Artigo de Jaci Régis - Junho de 2001

Do Problema à Solução

Formamos um grupo, eu e mais quatro pessoas: três mulheres e um homem.
Os temas eram variados e correspondiam às preocupações mais atuais dos membros do grupo.
Augusta estava ansiosa, perturbada. Era uma mulher de quarenta e cinco anos, quase obesa, com sérios problemas de direcionamento vivencial, mas possuindo viva inteligência.
Ela estava falando de sua experiência no grupo sindical a que se ligara.
- Durante muito tempo partilhei do grupo e aceitava aquele modo de ver as coisas. É basicamente voltado para criticar e opor-se às medidas do governo. Estava ligada , também por amizade a cada um dos participantes. Professores, como eu, disse ela.
Depois de uma pausa, continuou.
- De uns tempos para cá, passei a ter uma nova visão Cansei da posição invariavelmente contra a qualquer iniciativa, mesmo que fosse boa. O objetivo era criticar, ser contra, armar uma posição contrária. Por isso afastei-me.
- Sempre que temos que transitar de uma para outra posição na vida, sentimos grande ansiedade e dúvida, atalhei, para minimizar sua ansiedade.
- É verdade, concordou. Os meus amigo não conseguem compreender minha nova posição. Acusam-me, assediam-me e criticam-me, causando grande aborrecimento em mim.
- Creio que você está num momento de decisão ....
- Já resolvi que não vou voltar ao grupo. Quero ter a liberdade de aceitar ou rejeitar as coisas, ela afirmou resoluta.
Jandira, outra participante do grupo, tinha problemas diferentes. Casada, com 39 anos, era alta e falante. Seus olhos mostravam sempre uma inquietação interior, uma sensação de dúvida e incerteza do caminho a seguir.
- Vejam só, disse ela, duas de minhas amigas, já com filhos grandes, estão envolvidas com relações extra conjugais. Eu fico pasma com a desenvoltura delas.
- Como assim, interveio Augusta.
- Elas assumiram uma atitude que me parece errada, mas o que me causa realmente espanto é a desenvoltura delas. Marcam encontros abertamente, como se isso fosse natural.
- Eu não concordo, nem teria coragem de fazer essa coisa, confirmou Augusta.
- Eu também não, mas que isso me toca, toca... reafirmou Jandira
- Quando meu marido me deixou fiquei muito arrasada, falou Antônia....
Era uma bela mulher negra, esbelta de 42 anos e um pouco triste. Vivia com dois filhos e em litígio com a mãe, embora tivesse profissão que lhe dava suporte econômico.
- Depois, continuou Antonia, vi que a sua nova companheira era uma mulher que dançava e bebia cerveja.
- E daí? perguntou Jandira, interessada nos detalhes daquela aventura.
- Bem eu achei que estava muito fora do contexto e quis também beber e dançar, mas confesso que não consegui. Me fez mal sair de meu modo de ser....Ainda assim, me sinto presa e não consigo ousar, mudar.
- Confesso também, cortou Jandira, que fico pensando se meu comportamento certinho não é errado. Vejo as minhas companheiras todas despreocupadas e será que estou com inveja? Chego a pensar se não devo ousar mais......
- Os valores morais, intervi, são a base de nosso equilíbrio emocional. Analisar a nós mesmos de forma negativa e muitas vezes cruel não é o melhor caminho... Depois o bem, o correto, não pode fazer mal.
- Mas, falou Fábio pela primeira vez, não estou certo de nada disso. Fico pensando sobre o certo e o errado e me perco. Às vezes quero reagir, mas depois recuo.
Ele era um homem de cerca de 30 anos, que se inibira profundamente em relação à vida afetiva. Vivia num clima de indecisão, relutante e pessimista. Tinha uma imagem pessoal muito rebaixada ou dissimulada.
Durante mais de uma hora a conversa prosseguiu.
Quando se foram fiquei pensando sobre a variedade dos momentos e das estruturas de cada pessoa. A busca do ponto de equilíbrio é tarefa permanente. Alguma vezes a inibição decorre do medo de ousar. Outras vezes, ousamos sem medir as conseqüências, e nos damos mal.
Augusta se ressentia fato de receber pressões de seus companheiros para retornar ao antigo modo de agir e pensar, que abandonara. Transitava no caminho da transição de mudança e isso trazia ansiedade.
Jandira, ao contrário, lutava contra a “tentação” de seguir o comportamento das amigas, porque se julgava prejudicada subjetivamente, e a aventura delas estimulava suas fantasias sexuais e afetivas. Indicando a precariedade de sua realização emocional.
Enquanto Antônia tentava compensar sua perda com imitação de atitudes que, naquele momento, pareceriam as adequadas para superar sua baixa estima pessoal.
A excitação e as fantasias podem levar a romper os códigos morais estabelecidos. Quero dizer que certos códigos foram calcados sobre premissas falsas e devem ser mesmo revisados. Mas outros, ao contrário, significam critérios sedimentados e considerados corretos na intimidade da pessoa. Corrompe-los é sempre muito prejudicial.
Saber distinguir uma coisa da outra é o "x" da questão.
O problema de Fábio, pode ser localizado no papel formador da família.. A família desenvolve uma forma de ver o mundo, a partir das opiniões dos pais, criando um psicoesfera familiar própria, fixando os valores morais que combinados com o acervo que cada um traz de suas experiências anteriores, estruturam nossa personalidade.. Por isso, romper com esses valores é, não raro, traumático
Ele pertencia a um tipo de família fechada, controlada por uma mãe centralizadora e por um pai sem personalidade marcante. O rapaz cresceu nesse clima e vencido por um medo íntimo, recuou para uma posição de inibição, criando fantasias negativas a seu respeito e sem jamais direcionar sua energia sexual para qualquer pessoa. Agora, com pouco mais de 30 anos se sente derrotado, envelhecido e incapaz de superar barreiras por ele criadas no relacionamento amoroso.
Todos estavam tentando encontrar uma saída. Fortalecer princípios e encontrar satisfação na própria conduta. Delinear uma forma de vivência produtiva e satisfatória é programa indispensável para a saúde mental, espiritual
Devemos ousar no sentido positivo, romper barreiras negativas e compreender que o pessimismo é nuvem escura tampando o sol de nossas possibilidades. Vencer o medo só possível quando determinamos um rumo mais ou menos seguro para nossas vidas.
Afinal, precisamos aprender a nos amar.