Artigo de Jaci Régis - Novembro de 2001

Pessoas Especiais

Há pessoas que deixam uma marca positiva em suas vidas cheias de exemplos que as tornam referências de comportamentos produtivos. 
Porque há os que trafegam pela existência como que carregando um fardo demasiado pesado e exprimem um desagrado constante.
Não me refiro aos que, por motivos de saúde e pela exclusão social, arrastam uma vida amarga pelos obstáculos e pelas dificuldades.
Estou pensando nas pessoas que, sob esse aspecto, não teriam o que reclamar. Têm uma boa saúde, não padecem de privações econômicas.
Entretanto, exibem uma feição transtornada, costumam reclamar e criar situações pessimistas, embaraçosas para quem os ama ou precisa manter-se junto.
Ela me contava, entusiasmada sobre sua avó. Morrera com noventa e um e meio anos de vida bem vivida.
Era, pelo relato, uma mulher ativa, vencedora, irradiando uma atmosfera de simpatia e otimismo.
No seu jeito de falar, afirmou que a avó “era disputada a tapa...”, de tão benquista que era.
No início de sua vida de casada , continuou, desfrutara de uma posição econômica bem farta. O marido, contudo, por razões não comentadas, perdera praticamente tudo.
Não suportando o fracasso, o homem começou a beber. Depois, caiu em depressão e passou o resto de sua vida num quarto. Durante esse longo período, ela manteve-se absolutamente solidária com ele. Embora as críticas, uma vez que com suas exigências, faziam-na praticamente prisioneira, ela jamais abriu a boca para reclamar. E afirmava que aquele homem era o amor de sua vida e quando finalmente ele morreu, disse que, se houvesse reencarnação (no que não acreditava) voltaria com ele outra vez.
Quando o marido morreu ela já estava com oitenta anos. Mas enquanto viveu demonstrou um dinamismo, uma juventude interna que encantou e marcou toda a família. 
A neta, que contava esses fatos, também relatou outros casos.
Uma tia adoecera de uma doença cujo nome não recordo. Mas era extremamente dolorosa. Tanto que suportava, mesmo assim, com muita dor, apenas um lençol sobre o corpo.
Impedida de movimentar-se a família montou um quarto especial para ela e, diz a sobrinha, seu comportamento foi de uma elevação admirável.
Era otimista, irradiava alegria, mesmo na dor,. Por isso, a família se organizou para que ela jamais ficasse sozinha e revezavam-se para fazer-lhe companhia.
Ao reverso, outra tia, também acometida de doença dolorosa, chincava, revoltava-se, de tal maneira que, poucos a visitavam e ficou praticamente isolada em sua dor.
Ela concluiu, enfática: a gente tem que optar se quer ou não ser feliz....
Apesar de nem sempre serem reconhecidas, muitas pessoas passam pela vida de maneira que, no nível das mediocridades comuns, são, realmente, especiais.
Existe nelas uma reserva de consciência, de energia, que as impele para frente, para a luta. Diante das dificuldades não se aprisionam aos obstáculos, mas se fixam nas soluções.
Irradiam uma atmosfera de segurança, mesmo que sejam frágeis. Persistem onde muitos desistem. Mantém firmes diante dos desafios.
O que faz uma pessoa especial?
É justamente o não abater-se, o não desanimar. Não quer dizer que não sintam cansaço, nem que em certos momentos, haja uma decaída nas energias. Mas o que as torna especial é não conformar-se com isso é reerguer-se e acreditar na vitória.
Ser especial não é ser herói ou heroína. É utilizar de forma inteligente, persistente e produtiva suas energias e “saber” interiormente que por mais que demore, haverá uma saída. Ou ainda melhor, são especiais porque não criam em suas mentes situações estressantes, ambíguas, derrotistas. Vivem e lutam como fato natural.
Não desconhecem as limitações pessoais, não avançam os sinais do possível e do razoável. Ao contrário, trabalham com suas energias no limitado espaço que conquistam e fazem como a pessoa que aproveita um pequeno espaço de terra, aparentemente desprezível, transformando-o num jardim ou numa horta.
Não é possível esquematizar o mistério da vida. Nem especificar a complexidade da mente, nem o íntimo de cada ser. Todavia, temos que viver e para isso precisamos escolher os melhores instrumentos para ser feliz. Essa opção, quando tomada no seu sentido positivo, delineia o comportamento, o modo de ser.
Escolher ser feliz é usar o melhor para si e para os outros. Porque não dá para ser feliz isolado. A felicidade nasce da partilha de sentimentos.