Artigo de Jaci Régis - Março de 2001
Allan Kardec, ao afirmar a existência do perispírito, idêntico ao corpo físico, definiu-o como o envoltório do Espírito. Como não é possível imaginar o Espírito sem um corpo, seja encarnado ou desencarnado, é lógico supor que o perispírito é permanente. Ou seja, no nosso nível humano, o ser espiritual identifica-se, no espaço extra-físico, com um corpo idêntico ao que possuía enquanto encarnado, sucessivamente.
Isso, porém, não significa que seja sempre o
mesmo perispírito. Ao contrário, sabemos que em cada encarnação,
há a desintegração e a reconstrução desse corpo energético,
decorrente do processo de germinação e constituição do
organismos físico.
Dada a impossibilidade, então presumida, da relação direta do
Espírito e o corpo físico (espírito e matéria) atribuiu-se ao
perispírito o papel de intermediário entre os dois e, ao mesmo
tempo, como lugar da memória, inclusive estampada na morfologia
corporal, devido a extrema plasticidade do corpo energético.
Devido, principalmente, às dificuldades para explicar a permanência
e a consolidação molecular do corpo somático, pensou-se que
cabia ao perispírito a função de modelo funcional do organismo
físico, fonte e diretriz de sua morfologia e mesmo de seus
funcionamento biológico.
Essa idéia tem sido repetida, sob variadas formas desde Delanne
até hoje, inclusive por André Luiz.
Contestações
Estudiosos mais liberais e ligados ao pensamento científico
vigente, têm procurado contestar as tradicionais informações
sobre o papel do perispírito.
Os engenheiros Marcelo Coimbra Régis, em trabalho apresentado no
IV Simpósio Brasileiro do Pensamento Espírita, em 1995, e
Reinaldo Di Lucia, no VI SBPE, em 1999, apresentaram algumas idéias
sobre o perispírito., dando novas contribuições para o estudo
do envoltório semi-material que acompanha o Espírito durante e
após a encarnação.
A partir dessas contribuições elaboramos este estudo.
O Espírito
Encontramos em O Livro dos Espíritos informações vagas sobre a
natureza do Espírito. Isso é perfeitamente compreensível
porque não há forma gramatical ou explicação cientificamente
compreensível sobre a complexa ou, quem sabe, simples constituição
do ser .
A palavra espírito (com letra minúscula) é
inicialmente empregada para designar o princípio inteligente do
universo em contraposição ao princípio material. Nessa mesma
obra vemos uma série de ponderações sobre a interação entre
esses dois elementos, cabendo a Kardec dizer que a matéria
é o agente, o intermediário, com a ajuda da qual e sobre a qual
o espírito atua .
Depois, a palavra Espírito(com letra maiúscula) foi
usada para designar os seres inteligentes da Criação
ou seja, para a individualização do princípio inteligente.
Na tentativa de explicar a forma do Espírito , temos alguns
itens de grande significação:
1. Os Espíritos são imateriais? Imaterial não é o
termo apropriado, incorpóreo seria mais exato (...) é uma matéria
quintessenciada (...) tão eterizada, que não pode ser percebida
pelos vossos sentidos.
2. Os Espírito têm uma forma determinada, limitada e constante?
Ele são , se o quiserdes, uma flama, um clarão, uma centelha etérea.
Segundo a Doutrina, esse Espírito ao ser criado é um princípio
espiritual, que se tornará um Espírito ao
desenvolver a inteligência e a afetividade, capaz de perceber-se
como um ser, numa espiral evolutiva.
Uma das mais significativas e inéditas contribuições do
pensamento espírita, refere-se à sua teoria da evolução do
Espírito. De acordo essa teoria, o ser inteligente do
universo é criado por Deus, como um princípio espiritual,
simples e ignorante. Isto é, um ser potencial,
estruturalmente vazio. A potencialidade está contida na
possibilidade de expansão e aquisição de experiências, movida
por uma forma de energia oriunda de sua natureza permanente,
imortal.
Essas informações nos levam a ponderar que, em si mesmo o Espírito
não possui organização, sendo um núcleo incorpóreo,
potencialmente expansível dispondo de uma energia intrínseca,
propulsora e determinada, sintetizada no instinto de conservação
e de uma capacidade potencial de apreensão e reelaboração de
experiências.
Dentro desse enfoque, o estudo do ser deverá ser feito em dois
momentos:
O período pré-humano, como tempo de estruturação básica da
individualidade
O período de sua inserção no nível humano, onde estrutura uma
personalidade mutante.
O período pré-humano caracteriza-se, a partir instinto de
conservação ou agressividade natural, como o da aquisição de
conteúdos de experiência. Nele, o princípio espiritual não
tem consciência de si mesmo e não possui nenhuma estrutura básica
de percepção ou seleção. Na verdade, parece compreensível
que a busca incessante da autopreservação, como elemento básico
de perpetuação, seja o desencadeante do processo evolutivo pois
dentro desse impulso inato, o ser embrionário, esboça o esforço
de construir condições de manter-se íntegro.
Em conseqüência desencadeia também um complexo, amplo e infindável
processo de relações com o meio ambiente e com semelhantes,
estabelecendo as bases futuras da consciência.
O período humano é caracterizado pelo desenvolvimento da razão,
ou seja a capacidade de acumular aprendizado e experiências e
desenvolver a afetividade, com o reconhecimento de si mesmo e do
outro.
Como diz André Luiz no livro No Mundo Maior, (página
57 ,20ª edição - FEB) O princípio espiritual desde o
obscuro momento da criação, caminha sem detenção para frente.
Afastou-se do leito oceânico, atingiu a superfície das águas
protetoras, moveu-se em direção à lama das margens, debateu-se
no charco, chegou à terra firme, experimentou na floresta
copioso material de formas representativas, ergueu-se do solo,
contemplou os céus e, depois de longos milênios, durante os
quais aprendeu a procriar, alimentar-se, escolher, lembrar e
sentir, conquistou a inteligência....Viajou do simples impulso
para a irritabilidade, da irritabilidade para a sensação, da
sensação para o instinto, do instinto para a razão.
O Corpo Mental
Já vimos que o princípio espiritual não possui estrutura, pelo
menos inicialmente. Todavia, interagindo com os elementos orgânicos,
ele vai desenvolvendo uma estrutura psíquica, que chamo, por
analogia, de corpo mental. É nesse centro energético e psíquico
que o princípio espiritual vai estruturando um sistema mental
flexível. Como diz André Luiz é nesse espaço que vão sendo
inscritos os princípios ontogenéticos que a experiência
repetitiva e incessante vai consolidando, no processo constante
de nascer, viver e morrer e renascer. Aí ele estrutura a memória
e seleciona as experiências vividas.
Ao longo do tempo, construindo, reconstruindo e armazenando as
experiências, o princípio espiritual, começa a adquirir consciência
crescente de si mesmo. Torna-se um Espírito. O corpo mental é,
então, seu instrumento de recriação constante dos processos
vivenciais de nascer, viver, morrer e renascer, com a diferença
crescente de conscientização de si mesmo e do usufruto dos
resultados acumulados das experiências e vivências. E é no
corpo mental que ele inscreve e consolida, refunde e recicla suas
impressões e aprendizado.
Referindo-se ao corpo mental, assim afirma André O corpo
mental ,assinalado experimentalmente por diversos estudiosos, é
o envoltório sutil da mente. Estudando os efeitos do monoideismo
que leva à perda do perispírito, André Luiz diz o seguinte:
cabendo-nos notar que essa forma (ovóide), segundo a nossa
maneira atual de percepção, expressa o corpo mental da
individualidade, ao encerrar consigo, conforme os princípios
ontogenéticos da Criação Divina, todos os órgãos virtuais de
exteriorização da alma, nos círculos terrestres e espirituais,
assim como ovo, aparentemente simples, guarda hoje a ave poderosa
de amanhã ou como a semente minúscula, que conserva nos tecidos
embrionários a árvore vigorosa em que se transformará no
porvir. (Evolução em Dois Mundos, Cap.II - Corpo espiritual, página
25, 91 1ª edição 1959 - FEB).
Temos, pois, uma descrição possível do corpo mental, como um
corpo sutil, de forma ovóide em torno do Espírito, guardando os
órgãos de exteriorização da alma. Nessa conjugação
mento-espiritual reside a expressão da individualidade.
Embora enfatizando o perispírito como centro virtual da organização
física, André Luiz, mostra-o, todavia, precário, transitório,
dependendo do desempenho mental para manter-se íntegro após a
morte, principalmente nos primórdios da evolução e, depois,
devido a processos doentios de concentração emocional.
Eis o que ele diz: Pela compreensão progressiva entre as
criaturas, por intermédio da palavra que assegura o pronto
intercâmbio, fundamenta-se no cérebro o pensamento contínuo e,
por semelhante maravilha da alma, as idéias-relâmpagos ou as idéias-fragmentos
da crisálida de consciência, no reino animal, se transformam em
conceitos, inquirições, traduzindo desejos e idéias alentadas,
substância íntima Nesse processo evolutivo, informa ele
vamos encontrar o homem infra-primitivo, na rusticidade da furna
em que se esconde, surpreendido no fenômeno da morte, ante a glória
da vida, como criança tenra e deslumbrada à frente de paisagem
maravilhosa, cuja grandeza, nem de leve, pode ainda compreender.
O pensamento constante ofereceu-lhe a precisa estabilidade para a
metamorfose completa... Entretanto, o homem selvagem, que se
reconhece dominador na hierarquia animal, cruel habitante da
floresta, que apura a inteligência, através da força e da astúcia,
na escravidão dos seres inferiores que se lhe avizinham da
caverna, desperta fora do corpo denso, qual menino aterrado, que,
em se sentindo incapaz da separação para arrostar o
desconhecido, permanece, tímido, ao pé dos seus, em cuja
companhia passa a viver, noutras condições vibratórias, em
processos multifários de simbiose, ansioso por retomar à vida física
que lhe sugere à imaginação como sendo a única abordável à
própria mente.....
Ressurgir na própria taba e renascer na carne, cujas exalações
lhe magnetizam a alma, constituem aspiração incessante do
selvagem desencarnado.... Pela oclusão de estímulos outros, os
órgãos do corpo espiritual se retraem ou se atrofiam, por ausência
de função, e se voltam, instintivamente, para a sede do governo
mental, onde se localizam, ocultos e definhados, no fulcro de
pensamentos em circuito fechado sobre si mesmos, quais
implementos potenciais do germe vivo entre as paredes do ovo.
Nesse período, afirmamos habitualmente que o desencarnado perdeu
o seu corpo espiritual, transubstanciado-se num corpo ovóide...
((Evolução Em Dois Mundos, pagina 76, 88 a 91 - 1a. edição,
1959, FEB)
Verificamos, por essas informações, que perdendo o perispírito
por deficiência do interesse e dificuldade em permanecer
consciente, o Espírito concentra-se no seu corpo mental, onde
provavelmente se instala a mente ou projeção constitucional do
Espírito, sede da memória permanente e reduto de todas as
experiências de seu processo evolutivo.
Dissolução e Reconstrução do Perispírito
A reencarnação é, por natureza, um trauma, destinado a
promover uma ruptura das condições ambientais, provocando um
conflito existencial que pode ou não resultar numa modificação
estrutural da personalidade existente.
Em síntese, se considerarmos os efeitos que o processo
reencarnatório provoca na estrutura da personalidade construída
antes do nascimento, teremos um quadro bastante elucidativo.
Dividamos o processo, a partir do momento da concepção até a
consolidação da encarnação, e analisemos o comportamento do
perispírito durante o processo .
Período de Desestruturação
Este período se caracteriza pela desestruturação da
personalidade existente, isto é, aquela que o reencarnante
construiu na encarnação anterior, com possíveis modificações
no plano extrafísico. Apenas para reforçar e lembrar, que a
individualidade permanente cria, a cada encarnação, uma
personalidade adequada ao momento existencial, portanto mutável..
Ao se iniciar o processo da reencarnação, ele é um ser adulto,
com idéias, sexo e conceitos mais ou menos definidos. Dentro de
9 meses, todo esse acervo se concentrará, perdendo os
delineamentos de memória para ser sintetizado num ser indefeso e
impotente para realizar os mínimos exercícios de raciocínio e
percepção consciente de si mesmo.
No livro Entre a Terra e o Céu, André Luiz nos traz
interessantes informações sobre o desaparecimento do perispírito
no processo reencarnatório. O relato gira em torno da reencarnação
do Espírito de Júlio, que no momento é uma criança
desencarnada
. O corpo sutil do menino como que se justapunha aos
delicados tecidos do perispírito maternal, adelgaçando-se
gradativamente aos nossos olhos.... Delgaçara-se de maneira
surpreendente... (. E a forma a rarefazer-se sob nosso
olhos? )..... Está em ativo processo dissolução..
Em seguida transcreve a ilustração feita pelo Instrutor sobre o
processo de dissolução do perispírito. Imaginemos um pêssego
amadurecido, lançado à cova escura, a fim de renascer.
Decomposto em sua estrutura, restituirá aos reservatórios da
Natureza todos os elementos da polpa e dos demais envoltórios
que lhe revestem os princípios vitais, reduzindo-se ao imo do
solo ao embrião minúsculo, que se transformará, no espaço e
no tempo, em novo pessegueiro.
É importante notar que O Livro dos Espíritos afirma que o
feto não tem alma que corresponde à informação de que a
ligação do Espírito com o organismo em gestação é tênue,
através do chamado cordão perispiritual uma extensão
energética, em nosso entendimento, do corpo mental. Logo, aí
praticamente inexiste o perispírito. Como propõe Reinaldo Di
Lucia, sendo o perispírito um não-organismo, uma forma energética,
ele só ressurgirá após o nascimento da criança.
No período de gestação, existe o Espírito e seu corpo ovóide
preso ao campo mental da mãe e dele se desprende com o
nascimento
Período de Reestruturação
O nascimento representa o mergulho do Espírito numa autêntica
caixa preta saturada de emoção e latência, pois
todo o acervo anterior é submetido a um processo de compactação.
O choque do nascimento é o ponto de ruptura do antes e do agora.
Imediatamente após o nascimento, tem início o período de
reestruturação, Nesse momento a forma perispiritual começa a
reestruturar-se, juntamente com o crescimento da criança.
A integração do Espírito ao seu corpo promove a reconstrução
total do corpos psíquico, expressão energética, virtual do
organismo físico.
Ligação Espírito-Corpo
Uma questão importante é saber-se como se faz a ligação do
Espírito com o corpo.
O Livro dos Espíritos tem informações interessantes
1. A alma não está encerrada no corpo, como o pássaro numa
gaiola. Ela irradia e se manifesta no exterior, como a luz através
de um globo de vidro ou como som em redor de um centro sonoro. É
Por isso que se pode dizer que ela é externa, mas não como um
envoltório do corpo.
2. A alma não tem no corpo uma sede determinada e circunscrita,
mas ela se situa particularmente na cabeça... e no coração.
3. A sede da alma se encontra mais particularmente nos órgão
que servem para as manifestações intelectuais e morais
Considerando que a referência ao coração como sede do
sentimento é antes de tudo uma metáfora, não há dúvida que
é no cérebro que se encontram as ligações essenciais entre o
Espírito e o corpo.
Embora não se tenha uma idéia clara de como se dá a ligação
da mente espiritual e o cérebro, é fora de dúvida que a
interligação Espírito e corpo se processa nas circunvoluções
e mecanismos cerebrais.
Apoiando-nos no estudo de Reinaldo Di Lucia sobre o perispírito,
acima referido, podemos elucubrar sobre a possibilidade de que
essa ligação Espírito-cérebro, se dê, em perfeita integração,
no nível energético vibracional. Esse campo eletrizado e
saturado de vibrações, mento-magnéticas, exprime, a nosso ver,
os vórtices vibracionais do Espírito, através do tecido energético
de forma ovóide, que seria a estrutura do corpo mental.
O cérebro estaria mergulhado nesse tecido mental, estabelecendo
uma ligação extremamente sutil, mas totalmente integrada, sinérgica.
Seria, como analogia possível, uma interligação mente-cérebro,
idêntica a que ocorre entre os neurônios, através das sinapses
e neurotransmissores, aqui substituídos pelo fluxo da vontade do
Espírito e emissões energéticas do organismo cerebral.
Conclusão
Essas hipóteses nos levam à conclusão de que certas funções
fundamentais atribuídas ao perispírito, no campo da memória e
das recíprocas influências entre a mente espiritual e o corpo são,
na verdade, exercidas diretamente pelo Espírito, através de seu
corpo mental, num continuum energético integrado em suas
variadas expressões.
Dentro do entendimento de que estamos constantemente emitindo
energias das mais variadas expressões, freqüências e
intensidade, sabemos que um tecido energético repete em nível
vibracional de energia mais sensível, a estrutura externa do
organismo humano, refletindo, todavia os estados mentais da
pessoa. Seria a aura humana. Essa estrutura energética,
verdadeira carapaça energética, no dizer de André Luiz,
identifica os estados emocionais e físicos da pessoa. É um halo
vital, mistura de energias de bases diversas, que, todavia, não
deve ser confundida com o perispírito. Existe em relação á
vida orgânica e mental do ser encarnado.
Ligado diretamente á mente espiritual, o perispírito é uma
estrutura de energia sutil, mas forte, moldado na dinâmica da
sinergia mente-corpo, durante a encarnação. Sendo, todavia,
independente do corpo físico, quando mantido pela vontade e pelo
pensamento contínuo do Espírito, transcende ao organismo,
permanecendo íntegro durante a encarnação e após a morte física,
como instrumento de identificação da pessoa.
O perispírito é, como afirmamos, uma capa energética,
característica bem próxima da expressão envoltório
usada por Kardec, sem estrutura e sem organização propriamente
dita, mas existindo pela vontade do Espírito, como instrumento
de identificação.
A sede da memória, o instrumento mental desenvolvido pelo Espírito,
seria seu corpo mental, permanente e em constante processo de
expansão e aperfeiçoamento.