Artigo de Denizard de Souza - Brasília - Março de 2000

"Muito Além do Cérebro"

Breve Comentário sobre Transcendência, um Campo além do Cérebro

O livro de Grof amplia o espectro de pesquisa da psique humana, acrescentando uma dimensão transpessoal à teoria e a prática psicológica. Grof utiliza fontes intelectuais diversas, quais sejam, o novo paradigma proposto à ciência pela Física quântica e sua convergência com as tradições milenares da Cultura oriental, a Psicanálise, notadamente os trabalhos de Freud, Jung, Adler, Reich e Otto Rank e a terapia psicodélica, por meio dos quais consegue estabelecer as bases científicas da “Psicologia Transpessoal”. Não se trata de mais uma corrente interpretativa dos fenômenos psicológicos, mas de um extenso e persistente trabalho de pesquisa em torno dos “estados incomuns da consciência” e sua exploração através da hipnose e da Terapia psicodélica.

Durante três décadas, desde quando transferiu-se da Checoslováquia para os Estados Unidos, em meados dos anos 60, Stanislav Grof promoveu inovações na pesquisa transpessoal, tendo como epicentro de suas investigações os domínios perinatais (que focalizam experiências de nascimento e morte) e transpessoais (que está além do nível biográfico-rememorativo). O Dr. Grof, utilizando-se da técnica da “respiração holotrópica” (modelo Taoísta da hiperventilação) e de recursos psicodélicos em sua atividade como psiquiatra e psicoterapeuta, proporcionava a seus pacientes o contato com suas experiências perinatais: acontecimentos do período gestacional, traumas vividos durante a passagem no parto natural, os primeiros contatos com o ambiente externo e a mãe, e além disso o paciente transcendia as “fronteiras” do nascimento biológico em busca de suas vivências transpessoais: os registros da zona de ligação entre o individual e o inconsciente coletivo, as experiências arquetípicas, o acesso ao estado de consciência da unidade no qual não há limites temporais ou espaciais entre a parte (o ego) e o todo (o universo) e por fim as recordações das experiências evolutivas anteriores (reencarnações passadas, que vão desde a formação do psiquismo primitivo nos ambientes unicelulares até os níveis auto-conscientes das encarnações humanas).

Grof ao lidar com esta “cartografia transpessoal da psique” enfrentou um duplo desafio: por um lado, utilizar a exploração dos diversos níveis perinatais e transpessoais como processo terapêutico, de alta eficiência na solução de problemas psiquiátricos e transtornos de diferentes matizes no universo da psicopatologia. Por outro, o Dr. Grof deveria “Caminhar o caminho místico com pés práticos”, isto é, manter-se no plano da pesquisa científica e do acompanhamento racional dos dados, ainda que estivesse superando o mecanicismo das leis e parâmetros da Ciência moderna. Como ele próprio definiu “precisava manter a psicologia transpessoal à altura dos trabalhos de seus pioneiros Carl Gustav Jung, Roberto Assagioli e Abraham Maslow”.

O que se observa no trabalho de Grof é o reconhecimento da importância dos aspectos espirituais da mente, ou seja, da transpessoalidade do psiquismo humano, tanto para o mapeamento das patologias que fogem a dimensão biográfica da existência, quanto para a construção dos fundamentos teórico-metodológicos de uma Psicologia que remete o homem a sua constituição cósmica. Trata-se de uma Psicologia que supera o reducionismo cerebrocêntrico, que houvera reduzido a experiência psíquica ao jogo cego das forças bioquímicas e a realidade neuronal. Em uma palavra, é possível dizer que a Psicologia Transpessoal, tal como demonstrada por Stanislav Grof em seu revolucionário “Além do Cérebro” é a Psicologia do Futuro: um conhecimento psicológico que reintegra o individual no coletivo, o essencial e o existencial, a diversidade em um sistema cósmico unificado.

Denizard de Souza é conferencista espírita, presidente da Associação dos Divulgadores Espíritas do Distrito Federal (ADE-DF), Diretor de Políticas de Comunicação da Associação Brasileira dos Divulgadores Espíritas (Abrade), Mestre em Sociologia e professor universitário.