Julho de 2002

Capa - Editorial e Notícias

EDITORIAL - ECUMENISMO, FRATERNIDADES E OUTROS EQUÍVOCOS.

Uma Doutrina se caracteriza pelo conjunto de idéias, princípios e valores que constituem, afinal, sua visão de mundo e da pessoa humana.

Ao elaborar a doutrina espírita, Allan Kardec, em perfeita consonância com um grupo e Espíritos Superiores, estabeleceu, logicamente, um conjunto de idéias, princípios e valores que constituem a visão de homem e de mundo do Espiritismo.

Manter a identidade do Espiritismo é, pois, apoiar-se totalmente nesses princípios, mas, como conduziu Kardec, estar preparado para atualizar-se, reler discursos e as idéias de modo à, embora fiel à sua estrutura, projetar-se para aceitar as evoluções científicas, filosóficas e culturais. Caso contrário deixaria de ter o sentido que seu fundador estabeleceu e tornar-se-á um culto, uma religião dogmática, parada no tempo e supostamente dona da verdade absoluta.

Se estas premissas forem seguidas, estabelecendo um nível de convicção convincente, as relações com religiões, cultos e filosofias seguirão o ritmo normal da cultura, uma vez que a doutrina não se constituiu para isolar-se num gueto de supostos detentores da verdade.

Essas relações serão proveitosas se cuidar de não misturar sentimentos de fraternidade, de simpatia e aceitação das diferenças, com adesão ainda que sub-reptícia a doutrinas e comportamentos que colidam com o pensamento kardecista.

Em termos comuns diríamos que em qualquer circunstância o Espiritismo deve "ficar na sua" preservando sua identidade, respeitando opiniões e idéias mesmo contrárias a ele, mas de modo algum aceitando-as.

A fidelidade doutrinária é alcançada pela absorção dos objetivos do Espiritismo, sua estrutura e doutrina e jamais estará em perigo quando compreendemos que temos uma verdade e não toda a verdade que, entretanto, nos interessa e aceitamos. Dentro desse sentido, será natural aceitar a diversidade e as diferenças os grupos humanos.

Se não nos compete condenar formas diferentes de pensar o mundo e a pessoa, para que o Espiritismo seja ouvido e respeitado, dando sua contribuição à sociedade é preciso que mantenha sua própria identidade. Fraternização a nível pessoal e afetivo é uma forma superior de entendimento. Mas isso de modo algum pode comprometer a estrutura, o pensamento e os objetivos definidos da doutrina do Espiritismo. Que só será realmente levado a sério se conseguir manter-se íntegro e integral.

Chico Xavier parte aos 92 anos

No dia 30 de junho, pelas 19:30 horas Francisco Cândido Xavier desencarnou em sua casa, em Uberaba, MG, aos 92 anos de idade física.

Talvez o maior médium espírita de todos os tempos, Chico Xavier, tornou-se uma figura exponencial na sociedade brasileira e em muitos outros países, aonde a mensagem espírita chega.

Extrapolando sua condição de adepto da Doutrina Espírita, ele tornou-se uma personalidade admirada e amada por milhões de brasileiros. Em Minas Geais, em votação popular, foi considerado o "Mineiro do Século".

Sua figura humana, acima de quaisquer sectarismos, mostrou como pode uma pessoa viver acima dos mesquinhos interesses mundanos.

Surgiu no cenário espírita nacional em 1932, com o lançamento de Parnaso de Além Túmulo, uma coletânea de poesias de poetas brasileiros e portugueses desencarnados.

Desde então, o movimento espírita teve um salto muito grande.

Pode-se dizer que a duas etapas no crescimento de movimento espírita. Antes e depois de Francisco Cândido Xavier.

Nascido em Pedro Leopoldo, nas vizinhas de Belo Horizonte, mudou-se para Uberaba.

Psicografou e publicou mais de 400 obras, algumas de grande repercussão na literatura e no pensamento espírita brasileiro.

Sob a orientação do Espírito Emmanuel, liderou o movimento espírita, sem tomar o poder, pela força de sua conduta e pelo trabalho mediúnico. Como soe acontecer, com personalidades carismáticas, atraiu milhares de pessoas de todo o país e fora dele que, em caravanas ou individualmente se dirigiram para Uberaba para conhecê-lo, fazer perguntas e através dele obter respostas de parentes desencanados. Fez obra histórica.

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CENTRO ESPÍRITA PORTUGUÊS COMEMORA 24 ANOS DE VIDA

O Centro Espírita Caridade por Amor –CECA - associação cultural de divulgação espírita -, a segunda sociedade mais antiga da cidade do Porto, fundada a 12 de Junho de 1978, comemorou seu vigésimo quarto aniversário durante o mês de Junho, promovendo vários eventos.

Segundo Carlos Ferreira, em e-mail, o CECA, com uma equipe jovem e dinâmica, livre-pensadora e racional, tendo por bússola Allan Kardec, continuam mais do que nunca, empenhado na difusão educacional e cultural da Doutrina Espírita, levando-a para dentro e fora de suas portas. Abraçando, na integra, a mensagem do médico português, António Joaquim Freire, através da psicografia do médium Divaldo Pereira Franco: «Estudar, portanto, o Espiritismo, para viver-Ihe os postulados, é a tarefa que cabe aos seus militantes e trabalhadores da atualidade. Manter-Ihe o caráter dignificante, liberado de superstições e crendices, a fim de preservá-lo de igrejismos e expressões seitistas, constitui o desafio para estas horas.

Visitas e doações
Entre as atividades culturais, o CECA fará doações e visitas de estudo, como a doação das obras da codificação à Biblioteca Municipal do Porto. "Almeida Garret", a entrega de um quadro alusivo, a um dos fundadores do Centro Espírita Caridade por Amor, o septuagenário senhor Mário Duarte. E visita o Centro de Astrofísica da Universidade do Porto

Nos 1 e 2 de junho dirigentes do CECA estiveram presentes em Barcelona, participando de uma confraternização espírita catalã, estreitando as ligações entre Portugal e Espanha. Dentro de seu programa o CECA, decidiu oferecer teses espíritas a Universidades, Institutos de Pesquisa e Instituições brasileiras e européias, por elas solicitadas.

Conferências

 

Foi elaborado um programa de conferências que contará com a participação de conferencistas portugueses e brasileiros.

A abertura oficial do evento será feita pela Dra. Ligia de Almeida, médica e espírita, divulgadora, em solo lusitano, da vertente da ciência médica no contexto espírita e também dirigente da instituição.

Participarão, o conferencista brasileiro Miguel de Jesus Sardano e o presidente da CEPA, Milton Medran Moreira, pela primeira vez em Portugal. João Xavier de Almeida encerrará a programação. Segundo Ferreira ele é um dos atuais dirigentes espíritas portugueses mais respeitados nacional e internacionalmente, com um vastíssimo trabalho e dedicação no movimento espírita português e no CEI - Conselho Espírita Internacional

29ª SEMANA ESPÍRITA DE GUARULHOS

Será realizada de 26 a 31 de agosto próximo, a 29ª Semana Espírita de Guarulhos, realizada pela USE –Intermunicipal, abordando o tema A Importância do Espiritismo na Construção de uma Nova Sociedade (O Espiritismo e os problemas humanos).

O programa elaborado conta de palestras com início às 20 horas.

 

Tema s e oradores

26 – Entre Deus e César – Wilson Garcia

27 – Reencarnação e Desigualdades – Mauro Spínola

28 – A Máquina e a Fé – Roberto Rufo

29 – A Ordem Econômica e a Ordem Moral – Leonardo Kurcis

30 – Educação como aprendizado – Eliseu Florentino da Mota Jr.

31 – A família como instrumento da redenção espiritual - Avildo Fioravanti.

Cartas Abertas

O OUTRO MUNDO É AQUI
Caros amigos do jornal Abertura, na excelente análise de José Rodrigues sobre as desigualdades sociais (O outro Mundo é aqui – Maio de 2002) em que o autor afirmar haver "um trabalho no campo pessoal de cada um no sentido de mudar para melhor o meio físico e humano, mas sob uma visão política", não obstante concordar com seu ponto de vista, senti a ausência de referências ao exercício da caridade e conforme assevera Nelson Mandela: "A educação pode fazer diferença entre uma vida de pobreza extrema e o potencial para uma vida plena e segura; entre países rasgados ao meio pela pobreza e pelo conflito e o acesso de uma nação ao desenvolvimento estável e sustentável" (Folha de São Paulo – 26-05-02). Em suma, numa singela tentativa de colaborar, deveríamos, ao lado das discussões e pressões políticas, (1) intensificar as campanhas beneficentes e (2) interagir com a comunidade oferecendo o espaço físico e/ou o material humano das Instituições Espíritas para fornecer Educação (em seu sentido mais amplo) aos necessitados. Lair Amaro dos Santos Faria - lair_amaro@yahoo.com.br

ESPIRITISMO IGREJEIRO

Aprecio muito o Abertura por conter textos que atingem o cerne da realidade espírita/humana, isentando-a do bla bla bla da religiosidade vazia oral e escrota que grassa por ai afora sem objetivo prático positivo. Positivamente atrelado mais ao mercantilismo igrejeiro fantafarrão. Cícero Guedes de Moura – São Paulo.

ESPIRITISMO CRISTÃO

Venho cumprimentar pela publicação do artigo Kardec, o Espiritismo é Cristão? de autoria do ilustre confrade Milton Pinto de Albuquerque e, ao mesmo tempo, venho me solidarizar com este brilhante articulista que através de uma pesquisa minuciosa, veio provar por A mais B que o Espiritismo é cristão, pois assim o considerava também o grande missionário que foi o sr. Allan Kardec. Meus sinceros parabéns, Sr. Milton. Acho que o Sr. Estava muito inspirado quando tomou essa iniciativa. Concordo plenamente com tudo o que disse, baseado nas obras da Codificação. Erasto de Carvalho Prestes – Niterói-RJ

Fato & Comentário

2,3 Milhões de Espíritas

O IBGE divulgou os resultados do censo de 2000 e mostrou que cerca de 1,4% da população brasileira, se declarou espírita. Ou seja, existem dois milhões e trezentos mil espíritas no Brasil. Certas projeções meramente especulativas geralmente dão um número maior. Isso porque somam as pessoas que freqüentam os centros como espíritas. Na verdade uma grande parte desses freqüentadores são pessoas que buscam o consolo que a doutrina pode dar, para seus problemas emergenciais, sem se comprometer com a doutrina.

É interessante notar que 7,3% dos brasileiros se declararam sem religião, o que representa cerca de 12 milhões de pessoas. Entre essas estão também os espíritas não religiosos que, entretanto, são um porcentual muito pequeno para alterar qualquer resultado.

Afinal não é nada desprezível esse total de espíritas. O Espiritismo se consolidará se desenvolver uma cultura espírita, a partir do pensamento de Allan Kardec.

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Recado do Editor

Da Redação

Reunimos nesta edição opiniões bastante positivas sobre o papel do Espiritismo na sociedade. São opiniões de estudiosos da doutrina e que olham a doutrina dentro de uma perspectiva social, atendendo ao que Allan Kardec preconizou.

O fundador do Espiritismo afirmou que seu objetivo final seria influenciação social. Disse-o não em relação à crença, mas para a questão das relações humanas, da distribuição da riqueza, da justiça social.

Ele não teve a pretensão de transformar a doutrina num partido que disputasse o poder, mas afirmou que a contribuição da doutrina seria feita na modificação das idéias, do entendimento da natureza espiritual do ser humano, acima da pregação religiosa, que afinal já tem seu modelo há milhares de anos.

Entretanto o pensamento político é indispensável para o progresso social. Representa a elevação à categoria de cidadão e como tal, participante ativo das discussões e das decisões mais importantes para a sociedade. Como pessoa que ascende na reflexão do destino pessoal e coletivo, o espírita não poderá alheiar-se ao questionamento político.

Cada autor expôs suas idéias com liberdade e se apresentam como porta-vozes de opiniões que existem no seio dos espíritas. Poderão e deverão ser contestados, discutidos, debatidos.

O ABERTURA é um veículo de idéias absolutamente concordes com o pensamento de Kardec e sabe que esse pensamento se espraia por todos os setores da sociedade e de todas as perguntas e ansiedades humanas.

Razão porque não se coloca como mero veículo doutrinante e corporativo, buscando o debate sadio e a discussão produtiva, porque esse é o caminho, essa a diretriz traçada por Allan Kardec.

Vivendo problemas entre vidas

Jaci Regis

O homem franzino mexeu-se na poltrona.

Tinha cerca de 45 anos, inteligente, mas apresentava problemas íntimos que o atormentavam.

É verdade que avançara muito na solução desses problemas.

Mas ele era um exemplo vivo das dificuldades do Espírito humano, na sua trajetória evolutiva.

Era realmente inteligente. Galgara um patamar de cultura bastante grande. Entretanto, não tinha, ao longo de sua vida, aproveitado esse gabarito intelectual para criar uma base econômica e de satisfação que poderia usufruir com justiça.

A existência tinha transcorrido, até ali, como uma espécie de fuga, ou camuflagem de sentimentos, medos e inibições. Seu mérito era ter perseguido algumas metas apesar do custo emocional que isso lhe acarretara.

Creio que trouxera profundos desvios emocionais.

Ele me contou que nascera após um irmão que morrera ao nascer, enforcado pelo cordão umbilical.

Sabemos que quando existe o trauma da morte, a mãe, talvez a família, se envolve num véu de melancolia e medo. Assim, ele recebeu ao nascer o fluxo de medo e dúvida que certamente assaltou aquela mãe.

Conversando sobre isso, aventei a hipótese de ser ele o mesmo Espírito cuja reencarnação fora cortada pela morte acidental. Sim, creio que ele reencarnou após o infausto acontecimento e internalizou a sensação de afogamento e morte  que sofreu no parto anterior.

Viera a este mundo e aqui se encontrava envolto numa atmosfera de pânico interior, uma sensação de impotência, uma progressiva renúncia de elementares formas de vivência, desde a relação sexual até o alimentar-se.

Dito assim pareceria que tratasse uma criatura nefastamente triste ou intratável.

Ao contrário, soubera contornar situações diminuindo espaços, acomodando-se ao mínimo, sem jamais tentar um vôo mais alto.

Poderíamos descrevê-lo como alguém que fosse sendo encurralado num beco sem saída e ali acomodara-se e, figurativamente, para matar a sede aproveitasse os pingos da chuva e se ajeitara a isso, sem forças para sair, para buscar uma vida mais ampla, produtiva.

Foi podando-se, reduzindo-se.

Prisioneiro dessas inibições cresceu e viveu até agora uma meia-vida, um pedaço do que poderia ser.

Olhando-o, sorridente, fazendo o balanço dos avanços conseguidos e do que resta para vencer, penso no sofrimento, nem sempre doloroso, mas inibidor, frustrante de muitas vidas.

Recordando a possível reencarnação deles mesmo após a morte ao nascer, no parto anterior, isso me parece comprovado pela sensação de não estar respirando em determinados momentos.

A aparência e o caráter

Eugenio Lara

"Preocupe-se mais com o seu caráter do que com sua reputação, porque o caráter é o que você é, e a reputação é o que os outros pensam de você."

John Wooden

As aparências enganam. Este ditado popular é mais profundo do que se imagina, principalmente na nossa sociedade de consumo, de massa, onde os valores morais, os princípios éticos cedem lugar a um pragmatismo desumano e cruel.

Não que a aparência não seja importante. Penso que, na declaração dos direitos humanos, deveria ser incluído o sagrado direito à beleza com todas as implicações necessárias. O acesso a cirurgias plásticas, por exemplo, deveria ser popularizado, ao invés de ficar restrito à elite e ser visto como algo fútil. O direito a uma cidade bonita, a espaços urbanos bem cuidados, a uma arquitetura digna deste nome, a programas televisivos tão elegantes quanto éticos, enfim, o direito ao belo e, quem sabe, como diria Kant, ao sublime.

Afinal, mesmo que a matéria seja sempre a mesma, imutável talvez em sua estrutura, a forma varia ao infinito, o formato evolui conjuntamente com a inteligência. Forma e estrutura, inteligência e matéria, evoluem, infinitamente, segundo a filosofia espírita. Espíritos mais elevados são bonitos, no formato e na estrutura, no conteúdo. Não é à-toa que no imaginário popular arcanjos e serafins sejam brancos, loiros, de olhos azuis e com asas esplendorosas. Todavia, nunca vi um anjo com cara de índio, negro ou mestiço. O nosso ideal de beleza ainda é o helênico, meio ariano, estereotipado pelos padrões fashion, oriundos do Primeiro Mundo.

Sempre achei o ideal de raça pura uma idiotice. Os mestiços são sempre mais bonitos. A miscigenação será sempre desejável em uma sociedade livre, aberta e democrática, conceito que não se aplica a muitos países desenvolvidos onde os segmentos sociais, étnicos, são estanques.

Os romanos, já em seu tempo, sabiam muito bem a importância da aparência. Um provérbio popular da época explicita bem isto: "A mulher de César, não basta somente ser honesta, tem que parecer honesta". Os romanos valorizavam muito a forma, mas esqueceram do conteúdo, do caráter.

Como diz o nosso amigo da epígrafe, nossa preocupação maior deveria ser com a modelagem do caráter. Não há estrutura que se sustente, por mais perfeita que seja, se nela estão pessoas sem caráter, sem preceitos morais, sem uma ética de princípios. A mudança do meio e do ser humano tem que ser concomitante. Querer apenas mudar o indivíduo, esperando que as estruturas assim se transformem é ingenuidade. E querer apenas mudar a estrutura sem mudar as pessoas é uma fantasia.

Em uma sociedade como a nossa, onde a imagem, a visibilidade, a aparência são tão valorizadas, fica difícil seguir na contramão desse tipo de princípio. Mas é justamente isso que o Espiritismo propõe. Ser espírita num mundo como o nosso significa ficar indignado 24 horas por dia com as injustiças, a exploração, a discriminação, com a extrema valorização da aparência, em detrimento do conteúdo. Trata-se de um desafio, possível de ser colocado em prática.

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Política e Espiritismo

Por que o espírita é apolítico?

Esta abordagem decorre de vivências junto a grupos espíritas que, a título de serem isentos, se preservarem de "armadilhas", ou temerem vinculações por recebimento de verbas assistenciais de governos, argumentam contra o envolvimento de pessoas ou instituições espíritas com questões políticas.

Esse posicionamento decorre, em primeiro lugar, de uma interpretação equivocada de neutralidade, que em nosso meio, virou omissão. Segundo, pelo desconhecimento do que realmente é a política e seus nobres objetivos, que devem resultar em corretas atitudes na organização e no exercício do poder. É que, infelizmente, estamos acostumados ao seu lamentável avesso: a politicagem.

O "Pequeno Dicionário da Língua Portuguesa" de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, define a política como "um ramo das Ciências Sociais que trata da organização e do governo dos Estados; a ciência de governar os povos, a arte de dirigir os negócios públicos e estabelecer relações civilizadas."

No Livro dos Espíritos, a Questão 132 indaga: "Qual o objetivo da encarnação dos Espíritos?" Em parte, a resposta é: "(...) a encarnação tem também outro objetivo, que é o de colocar o Espírito em condições de cumprir sua parte na obra da criação (...) de tal sorte que, concorrendo para a obra geral, ele próprio se adianta".

Somente envolvendo-nos em atividades sociais e políticas poderemos transformar a sociedade e por extensão a Terra, elevando seu nível. Hoje, podemos agir politicamente através das várias organizações não governamentais (ONGs) que procuram realizar o que instituições públicas e especialmente as religiões, sempre tentaram e não conseguiram: justiça social, respeito aos diferentes e à natureza em geral.

As melhores conquistas da humanidade surgiram por conscientização e ação política, não decorreram de meras convicções e discursos. As idéias de igualdade, liberdade e fraternidade, não se originaram em órgãos de governo, nem no seio das igrejas, embora seu permanente discurso e clamor por justiça. Idem, quanto à abolição da escravatura, da censura à segregação racial, da aceitação de minorias estigmatizadas, da preservação do meio ambiente, etc. Sempre foram as ações de cidadania, decorrentes da mobilização dos interessados, que pressionaram as organizações sociais para as mudanças, resultando hoje, no que se define como conceitos e comportamentos "politicamente corretos".

Apesar desses avanços, a grande maioria dos espíritas defende a idéia de que espiritismo e política não se misturam. Contrariando essa interpretação, entendemos que a filosofia espírita é eminentemente política, já que explica a inter-relação dos espíritos encarnados e desencarnados durante sua evolução, neste ou em outros mundos das dimensões física ou espiritual. Portanto, participar e contribuir para a melhoria das condições sociais atuando politicamente, é promover o aperfeiçoamento geral, uma das tarefas da nossa condição de "co-criadores". Afinal, temos responsabilidade parcial no processo.

Embora deva ser lamentado, é interessante notar que, em geral, espírita não vota em espíritas que se propõem a fazer política partidária. Temos vários exemplos de companheiros que postularam cargos eletivos, contaram com votos dos espíritas e não se elegeram.

Nas cidades brasileiras, existem milhares de seguidores da doutrina; entretanto, são poucos os vereadores, deputados e senadores espíritas.Tão ruim quanto não participar, é boicotar os espíritas que se candidatam a um cargo eletivo, especialmente se o argumento está baseado em um "artigo de fé" que não se sustenta, e em detrimento do melhor resultado que certamente adviria do engajamento de um homem de bem.

Sem entrar no mérito de suas propostas, precisamos aprender algumas lições com os evangélicos, cuja capacidade de mobilização lhes dá expressiva representatividade. O conceito de que "política é coisa suja" está de tal modo arraigado em nosso meio, que nos recusamos a admitir que ela só será limpa quando a participação de honestos e bem intencionados puder fazer a faxina moral de que ela necessita. A questão 932 de "O Livro dos Espíritos" trata do assunto: "– Por quê, no mundo, tão amiúde, a influência dos maus sobrepuja a dos bons?" Resposta: "– Por fraqueza destes. Os maus são intrigantes, os bons são tímidos. Quando estes quiserem, preponderarão".

Não devemos defender a idéia de fazer proselitismo através da ação política, nem ter como objetivo difundir a doutrina no âmbito governamental para chegar a um "Estado Espírita". A separação entre Igreja e Estado é uma conquista que não devemos abandonar, pois seria um retrocesso. É também um equívoco, tentar afirmar social e politicamente uma fé, com propósitos de conversão, visando o intuito macro de formar rebanho de adeptos, por julgar que as pessoas, para serem boas, têm que pertencer a um determinado sistema de pensamento, laico ou religioso. Sobre isso, ousamos dizer que Kardec, por estar demasiadamente envolvido com os ideais espíritas, nos comentários da Questão nº 798 do Livro dos Espíritos, foi ufanista e visionário, ao afirmar que após duas ou três gerações, o espiritismo se firmaria em âmbito mundial, ainda mais rapidamente do que o cristianismo se desenvolveu. Usando as próprias teses e métodos kardecistas, o bom senso evidencia, que o espiritismo não é "a" solução para os problemas humanos; é apenas "um dos" vários e bons caminhos existentes para uma conscientização ética e moral, transformadora dos homens e de seus sistemas sociais.

É porém, adequado e justo, o propósito de mostrar a excelência dos conceitos espíritas, visando embasar leis e políticas públicas. Assim, se queremos progresso e justiça, devemos mudar o discurso vigente de que "espiritismo e política não se misturam" pois não há como falar de cidadania sem incluir ação política e não há como falar de ação política sem comunicação.

Temos que nos comunicar e agir politicamente com a base ética da Doutrina Espírita, atuando coerentemente segundo as convicções humanistas nela adquiridas, em nossa vida comunitária e no âmbito das instituições governamentais; fora ou dentro dos partidos com os quais tenhamos afinidades ideológicas - porém sem propósitos exclusivistas, discriminantes.

Se nos isolarmos nas casas espíritas apenas orando e esperando que Deus e os bons espíritos transformem o mundo em que vivemos, jamais promoveremos mudanças. Nelas, nossa função primordial é a de formar líderes conscientes para atuar em sinergia com todos. E não a de sermos meros consoladores, devido ao insucesso dos governos que geram as desgraças sociais que nos atingem, quase sempre em virtude de nossas próprias omissões.

Nícia Cunha - Ativa participante do movimento espírita e empresária em Cuiabá – MT

A Mediunidade e a Reencarnação

A análise de fenômenos de caráter psicológico, interpessoal, psíquico ou parapsíquico sob a ótica da palingenesia se constitui numa grande dificuldade de caráter metodológico, epistemológico e experimental. Falta um método que se correlacione com as ciências do comportamento, uma estrutura gnosiológica ainda em fase de gestação segundo a concepção espírita e informações confiáveis acerca dos processos reencarnatórios. Quando essa análise se dá em relação aos processos sociais, aos fenômenos históricos, a complexidade se amplia.

Dizia o sociólogo portenho Humberto Mariotti, que a reencarnação é o sentido da história. Trata-se de uma concepção, de certo modo específica, apesar de abrangente. Preferimos o sentido dado pelo pensador espírita argentino Manuel S. Porteiro, ao entender a história como um processo, um caminhar evolutivo, dialético, progressivo, onde as manifestações individuais e coletivas, em seu sentido teleológico, volitivo e causal se engendram numa rede de transformações e experienciações que vão aos poucos se formando, através de rupturas quantitativas e qualitativas.

Buscar o entendimento do social sob a ótica do processo palingenético significa considerar um outro componente desprezado pelos estudiosos dos fenômenos sociais: o princípio inteligente como um agente ativo, o espírito, uma das forças dinâmicas da natureza. Nada mais nada menos do que um homem, extracorpóreo, um ser interexistencial, uma inteligência extracerebral que se organiza, se estrutura e age segundo os mesmos processos aos quais estão sujeitos os seres humanos encarnados. Mesmos processos significa mesmas leis que regem o universo moral, já que a jurisprudência humana se aplica a quem está vivo, encarnado e vivendo em relação consigo e com o mundo.

Os Espíritos, segundo a filosofia espírita, influenciam o processo histórico através da reencarnação e da mediunidade. Pela reencarnação se inserem novamente no contexto social e existencial. Mediante a mediunidade, produzem manifestações de toda ordem, muito bem classificadas por Allan Kardec como inteligentes ou físicas.

Essas manifestações, amiúde, não se limitam aos conhecidos fenômenos de poltergeist, o movimento dos raps ou as mesas girantes do século retrasado. São abrangentes, insidiosas e penetrantes. Ocorrem, de forma organizada ou não, nas instituições, nos grupos sociais.

Não queremos nos referir à paranóia de que tudo é obsessão, de que qualquer acontecimento nefasto tem o "dedo dos Espíritos", de que eles nos dominam, que estamos à mercê dos obsessores. Essa visão, de tão ingênua que é, nem merece ser refutada.

Nos referimos á interação entre o mundo físico e o extrafísico. Entre os homens (Espíritos) e os Espíritos (homens). Entre grupos de encarnados e de desencarnados. Trata-se de uma questão meramente ambiental, ecossistêmica. O ecossistema físico interage com o extrafísico, compondo um todo, duas faces de uma mesma moeda, inseparáveis, apesar de que, o extrafísico, chamado pelos Espíritos de mundo primitivo, sobrevive ao físico, ao menos teoricamente, supondo, por exemplo, uma hecatombe nuclear que liquidasse o sistema solar.

Sob o ponto de vista ambiental, ecológico, os Espíritos constituem um componente ainda desconsiderado pelas ciências, não somente pela ausência de uma comprovação científica mais rigorosa, conforme os critérios e o paradigma da ciência atual, mas também, e sobretudo, pelo preconceito com uma tese que sempre se achou sob o domínio das religiões.

Na medida em que nos vários ramos da ciência, incluindo-se obviamente a ciência espírita, a idéia do ser humano como uma criatura pré e pós-existente for ganhando corpo, inevitavelmente haverá desdobramentos nos diversos campos do conhecimento. O Espírito deverá ser considerado como um agente capaz de promover mudanças, de se inserir no processo histórico, de contribuir para o progresso ou mesmo impedir que ele se processe.

A mediunidade e a reencarnação deverão ser consideradas como dois conceitos capazes de explicar a ação dessa "nova" inteligência, que se manifesta mediante o processo de comunicação mediúnica e o processo palingenético. São esses os dois componentes básicos para uma reflexão espírita sobre o social, temperados pela ética, pelos princípios de valores contidos na filosofia espírita.

Construções teóricas realizadas pelos vários setores da cultura, por correntes filosóficas, por ideologias, são sempre bem-vindas na medida em que o Espiritismo toca em todos os ramos do conhecimento, "da física e da metafísica", como afirmou Kardec. Mas isso não significa que a formulação teórica dos fenômenos sociais sob a ótica espírita fique dependente e seja determinada por ideologias de caráter socialista, anarquista ou liberal.

O Espiritismo não é socialista, libertário ou neoliberal. Não faz apologia do capitalismo e muito menos do socialismo, ainda que pensadores como Léon Denis ou Cosme Mariño tenham sido socialistas e adeptos dessa ideologia, tanto quanto pensadores espíritas simpáticos ao capitalismo ou anarquismo.

O pensamento social espírita, em processo de construção, possui elementos próprios de análise, uma fundamentação singular em comparação com as ideologias políticas. Possui um caráter sobretudo humanista, voltado para o bem-estar da Humanidade, o progresso dos seres e das coisas. E, ao mesmo tempo, proporciona uma visão prática para o estar no mundo, tanto como uma concepção utópica (no sentido de uma projeto possível), idealista, na construção de uma sociedade onde o egoísmo, a exploração, a fome, a miséria, o terrorismo, a absurda concentração de renda e tantas outras mazelas sejam completamente expelidas.

Eugênio Lara - Redator

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A Profissionalização dos Serviços Assistenciais na Casa Espírita

Conta-se que quando a Nasa iniciou o lançamento de astronautas, descobriu que as canetas não funcionariam com gravidade zero. Para resolver este problema, contrataram uma empresa de Consultoria e empregaram uma década de pesquisas e 12 milhões de dólares no desenvolvimento de uma caneta que escrevesse com gravidade zero, de ponta-cabeça, debaixo d’água, em praticamente qualquer superfície, incluindo cristal e em variações de temperatura desde abaixo de 0 até mais de 300 graus Celsius. Envolvidos, como os americanos, na corrida espacial, os russos detectaram o mesmo problema, mas simplificaram a solução utilizando um lápis em suas viagens pelo espaço.

O leitor deve estar se perguntando o que a corrida espacial empreendida pelos americanos e pelos russos tem a ver com os serviços sociais desenvolvidos em uma Casa Espírita. A princípio não existe relação alguma entre os dois temas, contudo, examinando detalhadamente o assunto, descobrimos algo em comum. Assim como os americanos, a maioria dos Centros Espíritas trabalha tendo como foco o problema – para os americanos, o fato da caneta não funcionar com gravidade zero e as necessidades dos irmãos carentes que buscam a assistência na Casa Espírita -, quando deveriam direcionar seus esforços para encontrar uma solução, objetivo plenamente atingido pelos russos, sem empregar somas vultuosas em pesquisas ou despender tempo.

Sem querer criticar o trabalho dedicado dos irmãos que colaboram nos Centros Espíritas, acredito que é chegada a hora de adotarmos uma postura mais profissional no sentido de resolver os assuntos pertinentes à Casa Espírita. A visão do serviço realizado apenas com carinho e dedicação precisa ser suprimida e substituída pela visão do profissionalismo – frisa-se aqui que profissionalismo também pressupõe amor e dedicação no desenvolvimento das tarefas.

Em pleno século XXI é possível vermos Instituições Espíritas administradas de maneira desordenada, onde cada trabalhador desempenha sua tarefa da forma que acha melhor e quando acha mais conveniente. E assim, sem existência de um planejamento e de uma estrutura pré-estabelecida para o funcionamento da Casa, assistimos a uma série de ocorrências descabíveis em um ambiente onde deve imperar o amor, a união e a ordem.

Especificamente no caso dos serviços assistenciais acreditar que a distribuição de alimentos, roupas, calçados e outros artigos para os assistidos é a solução ideal para o problema seria simplificar muito uma questão que é profunda, principalmente em uma sociedade onde impera a injustiça social e a instabilidade econômica. Deixar de auxiliar os menos afortunados, no entanto, não é a medida correta, o que nos leva à conclusão de que a forma de atuação do movimento espírita nas práticas assistenciais precisa ser renovada, tendo como foco a solução.

O primeiro passo na profissionalização dos trabalhos assistenciais é determinar quais os objetivos da Casa Espírita ao prestar este serviço à comunidade, levando em conta a vocação natural da instituição, o público a ser atingido e, logicamente, a possibilidade de colocar em prática os objetivos traçados.

A etapa seguinte é montar a estrutura do departamento definindo o coordenador e a equipe responsável pelo trabalho, os dias e horários que oferecerão atendimento e quais os serviços que poderão proporcionar aos assistidos. Agora é preciso estabelecer as normas de procedimento de cada trabalho e selecionar – dentre os componentes da equipe – as pessoas que irão colocá-lo em prática.

O passo seguinte é criar mecanismos de controle que possibilitem fazer a avaliação periódica dos trabalhos, dimensionar os serviços prestados, registrar os assistidos. Uma opção simples é a criação e arquivo de uma ficha com dados pessoais do assessorado – inclusive nome e data de nascimento dos membros da sua família -, uma avaliação geral de sua situação – feita através de entrevista particular e visita ao lar do assistido - e registro da assistência recebida – com data e descrição de cada atividade realizada.

Após a realização de todas estas etapas, e antes do trabalho ser implantado na prática, é imprescindível a realização de um treinamento para toda a equipe, onde serão passadas todas as informações e as regras que deverão ser seguidas por todos os trabalhadores, e a implantação de reuniões periódicas para avaliação do que está sendo praticado e como forma de manter a equipe motivada.

Paralelamente à ajuda material, o assistido precisa receber o pão espiritual, traduzido no estudo da Doutrina Espírita, onde os atendidos, absorvendo os ensinamentos contidos no Espiritismo, encontrarão o conforto necessário para enfrentar a sua realidade. Convém, ainda, proporcionar a essas pessoas, a oportunidade de trabalho na Casa Espírita, destacando-as para o cumprimento de tarefas que estejam de acordo com suas capacidades e, logicamente, sob a coordenação de irmãos experientes.

A elaboração de um método de trabalho, o treinamento constante da equipe e a implantação de métodos de controle do departamento, já é um importante passo para a melhoria da qualidade dos serviços prestados, mas ainda traduz a concentração nos problemas e não nos resultados.

Fornecer cursos que possibilitem a reintegração dos indivíduos no mercado de trabalho ou oferecer cursos profissionalizantes para jovens, por exemplo, são formas concretas de auxiliar aqueles que batem à porta do Centro Espírita, pois assim estaremos aumentando as chances do indivíduo retornar ao mercado de trabalho, garantindo o seu sustento e de sua família – a velha história de dar a vara para pescar, ao invés de dar o peixe -, devolvendo-lhe a auto-estima, através da volta à produtividade, e abrindo espaço para que outros indivíduos possam participar deste processo assistencial que culmina com a reintegração do assistido à sociedade, como ser produtivo e auto-sustentável.

Se fizermos um levantamento entre os freqüentadores de nossa Casa descobriremos profissionais das mais diversas áreas, muitos deles dispostos a 

dividir seus conhecimentos com outras pessoas. Assim, sem nenhum custo com mão-de-obra, pode ser possível criar cursos de Auxiliar de Escritório, Técnicas de Redação, Digitação, Secretariado, Desenho ou Culinária; oficinas de artesanato, cursos de bordado, crochê, tricô, bijuterias, entre tantas outras possibilidades.

Muito utilizadas pelas organizações não governamentais, as parcerias com entidades privadas também podem – e devem – ser exploradas pelas Casas Espíritas. Pesquisas revelam que o consumidor sente-se mais atraído pelas empresas preocupadas com a questão social e, da mesma forma, os funcionários da empresa ficam felizes em fazer parte de uma organização que tem essa preocupação.

As mesmas pesquisas também revelam três dados interessantes: que os investimentos na área social aumentam consideravelmente a cada ano; muitos empresários querem, mas não sabem como ajudar; as empresas buscam entidades idôneas e, de preferência, com experiências positivas no desenvolvimento de serviços sociais – requisitos cumpridos pela grande maioria das Casas Espíritas.

Avaliando todos esses dados, concluímos que é possível o Centro Espírita obter ajuda financeira junto a entidades privadas, sem distorcer seu objetivo principal que é divulgar e estudar a Doutrina Espírita. Para tanto, obviamente, será necessário escolher parceiros que primem, acima de tudo, pela honestidade e respeito ao público ou, em outras palavras, a parceria só dará certo se ambas as partes tiverem como objetivo colaborar com a melhoria da sociedade em que estamos inseridos. As parcerias também podem ser feitas no sentido de conseguir assistência jurídica e médica aos necessitados destes serviços, bem como, convênios com agências de empregos para recolocação dos "formandos" da Casa Espírita.

Obviamente, cada casa tem a sua própria identidade e, somente uma avaliação séria de potencialidades humanas e tecnológicas, poderá estabelecer a forma de atuação no desenvolvimento do trabalho assistencial, contudo, a profissionalização da Assistência Social, tendo como foco a solução dos problemas do assistido, isto é, na fonte causadora do transtorno, é uma tarefa que exige maior comprometimento com o trabalho, resultando em menor tempo livre e mais responsabilidade para todos os envolvidos, porém, é um processo inevitável e, ouso dizer, inadiável, por tratar-se de porta de entrada de muitos companheiros para a Doutrina Espírita. Companheiros que, se não atendidos adequadamente, poderão sentir-se frustrados e compelidos a abandonar a nave antes de viajar pelas maravilhas do Universo Espírita.

Marta Rios Guimarães - martharios@uol.com.br - consultora em comu nicação & marketing educadora espírita infanto- junvenil - contista e cronista - diretora de comunicação da união das sociedades espíritas - distrital vila maria - são paulo/sp - vice- presidente do centro gabriel ferreira - são paulo/ sp

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O Livro dos Espíritos é Atual ?

"O império totalitário das finanças mundiais está no fim, e com ele se vão todas as pessoas que não sejam capazes de imaginar outro tipo de vida". (Quiroga)

Em 18 de abril último, o Livro dos Espíritos completou 145 anos de existência, onde na feliz expressão de Herculano Pires "raiou para o mundo a era espírita".

O lançamento desse livro, sem dúvida, significou uma nova fase na evolução humana, pois veio representar o anseio da humanidade numa idéia espiritualista despida de preconceitos, tabus e misticismos tão comuns em quaisquer religiões existentes. Uma outra expressão feliz de H. Pires resumiu tudo: "uma nova luz brilhou nos horizontes mentais do mundo".

O Livro dos Espíritos é o marco inicial do Espiritismo; com ele funda-se a Doutrina Espírita, fruto do trabalho intenso, dedicado e intelectual de Allan Kardec, em harmonia com o plano espiritual.

E porque digo que ele é atual? Porque seja nos debates de questões científicas ou filosóficas, notadamente as de cunho psicológico e moral, a sua contribuição teórica é marcante. Basta ler com atenção e carinho o Livro Segundo e Terceiro dessa grande obra.

Restringir-me-ei do Livro Terceiro (As Leis Morais) para demonstrar essa patente atualidade:

·"A lei natural é a lei de Deus; é a única necessária à felicidade do homem". (Lei Divina ou natural).

Após o advento da figura de Jesus, apresentando Deus pai, compreensivo,

amoroso, tolerante e, nem por isso, frágil, a figura de um Deus cruel, vingativo, não tem mais sentido de existir, a não ser, para os fanáticos e preconceituosos.

Contudo, por conteúdo conceitual, os materialistas o negam "em prol da humanidade"; os niilistas o ignoram por conveniência. Esquecem-se da lição passada por Dostoievski, no livro "Os irmãos Karamazov", através da fala de um personagem: "Se Deus não existe, tudo é permitido". Ou, segundo os espíritos, "o homem só se torna infeliz porque se afasta da lei de Deus".

·"Pela adoração o homem aproxima de Deus a sua alma". (Lei de Adoração)

Quantas vezes em nossa existência fomos agraciados pelo "socorro jamais recusado "quando pedimos com sinceridade? Devemos aprender também a agradecer as maravilhas que vemos todos os dias. Essa necessidade é atualíssima".

Pensamento dos espíritos: "(...) no ato de adoração o homem se torna mais forte contra as tentações do mal".

·"Toda ocupação útil é trabalho, (...), sem trabalho o homem permaneceria na infância intelectual". (Lei do Trabalho)

Faço minha as palavras de Allan Kardec: "Não basta dizer ao homem que ele deve trabalhar, é necessário também que aquele que vive de seu trabalho encontre ocupação, e isso nem sempre acontece. Quando a falta de trabalho se generaliza, toma as proporções de um flagelo, como a escassez. A ciência econômica procura o remédio no equilíbrio entre a produção e o consumo, mas esse equilíbrio, supondo-se que seja possível, sofrerá sempre intermitências e durante essas fases, o trabalhador tem necessidade de viver".

Esse é um libelo contra a ganância e o egoísmo, tão presentes em algumas mentes doentias, que se passam por grandes executivos.

·"Deus a tudo provê, mantendo sempre o equilíbrio. Ele nada faz de inútil. O homem, que só vê um ângulo do quadro da natureza, não pode julgar da harmonia do conjunto". (Lei de Reprodução)

Vê-se claramente a mão divina nos avanços da Ciência e Tecnologia, aumentando as possibilidades de produção e de aproveitamento de recursos. O homem atual tem uma grande preocupação quanto a esse aspecto, respeitando o meio ambiente, controlando responsavelmente a reprodução e batalhando contra os egocentrismos, que dificultam uma melhor distribuição de recursos e renda.

·"Ao egoísmo dos homens, deve-se à falta freqüente dos meios de subsistência em meio da abundância". (Lei de Conservação)

As ONGs e outras organizações da sociedade civil têm realizado um trabalho formidável na conscientização de uma humanidade plena de diversidades, mas unida quanto aos direitos fundamentais da pessoa humana. O Espiritismo já era atual quanto a isso, no Livro dos Espíritos, alertando que "não se desanime diante dos obstáculos que muito freqüentemente não passam de meios de por à prova a vossa constância, a vossa paciência e a vossa firmeza". Comentário de Kardec: "há para todos um lugar ao sol, mas com a condição de cada qual tomar o seu e não o dos outros".

·"É necessário que tudo se destrua para renascer e se regenerar, porque a isso o que chamais destruição, não é mais que a transformação cujo objetivo é a renovação e o melhoramento dos seres vivos"(Lei de Destruição)

Dentro do pensamento de que Deus jamais nos abandona, as pessoas providas de com caráter, e são maioria, através de uma organização séria e trabalhadora, abriram espaço na mídia e nos governos contra a crueldade de algumas destruições, mais especificamente em se tratando do meio ambiente. No Livro dos Espíritos, essa crueldade é vista como conseqüência de uma má formação do caráter. "A destruição é necessária, a crueldade jamais o é". ·"Deus fez o homem para viver em sociedade". (Lei de Sociedade)

O Livro dos Espíritos, neste capítulo, reforça a importância do uso da palavra e outras faculdades necessárias à vida de relação e que, ninguém consegue progredir sozinho. E destaca a importância da família, cujos resumiram os liames sociais. A atualidade disso está à nossa volta; os sucessos, os fracassos, as inseguranças, a personalidade ativa ou amedrontada das pessoas, seus vícios e virtudes estão vinculados à família e, por conseqüência, à sociedade.

·"O homem se desenvolve por si mesmo, naturalmente, mas nem todos

progridem ao mesmo tempo e da mesma maneira; é então que os mais adiantados ajudam os outros a progredir, pelo contato social. (Lei do Progresso)

Há, nesse capítulo, a atualidade dada à importância do progresso intelectual, do conhecimento, como motor propulsor do progresso moral. Segundo Herculano Pires, o que a Doutrina Espírita ensina "é que o homem deve colocar-se, em determinados momentos, acima de seus interesses pessoais, para permitir em sua amplitude a marcha irresistível do progresso".

Nesse capítulo, vê-se também outro conceito muito atual, qual seja a necessidade do aperfeiçoamento da legislação humana.

· "A desigualdade das condições sociais não é uma lei natural, é obra do homem". (Lei de Igualdade)

No telejornal "Opinião", da TV Mar, de Santos, o superintendente da Receita Federal da Baixada Santista, trouxe uma informação muito interessante. Existiriam, no planeta Terra, cerca de 40 paraísos ficais, com depósitos acumulados em torno de quatro trilhões de dólares.

Se a procedência dessa informação é verídica, fica muito difícil qualquer alegação da falta de dinheiro no mundo para o saneamento dos problemas sociais. E, se o dinheiro se encontra em paraísos ficais, certamente não é oriundo do trabalho árduo e fecundo. É fruto de um fantástico egoísmo e ganância.

·"Toda sujeição absoluta de um homem a outro, é contrária à lei de Deus". (Lei de Liberdade)

O Espiritismo subsidia o ser humano, e o fará sempre, toda vez que estiver em perigo a sua liberdade de pensamento, de consciência e o seu livre-arbítrio, pois entende que, a liberdade é a condição primeira para o espírito exercer o seu direito de escolha e com isso, progredir.

·"Desde todos os tempos e, em todas as crenças, o homem procurou, sempre, fazer prevalecer o seu direito pessoal. O sublime da religião cristã foi tomar o direito pessoal por base do direito do próximo". (Allan Kardec, Lei de Justiça, Amor e Caridade)

Segundo os espíritos, "o direito dos homens nem sempre é conforma à justiça. Só regula algumas relações sociais, enquanto na vida privada há uma infinidade destas questões de competência exclusiva do tribunal a consciência".

A criação de uma mentalidade social é tarefa primordial dos governantes. Ocorre que, no Brasil, a barganha, a falta de ética e de posições sinceras e firmes nas relações políticas, criaram em grande parcela da sociedade a teoria de que, abster-se da política é a salvação.

Todavia, é na política, que pode muito bem ser subsidiada pela Doutrina Espírita, que se forma nas massas a mentalidade social. A filósofa Hannah Arendt, dizia que a política é nossa última garantia de sanidade mental.

Quando se exerce um cargo de presidente da FEB, FEESP, USE ou CEPA, deveriam obrigar-se a procurar na mídia um veículo de comunicação do ideal espírita. Obviamente, esse subsídio se faria em assuntos onde o Espiritismo tem contribuição a oferecer. Talvez de um início incipiente vá se criando um conteúdo espírita na opinião pública.

Roberto Rufo - responsável pelas reuniões do ICKS (rrufo@metrosp.com.br)

O Espírita e a função social do Espiritismo

Uma análise profunda do Espiritismo no Brasil leva-nos facilmente a observar que a maioria dos Espíritas está descomprometida com a verdadeira finalidade da Doutrina Espírita. Voltada quase que exclusivamente para os fenômenos mediúnicos, com apresentações públicas do tipo teatral, através da psicografia e da pintura mediúnica, a obras literárias de autores espirituais quase sempre incoerentes doutrinariamente, sem antes terem se utilizado do método exigido pelo Sr. Allan Kardec, essa maioria acha-se distanciada da finalidade precípua do Espiritismo que é totalmente pedagógica, através de sua Filosofia.

Na questão nº 350 do Livro dos Médiuns (justamente o livro que trata dos fenômenos), existe a orientação seguinte: "Se o espiritismo deve, como ficou anunciado, realizar a transformação da Humanidade, só poderá fazê-lo pelo melhoramento das massas, o qual, só se dará gradualmente pelo melhoramento dos indivíduos. Que importa crer nas manifestações e a Humanidade continuar estacionada". Na Revista Espírita de outubro de 1866, Allan Kardec diz: "Nesse grande movimento regenerador, o Espiritismo tem um papel importantíssimo, não o espiritismo ridículo (hoje praticado pela maioria dos espíritas), mas, o Espiritismo Filosófico (ou seja, voltado para o estudo da sua filosofia)". Poderíamos alinhar inúmeras outras orientações kardecistas que mostram ser social a principal função do Espiritismo, mas, para que seja cumprida é preciso que os Espíritas disso se conscientizem.

Hoje, apesar da grande evolução tecnológica e científica que atingimos, vivemos uma verdadeira convulsão social, com total inversão de valores e cuja causa está na ultrapassada forma de ver a Vida e o Mundo e de um modo muito especial nas atávicas orientações religiosas. A Doutrina Espírita que não veio para ser mais uma religião na face da Terra (a não ser que os Espíritas assim a transformem) e sim, para contribuir com seus Paradigmas na Evolução Cultural, Moral e Ética da Humanidade, tem tudo para ajudar a reverter esse quadro social em que vivemos, mas, para isso é preciso ser repensada pela maioria dos Espíritas.

Que os Espíritas possam refletir seriamente e em regime de urgência quanto à função social do Espiritismo, revendo humildemente suas posições, deixando de igrejificar as Casas Espíritas, transformando-as em verdadeiras Casas de Cultura, com um Chamamento Vigoroso a Dignidade Humana para Deveres e Compromissos Sociais e Espirituais, sem o que, o Espiritismo estará fadado no futuro a ser lembrado apenas como uma seita no Mundo e perder o bonde da história.

José Luís de Souza - presidente do centro fraternidade espírita em santos

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Opinião em Tópicos

A Igreja ontem

Nos tempos de minha infância, lá pela década de 50, os censos demográficos certamente indicariam que cerca de 99% dos brasileiros eram católicos. A Igreja Romana reinava soberana sobre as massas. O Estado se dizia laico, mas em todas as grandes solenidades, os oradores saudavam as "autoridades civis, militares e eclesiásticas", que ocupavam os palanques em pé de igualdade, demonstrando o controle que umas exerciam sobre as outras e que todas, em conluio, exercitavam sobre o povo. Não havia solenidade da República e do Estado onde não sobressaísse a púrpura dos paramentos episcopais. E nas pequenas cidades, como a minha, onde a missa dominical das 10 era o acontecimento social mais importante da semana, qualquer pedra fundamental ou inauguração não dispensava a água benta espargida pelo vigário paroquial.

A Igreja hoje

Depois, a partir das décadas de 60 e 70, começou a se observar uma mudança nesse quadro. De um lado, o laicismo e o livre-pensamento, derrubando, pouco a pouco, os preconceitos e os temores arraigados em muitas cabeças. De outro, novas propostas religiosas, incluindo-se entre elas o próprio espiritismo, que consolidava sua feição eminentemente religiosa, e, com intensidade cada vez maior, o protestantismo pentecostal e neopentecostal, através de um apelo fortemente socorrista, imediatista e populista, atraindo as grandes massas socialmente desprotegidas.

O avanço dos "crentes" no Brasil já no censo de 1991 mostrava índices que assustaram a Igreja Católica: 9,5% dos brasileiros ali já se declararam evangélicos, enquanto os católicos eram 83,7%. Agora, quando se divulgam os primeiros números do censo de 2.000, vê-se que a diferença se tornou ainda mais significativa: os evangélicos já são 15,4% dos brasileiros, enquanto que o percentual de católicos baixou para 73,6%

A Igreja amanhã

Ao lado desses números altamente significativos, há um outro índice que chama muita atenção. É o daquele contingente de brasileiros que, respondendo o censo, declaram não ter nenhuma religião. No censo de 91, eram 4,4%. No último, esse índice subiu para 7,3%.

Pode-se dizer, assim, que há dois grupos com tendência de crescimento no país: o dos evangélicos, disparadamente o grupo religioso que mais avança, e o dos sem religião. Representam duas vertentes de pensamento e de comportamento que ameaçam, cada vez mais, o poderio e a influência tradicionalmente exercidos pela Igreja Católica no Brasil.

Vejo, especialmente nesse último grupo um sinal muito positivo a qualificar nosso tempo. As pessoas já não sentem tanta dificuldade em romper com a tradição. É sabido que a grande maioria dos que se dizem católicos só o são por tradição. Não guardam mais quaisquer convicções sobre a dogmática que caracteriza a religião. Mas como foram batizadas e batizaram seus filhos ali, seguem simplesmente se dizendo católicas sem mais o serem. Uma minoria que rompe com essa tradição e se declara sem religião parece caracterizar muito bem a tendência a um crescente laicismo a rivalizar com a massa protestante que aumenta.

Os Espíritas

Os que responderam praticar a "religião espírita" ao censo perfizeram apenas 1,4%. Imagino que esse número não chega a assustar a igreja. Mas penso, sinceramente, que naquele contingente dos que se declaram sem religião e numa imensa maioria de "católicos de fachada", que se confessam seguidores daquela crença só por razões históricas e de tradição familiar, está um respeitável potencial espírita. O fato de não ter religião não impede ninguém de aceitar a existência de Deus ou a imortalidade do espírito e a reencarnação.

A religião hoje não sensibiliza os que pensam. Está direcionada fundamentalmente à questão do sofrimento humano. Bem menos que uma disputa teológica, a concorrência entre elas tem como fator central o poder que se atribuem de solucionar os problemas do povo. Se o Espiritismo souber mostrar-se como uma proposta científico-filosófica, racionalmente coerente, humanista e direcionada à felicidade essencial do homem, estará se colocando fora desse incoerente mercado religioso, podendo, assim, atrair tanto os sem-religião, como os católicos de fachada.

Milton R. Medran Moreira, é advogado, jornalista, e Presidente da CEPA. e-mail: medran@pro.via-rs.com.br

O Espiritismo: Terceira Via para a Humanidade ?

Entrevista com Marcelo Coimbra Régis

Marcelo Coimbra Regis, é um jovem engenheiro, morando na cidade de Portland, Maine, Estados Unidos, onde trabalha em uma industria multinacional.

Criança, participou da Infância Espírita e jovem, foi membro da Mocidade Espírita Estudantes da Verdade, todos em Santos. Tem participado dos Simpósios Brasileiros do Pensamento Espírita, apresentando trabalhos de grande interesse e, também, escreve para o ABERTURA.

Nesta entrevista, realizada em sua casa, em Portland, ele passou em revista alguns temas interessantes sobre a doutrina kardecista.

 

ABERTURA - Marcelo, você está a cerca de 2 anos aqui nos Estados Unidos, pela sua observação, vê e sente a possibilidade de uma doutrina como a kardecista ter sucesso nesta sociedade?

MARCELO - A possibilidade é pequena porque não existe a preocupação, nem a procura desse tipo de questão. Não vejo essa busca de uma transcendência espiritual.

ABERTURA - Mas não existem muitas religiões e filosofias espiritualistas aqui?

MARCELO - Sim, muitas. Mas parece mais como uma necessidade de pertencer a um grupo, a uma fraternidade de pessoas que professam um tipo de fé, mas que está bem separada da vida cotidiana. De segunda a sábado leva-se uma vida praticamente laica, ateia. No domingo vai-se à comunidade, ao seu culto, à sua igreja. As pessoas se sentem bem, mas sem impacto sobre suas vidas.

ABERTURA - Mas essa não é uma realidade geral, pelo menos no mundo ocidental?

MARCELO - Sim, essa é a realidade. Aqui não vejo as pessoas preocupadas com o Espírito, a reencarnação. Por que os Espíritos não se comunicam aqui? Onde moro não há essa ocorrência. Não sei se existe, mas eu não conheço.

ABERTURA - Você se referiu ao livro Em Nome de Deus, de Karen Armstrong, que analisa o fenômeno do fundamentalismo moderno. Esse fenômeno parece do século vinte e permeia a sociedade atual. Da leitura desse livro, em sua opinião haverá pouca esperança para a sociedade espiritualista?

MARCELO – No livro, Karen analisa a trajetória das três grandes religiões monoteístas – cristianismo, judaísmo e islamismo – desde o século XVI mostrando suas contradições e decadência.

Creio que estamos sentindo o esgotamento das religiões. Todas as três religiões analisadas no livro foram criadas entre 2 000 e 1 600 anos atrás, com exceção do judaísmo que é mais antigo. Essas religiões parecem não ter respostas para as necessidades do mundo atual. Portanto, os caminhos, a alternativa a seguir será: ignorar essas religiões e levar uma vida areligiosa. Alguns, desesperados se ligam ao fundamentalismo, uma pseudo volta à origem das religiões. As religiões estão focadas no passado e não no futuro das pessoas. Se mantivermos o foco e apegados às práticas, cultos e doutrinas de tanto tempo atrás me parece haver pouca esperança para uma sociedade espiritualista. A menos que criemos uma terceira via condizente com o que precisamos daqui para frente.

ABERTURA - O Espiritismo em sua essência poderia ser essa a terceira via?

MARCELO - O Espiritismo, talvez. Mas o Espiritismo está sempre no limite entre o velho e o novo. Tem um pé no velho e um pé no novo.Por isso abriga tantas contradições. Por um lado ele quer ser novo, ao buscar mais racionalidade e o científico. Por outro, está ligado ao cristianismo de dois mil anos atrás. Institucionalmente está muito longe de ser essa terceira vida. Como idéia sim, como movimento não.

ABERTURA - Na leitura do livro de Karen, verificamos que, apesar de todos os problemas, nunca houve propriamente um retrocesso, mas um passo à frente. Não lhe parece que caminhamos para um momento em que a idéia espírita, na sua essência, teria uma aplicação prática.

MARCELO - Basicamente sou otimista e vejo que a humanidade tem sempre evoluído, apesar de momentos difíceis. Há uma evolução continua. O Cristianismo foi uma evolução em relação ao paganismo, porque é uma religião do amor, enquanto no passado, essa idéia não existia. Os deuses eram ferozes. O deus de Jesus é um pai. Sua doutrina é de amor ao próximo. Hoje em dia se nota uma tendência para uma posição social que, dentro do esquema da procura de justiça, valoriza a vida humana. Nas sociedades um pouco mais avançadas a opinião pública tem um sentimento que valoriza a vida. Mesmo os terroristas do 11 de setembro seriam fuzilados, enforcados, mas certamente teriam um julgamento. Hoje o que se procura é mais justiça.

ABERTURA – Existe então uma possibilidade?

MARCELO - Como eu acredito nessa evolução contínua e acredito que a idéia espírita é uma evolução em relação ao homem, podemos caminhar para ela, principalmente no que 

diz respeito à lei evolutiva do ser, partindo do princípio espiritual e repetidas reencarnações, mas numa visão positiva e não de pagamento de dívidas.

ABERTURA – Como você vê o comportamento da vida e os valores sociais?...

MARCELO - As idéias sobre a ecologia, a luta pelos direitos humanos, pela igualdade de direitos, me parecem aplicações do princípio básico espírita da evolução. No seu livro, Karen mostra que estamos num ponto de ruptura. Primeiro, a religião dominava a sociedade e com tempo não puderam dar respostas satisfatórias para as aflições. Surgiu então a ciência, o reino do racional e parecia que, finalmente, ter-se-ia encontrado um canal de compreensão mais profundo do porque da vida. Mas a ciência também não resolveu toda a problemática e também levou a atos de crueldade e aumentou o potencial de destruição. Então ficou claro que nem a religião, nem a ciência eram os caminhos certos. Karen afirma que o extermínio dos judeus, na segunda guerra mundial foi o fim dessa euforia.

ABERTURA - O que ficou nesse espaço?

MARCELO - Ela cita Sartre, o escritor e filósofo francês para o qual a retirada do divino da cultura, abriu um buraco do tamanho de Deus, um vácuo e como todo vácuo começou a ser preenchido por comportamentos. As drogas são um fenômeno moderno, uma busca desesperada; a idolatria aos ídolos do futebol, da música, do cinema, da televisão é outro sintoma, porque não dá mais para aceitar a visão mística da religião, mas a racionalização em si mesma não preenche esse vazio.

ABERTURA - O que preencherá esse vazio?

MARCELO - Gostaria de ter a resposta. Posso fazer conjecturas. Porque nesse processo evolutivo, a humanidade caminhará, creio, para uma maior harmonia entre as pessoas, no sentido de direitos e valores, numa valorização geral da vida, com aceitação da diversidade entre as pessoas. Não sei como será feito. Mas, talvez seja através de um processo inevitável de renovação, registrando o anseio geral.

ABERTURA - Como você vê o movimento espírita que reagiu ao excesso de igrejismo no Brasil

MARCELO - Vejo como um movimento super positivo que admite a diversidade e uma leitura do Espiritismo mais de acordo com os padrões de Kardec, mas também mais de acordo com a sociedade atual. Realmente uma alternativa para preencher o "buraco do tamanho de Deus" que mencionei acima. Toda reação naturalmente é um ato de negação do que existe, todos os itens todas as práticas e todas as formas que caracterizavam o movimento religioso, para afirmar sua identidade. Mas o risco é que se torne um movimento árido, sem emoção, sem reconhecer que nem tudo é racional, cerebral.

ABERTURA - Como evitar isso?

MARCELO - O ideal seria achar um ponto de encontro entre o emocional e o racional. Porque existem facetas da realidade humana que não se reduzem ao racional. O Espiritismo se quiser preencher esse vazio não pode oferecer apenas uma faceta racional, mas reconhecer e estar aberto a outras formas de percepção da realidade e da busca da verdade, que passam pelo transcendental, o extrasensorial, com o concurso ativo dos desencarnados.

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Contribuições do Espiritismo para os Problemas Sociais

Um selecionado número de espíritas participou do Seminário O Espiritismo e os Problemas Sociais, realizado dia 29 de junho, das 14:30 às 18 horas, pelo ICKS, em sua sede à avenida Francisco Glicério, 261, em Santos.

O Seminário representou uma contribuição do Instituto Cultural Kardecista de Santos, à abertura mental do movimento e dos espíritas, para as perspectivas mais amplas da Doutrina Kardecista.

 

Como foi

 

O Seminário foi dirigido por Junior da Costa Oliveira, que apresentou primeiramente Eugênio Lara e, em seqüência, José Rodrigues e Jaci Régis, este em substituição a Roberto Rufo, que não pode participar. De acordo com a estrutura do Seminário, foram escolhidos três grupos de três pessoas para formular, cada um, três perguntas aos expositores, após o intervalo.

Os expositores ocuparam, cada um, 25 minutos para apresentar suas idéias. Após esse tempo, deu-se um intervalo de 30 minutos. Retornando ao auditório, passou-se às questões propostas pelos grupos aos respectivos expositores. Foram também respondidas algumas perguntas feitas diretamente pelos participantes.

 

Conceito espírita de propriedade

 

O arquiteto e jornalista, Eugênio Lara, apresentou sua tese sobre a questão da propriedade. Após o histórico da apropriação da terra, como início da propriedade privada, falou sobre a propriedade dos bens de produção através dos tempos. Por fim, examinou a posição espírita sobre a propriedade. Segundo ele, o Espiritismo não é contra a propriedade privada, mas condiciona-a a legitimidade. Ou seja, só é legítima a propriedade obtida sem causar qualquer prejuízo a outrem. Dentro dessa visão questionou a legitimidade das grandes empresas e aglomerados econômicos, sem entrar, contudo, numa forma radical de condenação do sistema econômico capitalista. Para Lara, o Espiritismo não é socialista ou capitalista, mas preconiza um sistema econômico baseado na legitimidade da propriedade, isto é, uma forma de convivência sob o prisma estrito da ética e do bem comum.

 

Lei da evolução e lei da igualdade

 

O jornalista e economista José Rodrigues, fez a abordagem espírita da realidade social, enfatizando os problemas decorrentes da evolução e da igualdade, na visão espírita. Para Rodrigues, é necessário participar ativamente, alinhando-se a movimentos reivindicadores de mudanças sociais. Ele não defendeu a partidarização do movimento, mas ocupou-se em analisar a realidade social e as necessidades de aperfeiçoamento do Estado, sob vários aspectos. Ele afirmou que a igualdade absoluta não é possível, devido às variações das aptidões, mas defendeu uma sociedade igualitária no sentido da melhor distribuição da renda e da construção de uma condição de vida mais digna.

 

Pobreza e fome e lei natural

 

No desenvolvimento de seu tempo, Jaci Régis, jornalista, economista e psicólogo, afirmou que a lei natural pode ser sintetizada como a lei do equilíbrio, em todos os sentidos e que cada pessoa traz consigo a necessidade de relacionar-se com o outro. Nessa visão das relações humanas, referiu-se á tese espírita do bem-estar e da repugnância à pobreza e a miséria, descartando qualquer ligação dessas questões sociais com penas e castigos devido aos erros pessoais do passado.

Para Régis, a doutrina kardecista pugna pela dignidade pessoal e que um estado de miséria e pobreza, além de atentar contra a pessoa humana, é sério obstáculo o processo evolutivo individual e coletivo.

 

Resposta ás questões

 

Após o intervalo, cada expositor respondeu a três questões formuladas pelos grupos selecionados. Nesse tempo, Eugênio Lara foi inquirido sobre a tese da propriedade segundo o pensamento espírita. José Rodrigues respondeu questões sobre a forma como o Espiritismo pode influenciar o social e Jaci Régis, sobre a maneira como a doutrina pode ajudar a transformar o mundo.

Terminada a seqüência de questões, Junior da Costa e Oliveira, deu a cada expositor um minuto para considerações finais, encerrando em seguida o Seminário.

 

Repercussão

 

A reportagem ouviu vários participantes e houve um consenso sobre a validade de debater-se esses temas nos meios espíritas, ressaltando a opinião de que, ficar de portas fechadas para as realidades sociais é um erro que a doutrina não pode cometer. Nesse sentido, alguns entrevistados acreditam que há necessidade de uma reformulação dos critérios geralmente. adotados pelos centros espíritas, onde, segundo eles, se repetem temas para as mesmas pessoas.

Nomes importantes do Espiritismo mundial na Conferência da CEPA

Evento marcado para o mês de novembro próximo já tem confirmado a presença de inúmeros palestrantes com reconhecida atuação. Prazo para inscrição de trabalhos em Temas Livres continua aberto.

A Conferência 2002, tradicional evento organizado pela Confederação Espírita Pan-americana (Cepa), com realização programada para as excelentes instalações da Universidade Cruzeiro do Sul (Unicsul), Campus Anália Franco, Bairro do Tatuapé em São Paulo, já possui a presença confirmada de palestrantes do Brasil e do Exterior. O evento acontece no período de 14 a 17 de novembro próximo e terá entre os suas mais destacadas personalidades as figuras de Jon Aizpúrua, ex-presidente da Cepa, Jaci Regis, psicólogo e escritor, os argentinos Alfredo Quintana, Matias Quintana, Dante Lopez e Cristina Dubrich, além de Gezsler Carlos West, presidente da Associação Brasileira de Divulgadores do Espiritismo (Abrade), Luiz Signates, professor da Universidade Federal de Goiás, Denizard de Souza, professor universitário em Brasília, entre outros.

Delegações de várias partes do Brasil e do Exterior estão também se preparando para participar da Conferência 2002 e tornar a cidade de São Paulo o ponto visual de convergência do Espiritismo no mês de novembro próximo. Você, também, poderá participar deste evento totalmente voltado à análise e discussão de temas da mais alta importância para a doutrina e a sociedade.

Serão quatro dias dedicados inteiramente ao intercâmbio e à reflexão sobre a temática central – Atualizar para Permanecer – em prosseguimento ao congresso da Confederação Espírita Pan-americana (Cepa) realizado no ano de 2000, na cidade de Porto Alegre.

 

Pré-conferência terá cursos e oficinas de trabalho

 

A conferência 2002 oferecerá, durante todo o dia 14 de novembro, para os participantes do Brasil e do Exterior um espaço denominado pré-conferência, onde serão realizados eventos de interesse geral. Entre os temas confirmados encontram-se o Fórum de Política de Comunicação Social Espírita, coordenado pela Abrade; cursos sobre Fundamentos do Espiritismo e Espiritismo e Parapsicologia; e oficinas de trabalho sobre Metodologia e Espiritismo e Transcomunicação Instrumental.

 

Envie trabalho para o fórum de temas livres

 

Estar presente ativamente na Conferência 2002 através do Fórum de Temas Livres é uma excelente oportunidade para aqueles que desejam expor o seu pensamento. Para participar, o interessado deverá cumprir duas exigências: inscrever-se na Conferência-2002 e observar as regras estabelecidas no regulamento que, em sua versão completa, já está disponível pela internet, bastando acessar o endereço www.cepanet.org , onde também poderá providenciar a sua inscrição.

Dentre as modalidades de apresentação de trabalho, o interessado poderá optar por trabalho original, cujo assunto deverá se enquadrar no tema central da Conferência; revisão bibliográfica, relato de caso e painel/pôster. Todos os autores deverão encaminhar, até 12.07.2002, via correio eletrônico ou em disquete, pelo correio convencional, um Resumo do trabalho, com até 400 palavras. Na mesma folha deverá constar: título do trabalho, modalidade escolhida (trabalho, revisão bibliográfica, pôster ou relato de caso/experiência), a área temática respectiva (de conteúdo doutrinário, de linguagem, paradigmática, epistemológica ou metodológica, outra), nome completo e endereço dos autores (inclusive endereço eletrônico, se houver), nome e endereço da instituição (se for o caso).

A Comissão Organizadora confirmará aos autores se o trabalho foi aceito para compor o Fórum de Temas Livres até 03/08/2002. A data-limite para remessa do trabalho completo será no dia 30/09/2002.

 

INSCRIÇÕES

 

Inscreva-se já! O pagamento poderá ser parcelado em valores fixos mensais, sem juros.

 

De junho a setembro:

Brasil: R$ 150,00 ou US$ 60,00 (Exterior)

De outubro até o evento

Brasil: R$ 170,00 ou US$ 70,00 (Exterior)

Jovens até 21 anos terão 50% de desconto.

 

HOSPEDAGEM E PASSAGENS

 

Todo o atendimento aos nossos visitantes nacionais e internacionais será oferecido pela agência CHEK-OUT Turismo, que, através de seu trabalho personalizado, dará apoio direto aos participantes, auxiliando desde a reserva nos melhores hotéis oficiais, meios de transporte, bem como os passeios turísticos, nas melhores condições ao seu alcance. Através do site da CEPA www.cepanet.org você obterá maiores informações sobre passagens e hospedagem. Ou então ligue para a Chek-out Turismo: (11) 5561-2244

Faça já sua inscrição www.cepanet.org

Secretaria do evento - no e-mail: conferencia2002@cepanet.org

Tel.: 55 19 3421.6238