Artigo de Jaci Régis - Dezembro de 2001

Literatura Mediúnica

Os livros estavam sobre a estante. Eram dois livros. Ao me apresentar ela sorriu e foi até a estante e pegou um deles. O livro era A Delicada Questão do Sexo e do Amor.
Ela folheou o livro e perguntou, para iniciar a conversa: – é de sua autoria? E completou: – é seu mesmo... não é psicografado?
Perguntei-lhe: – por que deveria ser psicografado?
– Bem, ela respondeu, freqüento um centro lá em São Paulo. E quase todos os livros são psicografados.
– A senhora pensa entãoque um livro psicografado seria necessariamente melhor?
– Não, creio que não, disse ela...
– Eu li o livro e gostei. Aliás, gostei muito.
– Fico contente.
– A sua abordagem, prosseguiu, me agradou porque trata dos temas que às vezes nos parecem difíceis ou constrangedores, com naturalidade. Homossexualismo, sexo antes do casamento e outros temas que precisam ser tratados com seriedade, mas sem meias palavras, concluiu.
Ficamos ainda conversando e depois saí.
Lembro-me de que quando lancei o livro Comportamento Espírita, um eminente médium, orador e líder espírita, ao parabenizar-me, não pode deixar de acrescentar “deve ter tido uma inspiração superior...”.
As bases da doutrina, desde o tempo de Kardec foram erguidas pelo esforço, pesquisa e tirocínio de encarnados.
Depois de Chico Xavier, o quadro mudou. A produção do grande médium inundou o mercado livreiro, na verdade criou o mercado livreiro espírita. Mais do que isso, influenciou decididamente na formatação do pensamento do movimento espírita, dando reforço inesperado à tese da religião e aos roustainguistas, na sua idolatria ao Cristo.
Foram centenas de obras, algumas excelentes, outras mais ou menos e a maioria desnecessária, sob o ponto de vista de consolidação do pensamento doutrinário. Ao contrário, em muitos casos serviram para desvirtua-lo.
Paralelamente ao médium mineiro, surgiram muitos médiuns e Espíritos criando livros e mais livros. Entretanto, é interessante observar que a massa de livros é, majoritariamente, de conteúdo discursivo, sem preocupação com estilo, contexto e fidelidade ao pensamento de Kardec. Espíritos desencarnados, sem qualquer talento literário, atrevem-se a enviar obras sem significação artística, literária e muito menos doutrinária.
Dando suporte a esse verdadeiro festival de mediocridade – salvam-se as exceções, como sempre – surgiram editoras profissionais que catam obras de baixo valor literário, mas de apelo místico-fantasioso, romanceadas, distribuídas por Clubes do Livro e outros meios.
A senhora não estava totalmente despida de razão.
Talvez, tivesse eu assumido que teria “psicografado” o livro e criasse um nome de fantasia – como Irmão Francisco, Irmã Clara e nomes sem sobrenomes — para o suposto autor desencarnado e muitos talvez dariam maior crédito ao que ali está escrito.
Mas escrevo por mim mesmo. 
Pesquiso, penso, reflito, vivo emoções como um simples psicólogo, ouvindo queixas e problema, assistindo a angústia de jovens e adultos que muitas vezes se sentem à beira do abismo, quando podem apenas estar alucinando pecados e erros.
Lembro-me do susto que preguei, há muitos anos atrás, quando – talvez um dos primeiros a fazê-lo - tratei da questão sexual num evento espírita. Fi-lo, com respeito e delicadeza, mas sem rodeios e subterfúgios.
A Delicada Questão do Sexo e do Amor é livro real. Tirado da experiência do dia-a-dia. Comenta e analisa, caminha e reflete questões que moram no coração das pessoas, não raro isoladas em si mesmas, envergonhadas, criando fantasmas sobre sua moralidade e lidando com dificuldades com seu desejo.
A questão sexual é ainda tabu nos meios espíritas, sempre inadequados para lidar com a realidade do espírito humano, porque as diretrizes são no sentido da sublimação, uma forma desumana de tratar as questões do coração sequioso de orientação.
O movimento e a literatura estão preocupados em “salvar”, em estabelecer diretrizes capazes de evitar a obsessão, coibir o desejo, mostrando doenças mentais, desvios de personalidades devido ao uso do sexo.
A importância do livro na formação de idéias e consciência crítica é básica. Entretanto, uma análise da literatura mediúnica em geral, abordando as questões sensíveis da sexualidade e do amor, deixa muito a desejar. 
Os autores espíritas são geralmente opinativos, moralistas, doutrinantes, criando situações mentais difíceis e culpas interiores, com o apelo direto ou indireto para superar ou privar a sexualidade, sem iluminar e sem auxiliar as pessoas comuns que, muitas vezes, rodopiam sem saída de suas emoções.
Penso que no A Delicada Questão do Sexo e do Amor, o tema recebeu um tratamento ao nível das necessidades, das perguntas e dúvidas das pessoas comuns, que lutam para encontrar o equilíbrio e tirar o melhor proveito da energia sexual, na tentativa de serem felizes.