Artigo de Luiz Damasceno Lemos - Rio de Janeiro - Agosto de 2000

A Importância da Terminologia no Espiritismo

"Para se designarem coisas novas são precisos termos novos. Assim o exige a clareza da linguagem para evitar a confusão inerente à variedade de sentidos das mesmas palavras." - Allan Kardec

Vale a pena refletirmos nas fortes razões que levaram o bom senso encarnado, no dizer do célebre astrônomo  francês Camile Flammarion ( 1842-1925) a principiar o primeiro livro espírita com as palavras acima, que encabeçam o livro básico da Doutrina, chamando a atenção do movimento espírita quanto a importância da boa comunicação – comunicação de qualidade – das idéias espíritas. Mesmo fazendo uso de neologismos, que melhor podem expressar, em bom vernáculo, o pensamento  doutrinário, tais como espiritismo, espiritista, espírita, perispírito, psicografia, psicofonia, os quais deverão fazer parte do Vocabulário Espírita.

Importa adotarmos, aliás como é de praxe em toda a área científica, a terminologia específica desta área (da Biologia, Física, Psicologia, por exemplo) como deve acontecer com a terminologia espírita, a qual igualmente ,a  bem da boa comunicação deve também ser empregada com precisão, evitando-se misturas com termos já usados em escolas espiritualistas diversas, jargões já consagrados em variados outros sistemas filosóficos. Assim o exige a clareza das idéias imprescindível  a uma comunicação de qualidade.

Léon Denis (1846-1927), respeitável escritor espírita francês em O Problema do Ser, do Destino e da Dor (1936-a, p.33) assim se referia a Kardec:

Esmerou-se Kardec, primeiro de tudo, em dar sentido claro e preciso às expressões que habitualmente emprega em seu discurso filosófico; depois, em definir bem os termos que podiam ser interpretados em sentidos diferentes.  Ele sabia que a confusão que reina na maioria dos sistemas provém da falta de clareza das expressões usadas pelos autores

Outra regra, não menos essencial em toda a exposição metódica, e que Allan Kardec escrupulosamente observou, é a que consiste em circunscrever as idéias e apresentá-las em condições que as tornem bem compreensível para qualquer leitor(...)(grifos nossos)

Em assim sendo, o emprego de um Glossário Espírita é de fundamental importância. Seja recomendável, preliminarmente, o uso adequado da língua materna, seja por  espírito científico do uso correto da terminologia própria a cada ramo do saber, atendendo a sua taxionomia. Ou ainda, e primordialmente, devido ao senso de responsabilidade que devemos ter no que diz respeito a preservação do precioso patrimônio espírita, a nós legado pelo plano espiritual e codificado por Allan Kardec.

Por oportuno, lembramos que a Doutrina Espírita, para ser bem compreendida, precisa ser interpretada contextualmente, isto é, em seu conjunto, como um todo, no tempo e no espaço e não parcialmente, pontualmente, a fim de que, inclusive, quaisquer expressões idiomáticas, extensões semânticas, sejam entendidas em seu verdadeiro sentido, nos termos doutrinários.

Cumpre-nos, portanto, valendo-nos da hermenêutica também ,interpretar os textos de conformidade com o contexto.

Assim sendo, cabe-nos zelarmos dedicadamente pela incolumidade deste acervo doutrinário, a fim de que não haja espaços para distorções, adulterações, mutilações, adjetivações indébitas, enxertias deformantes  e outras anomalias.

Deformações estas, involuntárias ou propositais, culposas ou dolosas, que podem ser ocasionadas, entre outras, mediante o emprego de expressões de duplo sentido, anfibológicas, as quais dão margem a inúmeras interpretações que colidem com os conceitos doutrinários. Inclusive, com o uso de nomenclaturas inadequadas , estranhas ao conceitos espíritas e que, infelizmente, são engolidas por alguns incautos, tais como ritos, rituais, cascões, pretos velhos, cultos, cerimoniais, cerimonial do Evangelho no Lar (ou similar), catequização infantil (ou similar) Virgem Maria, etecetera, etecetera e tal.

Termos estes, expressões ambíguas, melífluas, recheadas de pieguismo, nebulosas, descuidadas ima, outras com o firme propósito de confundir os neófitos do Espiritismo para que a ignorância  das coisas do Espírito permaneça, na ilusão das supostas vantagens que possam advir desta ignorância. Pois, verifica-se, que além de não fazerem uso da palavra espírita  também e isto agrava mais ainda  a situação, acrescentando mais ruído  à Comunicação, emprega  expressões milenares, de uso já consagrado por crença seculares ou vetustas escolas acadêmicas, em conceitos que são próprios a estas seitas e sistemas, muito dos quais, preconceituosos, empolados e até antagônicos aos conceitos espíritas.

Note-se que  esse vocabulário excêntrico já está carregado de significado , alguns em completa oposição aos ensinamentos espíritas. Carreiam para dentro do movimento espírita, idéias imprecisas, equivocadas, concepções espúrias, mas que acabam sendo assimiladas por aqueles que, entre outros, ainda têm saudades do altar e do alguidar também. Idéias essas que, sutilmente, vão se infiltrando no movimento espíritas e se transformando em práticas rotineiras  de Casas Espíritas, alheias às recomendações da Codificação Espírita..

Poderá acontecer com aqueles que ao quererem, presunçosamente, fazer prevalecer o seu ponto de vista pessoal, ainda que esteja a arrepio da Codificação . E, sem disto se aperceber, fazendo uso de suas idéias pessoais e, com sofisticados sofismas, através de verdadeiras contas de chegar, por meio de ilusórias acobracias mentais, dizer provar , digo, pensam que provam , concluindo quilo que bem entendem, desde que satisfaça à sua vaidade, pouco lhes importando se estas suas idiossincrasias contradizem as idéias doutrinárias.

Importa, amigo co-idealista espírita, atentarmos sobre a importância dos conceitos espíritas, que procuram expressar, com fidelidade, as idéias espíritas, as que vêm libertar o homem de uma série de amarras  vêm jogar por terra um conjunto de superstições, de atavismos, de crendices e hábitos estereotipados, vindo, enfim, marcar uma nova era na história da humanidade, diz-nos a pedra angular da Doutrina Espírita. (Kardec, 194, questão 798 do Livro dos Espíritos)

Convém sublinhar que o nosso compromisso é com a Doutrina Espírita e, portanto, embora respeitamos, não nos cabe, porém, manter vínculos de ameaçadoras dependências, provavelmente inconscientes, que nos arrisquem a lastimáveis e perdas de graus de autonomia, a favor de qualquer outras doutrinas, ideologias, sistemas multiformes, idéias individuais enxertadoras de tendências desagregadoras, correntes de pensamentos idiossincráticos,  personalististicos. Tais como os ubaldismos, rohdenismos, roustainguismos, ramatizismos, armondismos etc. São idéias que seus enrustidos seguidores vão, furtivamente, fazendo penetrar em alguns distraídos e permissivos segmentos do movimento espírita.

Vínculos estes que podem até descaracterizar tal segmento, com negativas repercussões não só dentro do movimento espírita, fragilizando-o, bem como fora do movimento, dando uma idéia falsa do que seja o Espiritismo, como se existisse outros Espiritismos além daquele codificado por Allan Kardec. Correndo o risco de vir a dar origem aos chamados espiritantes (mistura de espírita + protestante) espiritólicos (mistura de espírita + católicos) e vai por aí afora.

Neste ponto, se nos torna necessário assumirmos uma postura espírita, objetivando envidar maiores esforços no sentido da despoluição da Doutrina Espíritas desses agentes poluidores , os quais vêm, seja inocente ou deliberadamente, adulterando o Espiritismo através de diferentes formas, valendo-se de múltiplos expedientes, inclusive, dos veículos de comunicação. A eles se somam aqueles que atuando em diversos setores sociais, por ignorância, interesse , má fé, se auto denominam de espíritas, e dizem cobras e largartos do Espiritismo, como o Espiritismo fosse a Magia, a Umbanda, Teosofia, Ocultismos, Hipnotismo, Metapsíquica, Parapsicologia.

Teorias estas que, embora possam  ter pontos de contato – crença em Deus, imortalidade dos Espíritos, animismo, comunicação com os Espíritos, reencarnação -  e, em alguns casos, possam ter  até pontos de coincidência com o Espiritismo, porém, realmente, não são Espiritismo. Porque dele, freqüentemente, divergem e, em inúmeras vezes, destoam das interpretações que a Doutrina dá a  certos fatos.

Em assim sendo, urge uma leitura acurada das obras kardecista , que seja capaz de propiciar àqueles que formam o movimento espírita uma melhor apropriação da Doutrina Espírita, dentro do atual contexto que vivemos. E assim – e isto é um Direito de Cidadania Espírita- preservar a Codificação, inclusive de uma série de conceitos marginais e de um elenco de práticas estranhas. E isso já seria suficiente para pleitear-se a construção, por parte do movimento espírita, de um Projeto de Comunicação do Espiritismo que, realmente, assegure, fazendo uso também do Vocabulário Espírita, uma Comunicação de Excelência da Doutrina Espírita a todos aqueles – crianças, jovens e adultos, que dela se abeirassem, favorecendo-os, de forma dinâmica e progressista, o enfrentamento e solução, à luz do Espiritismo, dos problemas da contemporaneidade.

Este estão a, diariamente, nos desafiar uma resposta satisfatória que nos possibilite, desde a infância, sermos cidadãos felizes, nas relativas condições que o nosso planeta permite e dentro do país que habitamos, desde o presente e para o futuro.

Finalizando, recordemos o ditado popular, que bem evidencia os nossos atuais preconceitos, os quais nos cumpre superar: O maior cego é aquele que não quer ver.

Luiz Damasceno Lemos é engenheiro e dirigente do Movimento Pelo Menos Kardec, do Rio de Janeiro-RJ.

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