Artigo de Mauro Quintella - Abril de 2001
O primeiro a falar que o Espiritismo tinha três
aspectos foi o próprio Allan Kardec. A tese está na CONCLUSÃO
de O LIVRO DOS ESPÍRITOS. Vejam o primeiro parágrafo da parte
VII. Lá está dito:
O Espiritismo se apresenta sob três aspectos diferentes: o
das manifestações, o dos princípios e da filosofia que delas
decorrem e o da aplicação desses princípios
Em agosto de 1897, os científicos do Centro da União
Espírita de Propaganda no Brasil, liderados por Afonso Angeli
Torteroli, lançaram o epíteto tripartite CIÊNCIA-FILOSOFIA-MORAL
na REVISTA ESPÍRITA DO BRASIL.
Acredito que eles se basearam no já citado texto de Kardec para
construir esse modelo. Que seria:
a) MANIFESTAÇÕES -> CIIÊNCIA,
b) PRINCÍPIOS E FILOSOFIA -> FILOSOFIA,
c)APLICAÇÃO DESSES PRINCÍPIOS -> MORAL OU ÉTICA.
Com o passar dos anos, outra tendência surgiu e se fortaleceu,
substituindo o conceito de MORAL pelo de RELIGIÃO.
Na minha avaliação, três fatores contribuíram para essa
bifurcação doutrinária:
a) A paulatina constatação de que a MORAL ou ÉTICA é um
departamento da FILOSOFIA e não um campo específico do
CONHECIMENTO;
b) A realidade antropológica, histórica e sociológica que
dividiu os pensadores e buscadores em cientistas, filósofos
e religiosos;
c) O surgimento da GNOSIOLOGIA, cujos autores clássicos
defendiam a rígida e estanque divisão do CONHECIMENTO em CIÊNCIA,
FILOSOFIA e RELIGIÃO.
d) Representando essa vertente, Carlos Imbassahy (pai) formalizou
o slogan CIÊNCIA-FILOSOFIA-RELIGIÃO, no lugar do antecessor CIÊNCIA-FILOSOFIA-MORAL,
criou a expressão TRÍPLICE ASPECTO e escreveu o arrazoado que a
sustenta. Isso se deu em 1929.
A idéia está no livro RELIGIÕES COMPARADAS, uma coletânea de
textos, organizada e publicada por uma instituição chamada
Cruzada Espiritualista. Carlos Imbassahy diz o seguinte:
Há que encarar o Espiritismo sob o seu TRÍPLICE ASPECTO:
o de CIÊNCIA, o de FILOSOFIA e o de RELIGIÃO. Afastar uma de
suas faces é mutilá-lo e ele só pode ser compreendido no
conjunto dessas três atividades.
O livro foi editado pela Gráfica Roland Rohn & Cia e a citação
está na página 146.
Só onze anos depois, em 1940, o Espírito Emmanuel se manifesta
sobre a tese do TRÍPLICE ASPECTO no livro O CONSOLADOR (edição
da FEB).
O entrevistador de Emmanuel (segundo consta, Manuel
Quintão, foi o organizador das questões), pergunta o seguinte:
Apresentando o Espiritismo (...), três aspectos
diferentes, científico, filosófico e religioso, qual desses
aspectos é o maior?
Note que o entrevistador já considera a tese do TRÍPLICE
ASPECTO e a concepção tripartite CIÊNCIA-FILOSOFIA-RELIGIÃO
como verdades líquidas e certas.
O Espírito Emmanuel não contesta nenhuma das duas idéias.
Concorda com elas e afirma - equivocadamente, na minha opinião -
que o aspecto religioso era o mais relevante e importante.
Em 1942, Antônio Lima publica o livro TELÉGRAFO SEM FIO (edição
própria, Rio de Janeiro) e, na capa, coloca o seguinte slogan:
SÍNTESE DO ESPIRITISMO, SOB O TRÍPLICE ASPECTO:FILOSÓFICO,
CIENTÍFICO E RELIGIOSO
De lá para cá, essa tendência doutrinária ficou muito forte e
os partidários do epíteto CIÊNCIA-FILOSOFIA-MORAL tornaram-se
minoria.
Mauro Quintella, estudioso da história do Espiritismo no Brasil,
reside em Brasília-DF.
E-mail: zefiro@conectanet.com.br
Texto transcrito da Lista Ipepe-Debates, organizada pelo
Instituto de Intercâmbio do Pensamento Espírita de Pernambuco
(Ipepe).