Artigo de Roberto Rufo - Agosto de 2001

A Conduta diante da Pobreza

“Quando se vira as costas aos pobres, se vira as costas a Deus”. Madre Tereza de Calcutá

“Quando acolho o pobre chamam-me de santo; quando pergunto porque existem pobres, chamam-me de comunista”. D. Hélder Câmara

Procurei extrair do livro O Evangelho Segundo o Espiritismo algumas regras que colaborariam com a criação de um comportamento espírita diante da pobreza.
O intuito não é o de estabelecer um formalismo, por si só estéril, mas um lembrete quando enfrentamos situações análogas, onde muitas vezes nos deixamos envolver por julgamentos precipitados, quando não preconceituosos.
Jesus ensina que o Reino dos Céus é para os simples, que ninguém será nele admitido sem a simplicidade de coração e a humildade de espírito; que o ignorante que possui essas qualidades será preferido ao sábio que acreditar mais em si mesmo do que em Deus. (Cap. VII - item 2)
Não procureis o primeiro lugar na terra, nem queirais sobrepor-vos aos outros, se não quiserdes ser obrigado a descer. Procurai, pelo contrário, o mais humilde e o mais modesto, porque Deus saberá vos dar um lugar mais elevado no céu, se o merecerdes. (Cap. VII - Item 6)
Jesus disse: convida os pobres para o teu banquete, pois sabes que eles não podem te retribuir. Por banquete entenda-se a participação na riqueza que desfrutamos. (Cap. – XIII - item 8)
Praticai a caridade moral, que materialmente nada custa, e que não obstante é a mais difícil de se por em prática. (Cap. XIII - item 9)
Daí com ternura, juntando ao benefício material o mais precioso de todos: uma boa palavra, uma carícia, um sorriso amigo. (Cap. XIII - item 18)
Amai o próximo como a si mesmo. (Jesus de Nazaré)
Dois fatos levaram-me a pensar na dificuldade que as pessoas possuem em manter um contato, por mais superficial que seja, com as pessoas definidas como pobres.
Um deles ocorreu no cotidiano do meu trabalho, onde devido à necessidade de se economizar energia elétrica, as equipes de limpeza (as famosas terceirizadas) têm que fazer o seu expediente final quando ainda estamos no local de trabalho. Isso se deve em virtude da desocupação do prédio até às 18 horas.
Algo de inusitado acabou acontecendo: o encontro forçado de duas classes sociais, a dita classe média e a classe pobre (geralmente moças e senhoras da limpeza). Mesmo partindo do princípio de que em ambas não existem anjos, espanta-me, contudo, e a freqüência com que vem ocorrendo, as palavras ríspidas, os gestos deselegantes, a conduta superior quando a “classe inferior” quase toca nas epidermes mais perfumadas.
Não raro vimos algumas funcionárias da limpeza chorando após alguma pequena humilhação. Porque somos assim? Porque tememos ou fingimos não ver os que “não deram certo”?
Quando aconteceu a unificação da Alemanha, uma das grandes tarefas do governo de Bonn era atenuar o preconceito dos alemães ocidentais prósperos com relação aos alemães orientais, então pobres.
O outro fato a relatar vem dos EUA, um país tão cioso e tão orgulhoso do seu sentido de cidadania e justiça social. No entanto, o Humam Rights Watch (HRW), a maior organização de defesa dos direitos humanos, está denunciando os abusos cometidos contra empregadas domésticas estrangeiras trazidas para os EUA por empresários, diplomatas e funcionários de organismos internacionais. Essas pessoas cultas, letradas, brancas como a neve, capazes de citar grandes autores, pagam para o empregado imigrante US$ 2,14 por hora.
O HRW denuncia que isto corresponde a menos da metade do salário mínimo do país. As empregadas brasileiras figuram entre as que estão mais sujeitas a essa situação. Seriam essas pessoas inferiores? Seria a desigualdade natural? Estariam elas acertando contas de encarnações passadas?
Concluo com Jesus de Nazaré, na história por ele narrada do homem de muitos bens: “Alma, tens em depósito muitos bens para muitos anos: descansa, come, bebe e folga. Mas Deus lhe disse: louco, esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado para quem será?”.

Roberto Rufo é vice-presidente do Instituto Cultural Kardecista de Santos (ICKS), bacharel em Filosofia e colaborador do Abertura.