com extrema habilidade e sabedoria, mostrando o Espiritismo como importante vertente do pensamento contemporâneo, aliado aos mais destacados movimentos da espiritualidade, do humanismo, da ciência e da filosofia e da moral.

JON AIZPURUA resgata, na atualidade, a nobre linhagem dos mais ilustres cultores do pensamento e de renovação do movimento espírita, merecendo, sem dúvida, figurar entre os 20 mais importantes do século que se escoa.